DECRETO nº 8.949, de 25/01/1929

Texto Original

Aprova modificações no Regulamento de Ensino Normal.

O PRESIDENTE DO ESTADO DE MINAS GERAIS, usando da atribuição contida no artigo 1º da Lei nº 1.036, de 25 de setembro de 1928, resolve aprovar as modificações ao Regulamento do Ensino Normal, que com este baixam, assinadas pelo Secretário dos Negócios do Interior.

Palácio da Presidência, em Belo Horizonte, 25 de janeiro de 1929.

ANTÔNIO CARLOS RIBEIRO DE ANDRADA

Francisco Luiz da Silva Campos

Modificações a que se refere o Decreto nº 8.949, de 25 de janeiro de 1929

Art. 1º – A nota do exame promoção se obtém dividindo por dois a soma da média das notas alcançadas durante o ano e da nota de prova escrita, não sendo promovido o aluno cuja nota, na prova escrita, for inferior a quatro ou cuja média das notas alcançadas durante o ano e da prova escrita for igualmente inferior a quatro.

Art. 2º – Nos exames finais, o resultado do exame será obtido dividindo-se por dois a soma das notas da prova escrita e da prova oral, sendo considerado reprovado o aluno que tiver obtido menos de quatro; aprovado simplesmente o que tiver conseguindo de 4 a 7, exclusive; plenamente o que tiver alcançado de 7 a 9 ½ inclusive; e om distinção, o que tiver logrado mais de 9 ½.

Art. 3º – Nas cadeiras em que houver prova prática, o resultado do exame será obtido pela divisão – por três, da soma das notas das diversas provas.

Art. 4º – Para os fins do parágrafo 4º do art. 83, do Regulamento, os alunos farão bimensalmente provas escritas de línguas e ciências e um trabalho prático ciências, desenho, música, educação física, costura e trabalhos manuais, além de frequentes arguições e exercícios recomendados nos programas.

Art. 5º – A contar de 1930 não serão permitidos exames de admissão ao primeiro ano normal das Escolas do Primeiro Grau e ao primeiro ano do curso preparatório das Escolas do Segundo Grau.

Art. 6º – Os professores que não puderem fazer parte das bancas examinadoras por força de impedimento de que trata o art. 273 do Regulamento perderão seus vencimentos em favor dos substitutos.

Art. 7º – As escolas normais oficiais que não contarem 120 alunos serão transferidas para outras localidades, não computados naquele número os alunos das classes anexas.

Art. 8º – A taxa de frequência das Escolas Oficiais, que será de 10$000 mensais, se destina exclusivamente à aquisição de livros e de revistas pedagógicas, devendo as somas apuradas ser remetidas ao Inspetor Geral da Instrução Pública, dispensados do pagamento apenas os alunos notoriamente pobres, mediante atestado do juiz de menores.

Art. 9º – O ensino do francês constará obrigatoriamente dos cursos das Escolas Normais do Primeiro Grau.

Art. 10 – Nas Escolas Normais do Primeiro Grau a serem criadas ou instaladas as matérias do ensino serão distribuídas pelas seguintes cadeiras:

1ª – Português e francês;

2ª – Aritmética e geometria;

3ª – Geografia e História do Brasil e educação cívica;

4ª – Ciências naturais e fisiologia infantil;

5ª – Desenho e trabalhos manuais e modelagem;

6ª – Metodologia;

7ª – Música e ginástica.

Art. 11 – Os professores nomeados a título provisório só poderão ser efetivados depois de um ano de efetivo exercício do magistério e a critério do governo que poderá mandar abrir concurso para o provimento efetivo.

Secretaria do Interior, 25 de janeiro de 1929. – Francisco Campos.

Senhor Presidente.

Tenho a honra de submeter à assinatura de v. ex. o regulamento que a esta acompanha, em que, de acordo com a autorização constante do art. 1º, da Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, se consolidaram todas as disposições referentes à concessão e tráfego de estradas de ferro no Estado, e se introduzirem algumas disposições novas, aconselhadas pela prática da administração e pela observação de técnicos e especialistas.

