Pronunciamentos

DEPUTADA CECÍLIA FERRAMENTA (PT)

Discurso

Transcurso do Dia Internacional da Mulher.
Reunião 15ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 16ª legislatura, 4ª seção legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 16/03/2010
Página 49, Coluna 1
Assunto CALENDÁRIO. MULHER.

15ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 16ª LEGISLATURA, EM 11/3/2010 Palavras da Deputada Cecília Ferramenta Boa tarde a todos. Gostaria de cumprimentar o Presidente, Deputado Doutor Viana, sempre atuante em quase todas as homenagens aqui nesta Casa. Aproveito a oportunidade para pedir a V. Exa. e aos membros da Mesa que façam um esforço para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição nº 51, que estabelece a presença de uma representante mulher na Mesa da Assembleia. Proposta com o mesmo intuito está tramitando no Congresso Nacional e entrará na pauta para ser votada em 1º turno. A Assembleia Legislativa de Minas Gerais dá o seu exemplo, como sempre. Tenho certeza de que poderemos aprovar a PEC ainda este ano, de forma que, na próxima legislatura, tenhamos uma mulher na composição da Mesa. Infelizmente, a nossa comissão especial, Maria Lúcia, já estava marcada. V. Exa. seria a sua Presidente, mas, infelizmente, em razão do ocorrido, V. Exa. foi obrigada a sair da Assembleia. Sentimos muitas saudades. Cumprimento as ex-Deputadas Maria Olívia, por quem tenho muito carinho e que me ensinou muito, e Lúcia Pacífico, Deputada exemplar, além de todas as Prefeitas aqui presentes. O nosso Presidente brincou, no início, perguntando se, para ser Prefeita, seria preciso ser do PT, porque todas as Prefeitas que estão compondo a Mesa são desse partido. Sabemos que não. Também temos Prefeitas de outros partidos aqui, dando exemplo, fazendo o dever de casa. Ainda contamos com Vereadoras. A Ana Maria Resende citou um exemplo. Todas estão de parabéns. Nesta minha fala, gostaria de usar a palavra “superação”. Muitas mulheres não têm a mídia, estão focadas no seu dia a dia, vivendo no seu mundo, na sua casa, com a sua família, na sua comunidade, mas conseguem transformar, conseguem fazer e dar exemplo. Quando pensamos em superação, o que vem à mente são milhares e milhares de mulheres espalhadas por este Brasil inteiro, cada uma no seu canto, fazendo seu dever de casa, sofrendo seu pranto, mas dando conta do recado. É por elas, para elas e para vocês que estamos aqui fazendo esta homenagem. Algumas se destacam na sociedade, mas, ali no seu mundinho, somente nós e Deus sabemos o que passam. Então, é para vocês, mulheres, que trouxemos duas representantes: uma de Ipatinga e outra de Bom Despacho, minha terra natal. Ipatinga é a cidade que escolhi para viver; Bom Despacho é a cidade onde nasci. Gostaria que a D. Rosária ficasse de pé, por favor. D. Rosária é um exemplo de vida, luta e garra, sem contar que me emprestou a sua filha, a Bernadete - aquela ali de roxo -, que há 22 anos está juntamente comigo ajudando a criar os meus filhos. Conversando hoje com ela, a primeira coisa que me falou foi que, quando ficou moça, conheceu um rapaz e sua mãe lhe disse assim: “Rosária, acho muito perigoso você namorar com esse moço. Ele é branco e você é preta”. Ela lhe respondeu: “Mãe, sou melhor do que ele. Por quê? Temos a nossa casa para morar e o nosso terreno para plantar; e ele, não. Ele vive nos barracões dos fazendeiros, trabalhando”. O que isso quer dizer? Essa mulher, com 19 anos, já dando demonstração de defesa da sua raça e cor, ou seja, de que a cor não importa. Então, ocorreu assim com a D. Rosária: casou, passou por muitas dificuldades, criou 12 filhos e trabalhou como gari na Prefeitura de Ipatinga. Há uma outra história muito linda da D. Rosária. Quando o meu esposo, Chico Ferramenta, foi Prefeito pela primeira vez, implantamos na Prefeitura