Não é preciso encarecer a utilidade dessa consolidação, sabido como é que se achavam dispersas pela nossa legislação e governamentais sobre o assunto, que é de capital importância para um Estado como o nosso, em que as vias de comunicação, principalmente as estradas de ferro, são ainda muito escassas relativamente à população, à produção e à extensão territorial.

Dispenso-me de maiores considerações porque a exposição de motivos com que o engenheiro Alcides Lins, diretor de Viação e Obras Públicas, me apresentou o Regulamento, por ele elaborado e discutido por uma comissão de técnicos, é um estudo completo do assunto e demonstra à saciedade a importância da codificação ora feita.

25-1-1929.

Djalma Pinheiro Chagas.

JUSTIFICAÇÃO QUE PRECEDEU AO PROJETO DE REGULAMENTO DA CONCESSÃO DE PRIVILÉGIOS, CONSTRUÇÃO E TRÁFEGO DE ESTRADAS DE FERRO, NO ESTADO DE MINAS GERAIS

Sr. Secretário:

Cumprindo as instruções de v. exc. e o disposto na Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, venho apresentar-lhe um esboço de regulamento para a concessão de estradas de ferro em nosso Estado, na qual se acham consolidadas todas as disposições legais vigentes.

Tratando-se de um assunto, a que, ultimamente, por força de minhas atribuições, me tenho dedicado com esmero e afinco, era natural e de meu dever procurasse corrigir os senões, que havia encontrado na execução dos regulamentos anteriores e nele incluísse novas medidas, impostas pelas necessidades atuais do nosso meio e indicadas pelos progressos da prática ferroviária hodierna.

Os regulamentos em vigor são, de fato, anteriores à guerra mundial: – aprovados pelos Decreto nºs 1.018, de 30 de março de 1897, e Decreto nº 3.357, de 11 de novembro de 1911. Terminada a guerra, o regime econômico e financeiro das estradas de ferro passou por transformações radicais, resultantes de várias experiências fracassadas ou impostas por duas contingências do momento.

Esbocemos estas mudanças para que se possa ajuizar de sua importância e da eficácia prática das lições que elas nos ministram.

I

Nos Estados Unidos, onde está situado o maior e mais homogêneo e eficiente sistema ferroviário do mundo, cujos ensinamentos deveremos procurar de preferência (1), depois do relativo fracasso da administração oficial, durante a guerra e no período subsequente até 1º de março de 1920, as estradas voltaram às respectivas companhias proprietárias, sob o regime estritamente fiscalizador do Transportation act” de 28 de fevereiro de 1920, mais conhecido por “Esch-Cummings law” (2).

Ella estabelece las actuales relaciones entre los ferrocarriles y el Gobierno y demuestran en sus disposiciones la existencia de una verdadeira Administration Fiscal indirecta, ejercida al traves de la I. C. C. (Interstate Commerce Commission).

(R. Simon. Cit. pág. 189).

Esta lei não só aumentou os poderes fiscalizadores da I. C. C., principalmente na regularização das tarifas, como também limitou os lucros das vias férreas a 6% e repartiu o excesso, em partes iguais, entre a empresa e o Governo.

Na França, o Governo, de comum acordo com as grandes companhias, estabeleceu o contrato, chamado Nouveau Régime. (Convenção de 28 de junho de 1921, aprovada pela lei de 29 de outubro de 1921).

Ficou, assim, criado o “Conselho Superior das Estradas de Ferro” e estabelecidas a solidariedade financeira e a estreita cooperação entre as grandes redes e o Estado, de modo a coordenar os esforços de todas as administrações particulares, no sentido dos interesses gerais da nação. (Agenda Dunod – Chemins de Fer – 1924, pág. 284).

Na Alemanha, todas as estradas de ferro, sob uma única administração, constituem a principal garantia do plano Dawes, de reorganização financeira do Reich. Elas estão sob o regime da mais absoluta fiscalização, exercida por um comité de peritos interaliados (Lei de 30 de agosto de 1924, publicada na Revue Générale des Chemins de Fer. IX/1925, pág. 212).

Na Bélgica, o Governo, com o intuito de estabilizar a moeda, constituiu uma companhia para explorar sua rede ferroviária, mobilizando, assim, o importante ativo que ela representava – 3.358 milhões de francos ouro. (Artigo de J. B. da Costa Pinto – “O Jornal” de 2/3/1927 e Peschaud, La Reorganisation des Chemins de Fer de L’Etat Belge, Revue Générale des Chemins de Fer – janvier 1927, págs, 424 e seguintes).

A lei “créant la Société Nationale des Chemins de Fer Belges” é de 23 de julho de 1926.

Na Inglaterra (R. G. des Ch. de Fer. – fevereiro de 1925, pág. 100), o parlamento decretou pelo Railway Bill de agosto de 1921, a fusão, a partir de 1923, de todas as companhias existentes em quatro sistemas ferroviários, tendo em vista as economias resultantes da unificação das diretorias e do melhor aproveitamento do material rodante.

Deste rápido escorço, vemos que, neste momento, a tendência universal, principalmente nos países de circulação mais intensa e tráfego mais denso, é:

1º – com o fito de maior economia na administração e melhor aproveitamento do material rodante, construir grandes sistemas ferroviários;

2º – entregá-los a administrações particulares, sob imediata, eficaz e constante fiscalização dos respectivos governos;

3º – coordenar os esforços de todas as administrações no sentido de melhor servir ao público e dar-lhes solidariedade financeira de modo que mutuamente se auxiliem.

II

Ao consolidar, em um único regulamento, todas as disposições legais existentes, precisávamos aproveitar, adaptando-os às nossas condições peculiares, aqueles ensinamentos. Foi o que me esforcei por fazer.

Na exposição que se segue procuraremos ressaltar nossas necessidades ferroviárias, indicar medidas que as possam suprir e justificar os alvitres propostos que, estou certo, virão facilitar a solução de tão momentoso problema.

No Governo passado, não se fez lei alguma sobre a concessão e tráfego das estradas de ferro. Assim, a legislação anterior se resumia nos regulamentos baixados com os Decreto nº 1.018 de março de 1897, Decreto nº 1.255, de 15 de fevereiro de 1899 e Decreto nº 3.357, de 11 de novembro de 1911 e nas Lei nº 760, de 6 de setembro de 1920 e Lei nº 810, de 24 de setembro de 1921.

A situação encontrada pelo Governo atual era, pois exatamente, a descrita pelo malogrado estadista Raul Soares, em sua plataforma de 1922:

Entre as nossas necessidades fundamentais culmina o incremento das vias de transporte.

“A estrada – eis o problema angustiante e premente de Minas: Estado vastíssimo, com uma população disseminada em núcleos mais ou menos afastados, de mais a mais encravado no centro do Brasil, tributário forçado dos portos do Rio, S. Paulo, Espírito Santo e Bahia, com um território na maior parte acidentado, Minas Gerais precisa de estradas mais do que tudo.”

“Não poucos são os sacrifícios feitos pelo Estado com suas vias férreas. Orça por muitas dezenas de milhares de contos o que há despendido em garantia de juros, subvenções quilométricas, construções diretas e indenizações pagas. Mas, de certo tempo a esta parte, em vista da situação financeira precária a que havia chegado, limitou, neste particular, sua iniciativa a algumas exigências feitas em reformas contratuais, a, empresas existentes”.

“A concessão de estradas de ferro praticamente desapareceu, desde que não mais se outorgaram recursos ou auxílios oficiais.”

“Sem garantia de remuneração do capital ou auxílios pecuniários, é sabido que dificilmente se forma uma empresa ferroviária”.