de Ipatinga um movimento de alfabetização de jovens e adultos. Iniciamos essa alfabetização nos setores da Prefeitura. A D. Rosária era gari na época e uma das alunas. Todos tinham de ir à escola das 7 às 11 horas, e só na parte da tarde iam trabalhar, dentro desse programa que foi implantado. Ela frequentou as aulas e aprendeu a ler. Num belo dia, juntamente com seu esposo - o Izé, como assim o chamava -, viajou para Santa Maria do Itabira porque sua sogra havia falecido. Tinham de fazer baldeação em Nova Era. Parados nessa cidade, aguardando assentados a chegada do ônibus que iria para Santa Maria do Itabira, D. Rosária disse: “Izé, aquele ônibus ali é de Santana dos Ferros e passa por Santa Maria. Com ele podemos chegar mais cedo”. Ele respondeu: “Deixa de ser boba, mulher! Você não sabe ler. De onde você tirou isso?”. Ela disse: “Izé, eu era cega e agora enxergo”. Ela enxerga porque aprendeu a ler. Esses são exemplos, modelos de superação. Na verdade, ela é um deles. Assim criou a sua família. Todos os seus filhos são trabalhadores. D. Rosária, parabéns pela sua história. Hoje, aos 77 anos, ela continua fazendo a sua ginástica e participa do movimento de mulheres da terceira idade. Aliás, ela me pediu para mandar um abraço carinhoso para esse movimento da terceira idade em Ipatinga. D. Rosária, certamente todas a estão vendo pela TV e recebendo esse abraço. Parabéns para a senhora e toda a sua família, que tem sido exemplo de garra e luta em Ipatinga. Muito obrigada. Gostaria agora de pedir à D. Sebastiana que se levantasse. A D. Sebastiana é de Bom Despacho, mas nasceu em Bom Sucesso. Ela tinha de ser de algum “bom”, porque nasceu em Bom Sucesso, mas foi viver em Bom Despacho para continuar a luta dos seus antepassados. Contando a história dos seus antepassados na cidade de Bom Sucesso, disse que os negros naquela época não podiam nem sair às ruas, que eram discriminados. Ela continuou essa luta em Bom Despacho, na comunidade da Tabatinga. Até hoje há o dialeto de Tabatinga: no dialeto de Tabatinga, hoje seria o dia das ocaias, que significa dia das mulheres. A D. Sebastiana, com 75 anos, continua essa luta na comunidade defendendo a Associação dos Quilombolas. Sua filha, a Sandra, até recebeu homenagem; ela estava compondo a frente parlamentar em defesa da consciência negra, a frente racial. Quando eu entregar a placa à senhora, entregarei também a placa da Sandra, que continua essa luta dos quilombolas. Peço à senhora que a entregue a ela. A D. Sebastiana é também a capitã do corte de reinado em Bom Despacho, que é o único composto apenas de mulheres, e é exemplo da defesa da cultura negra, da cultura que jamais pode acabar. D. Sebastiana, muito obrigada pelo seu exemplo de vida, pelo que você representa na nossa comunidade de Bom Despacho, pelo que você representa como superação, no seio da sua família, defendendo a cada um e a todos de forma geral. Para terminar minhas palavras, Charles Darwin diz que a espécie que sobrevive não é a mais forte nem a mais inteligente, mas aquela que consegue fazer as mudanças, as transformações. São essas transformações que fazemos a cada dia, a cada momento; são elas que dão sentido à nossa vida, à nossa existência. Há a história de famoso malabarista que estava tentando ensinar um aluno a fazer acrobacias no ar. Como ele não conseguia aprender, o malabarista disse: “Rapaz, lance teu coração sobre a barra que teu corpo acompanhará”. É dessa forma que nós, mulheres, fazemos: lançamos nosso coração na barra todos os dias para conseguir, de fato, com fé, com amor, transformar esta sociedade e garantir a felicidade da nossa casa, da minha casa, porque é em nossas casas, na casa de cada uma de nós, que conseguimos transformar nossa sociedade. Muito obrigada. Deixo abraço carinhoso para cada uma e cada um de vocês.