“Precisamos ensaiar um sistema que interesse o concessionário na exploração da estrada, de modo que ele se esforce em realizar a obra pelo menor custo possível e em boas condições técnicas, a fim de que destes dois elementos possam resultar tarifas convenientes e tráfego regular.”

“Estender trilhos por toda superfície do Estado deve ser nosso escopo, nosso empenho, nossa preocupação de todas as horas”. (Págs. 13, 14, 15, 17 e 18).

Por sua vez, o atual Presidente, ao expor o seu programa administrativo, propugnado medidas que interessam ao nosso progresso econômico e desenvolvimento financeiro, concluiu:

“É sabido que o êxito de todas as providências a que tenho aludido, e referentes à expansão econômica do Estado, será utopia se não forem removidos os embaraços atuais ao transporte de mercadorias e se for paralisado o esforço para a construção de estradas de ferro e de estradas de rodagem e pela navegação dos nossos rios.”

“As quatro grandes redes que nos servem a “Central do Brasil, a “Oeste de Minas”, a Leopoldina Railway, a Rede Sul Mineira”, estão sendo, pelo seu desaparelhamento, importante causa de crises de transportes.”

Em resumo, ao iniciar-se o quadriênio atual, era precária e premente a situação dos transportes ferroviários no Estado:

1º – porque, faltando garantia e auxílios financeiros, não surgiam iniciativas particulares, de vulto, empreendendo a construção de novas vias férreas.

2º – porque as empresas particulares existentes e com linhas em tráfego, estavam em situação desanimadora, por falta de rendas, devido a tarifas deficientes e se debatiam normalmente, por ocasião das safras, em angustiantes crises de transporte.

III

Sendo oficiais três das citadas grandes redes existentes – a “Oeste” e a “Central” administradas diretamente pelo Governo da União e a Rede Sul Mineira, pelo do Estado, – pelos Decreto nº 7.546, de 21 de janeiro de 1927 e Decreto nº 7.457, de 21 de janeiro de 1927, procurou o executivo estadual, servindo-se das autorizações das Lei nº 760, de 6 de setembro de 1920 e Lei nº 810, de 24 de setembro de 1921, resolver a situação da “Leopoldina Railway”, fornecendo-lhe elementos para remunerar o seu capital, reaparelhar o seu tráfego e prolongar as suas linhas.

Faltavam medidas que, garantindo os capitais invertidos nas estradas de ferro, viessem despertar a iniciativa particular, incentivando o nosso desenvolvimento econômico. É o que a Lei nº 1.001, de 221 de setembro de 1927, procura resolver, aumentando as subvenções quilométricas de 15 para 30 contos de réis, estabelecendo que estas estradas, mesmo concedidas com auxílios pecuniários, possam tornar-se propriedades perpétuas dos concessionários, e garantido juros, no período do tráfego deficitário ao capital efetivamente despendido.

Esta lei está redigida e precisa ser regulamentada de modo que, despertando a iniciativa particular não venha prejudicar suas vantagens reais, assim resumidas por Joaquim Murtinho:

“Todas as vantagens que se apresentam na administração particular derivam-se diretamente do interesse individual, que se traduz pelas rendas dos capitais empregados”.

“É este grande estímulo que torna essa administração muito superior à administração oficial”.

“A renda dos capitais que se destinam à satisfação dos interesses particulares só é assegurada por um conjunto de elementos: – escolha das obras a realizar, atividade, zelo, economia e honestidade.” (Introdução ao Relatório do Ministro da Viação – Legislação Ferroviária, vol. VIII, pág. 280).

Escrito em começo de 1897, este notável relatório está imbuído de ideias, que a prática atual, como já mostrei de começo, aboliu por completo: – ele proscrevia de modo absoluto o auxílio governamental às iniciativas particulares no campo ferroviário.

Tratando-se de serviços, por sua natureza e seus fins, de caráter essencialmente público, como o são as vias férreas, é indispensável a colaboração estreita do governo com a iniciativa particular para sua consecução.

Devemos, portanto, organizar a estrutura deste regulamento, de maneira que:

1º – atraia, pelas garantias que oferece, o capital;

2º – não retire da iniciativa particular o seu principal estímulo: – o interesse individual pelas rendas que vai auferir;

3º – assim, aquelas garantias só se deverão tornar eficazes e reais, se o concessionário souber escolher a estrada a construir e construí-la com zelo, economia, honestidade e eficiência;

4º – sendo uma obra de utilidade pública, gozando do monopólio de transportes e sendo construída com auxílio financeiro do erário estadual, deverá o governo ficar munido de poderes fiscais suficientes, a fim de poder obrigá-lo a cumprir suas obrigações legais e contratuais na manutenção de tráfego permanente, regular e seguro.

IV

Exposto o problema a resolver, procuremos agora, justificar a solução proposta.

No dizer de Ainsworth, citado por Wellington no pórtico do seu clássico e excelente tratado, – “The Economic Theory of the Location of Railways”, – o que garante a vida e o êxito de uma estrada de ferro é a sua locação, a escolha do seu traçado.

“A locação de uma estrada dá-lhe a constituição. Poderá adoecer, tornar-se quase fracassada, pelos acidentes da construção e do tráfego, mas com uma boa constituição convalescerá e recobrará, por fim, sua robustez.”

The location of a railroad is giving it its constitution. It may be sick, almost unto death, with accidents of construction and management, but with a good constitution it will ultimately recover”.

Parmi les problèmes que soulève l’exécution des chemins de fer, il n’en es pas de plus important que la détermination de leur tracé”.

Si les chemins de fer sont destinés a exercer une influence bienfaisante sur l’avenir de notre industrie et de notre commerce, sur l’avenir même de notre civilisation, ce n’est qu’à la condition d’être bien conçus, bien tracés. Si dons il vivifie les contrées qu’il traverse, il appauvrit, au contraire, celles dont il s’éloigne, et, s’il est mal tracé, non seulement il donne lieu à un gaspillage de la fortune publique, mais encore il peut jeter la perturbation la plus fâcheuse dans la distribution de notre richesse nationale, et, tout en étant une cause de prospérité pour quelques uns, devenir, pour un grand nombre, un instrument de ruine. On ne saurait, par conséquent, étudier le tracé des chemins de fer avec trop de soin. (Perdonnet – Chemins de Fer, vol. 1, pág. III).

De acordo com estas ideias, que dominam toda a técnica ferroviária, a condição primordial e essencial para a concessão de uma estrada de ferro é o reconhecimento prévio, principalmente dos caracteres econômicos do seu traçado.

Esses caracteres são: – população existente, riqueza florestal e aspecto geológico dos terrenos, recursos minerais da região, quadros climatológicos, resumo estatístico com as principais produções agrícolas e industriais, quantidade e natureza de seu comércio de importação e exportação com a indicação dos respectivos mercados. De posse destes dados, poderá o Governo julgar o custo, o tráfego, a renda e as despesas de custeio prováveis da futura estrada e terá elementos para avaliar as necessidades financeiras da empresa, que a irá, explorar e dos recursos, que o progresso da zona poderá proporcionar-lhe para custear seus serviços de juros, melhoramentos e amortização do capital empregado no material que se deprecia.

V

O fracasso de qualquer concessão resultará sempre em prejuízo para o Estado, com o descrédito que acarreta para as suas condições econômicas e probabilidades de progresso rápido e eficiente.

Assim, não devemos conceder, como já se tem feito, pequenas linhas, prolongamentos ou ramais das redes existentes senão aos seus próprios concessionários. Estas concessões a estranho estão fadadas a fracasso certo e irremediável. Ele se tem verificado aqui entre nós e por toda a parte.

Já tratei deste assunto, com bastante desenvolvimento no folheto “A Central do Brasil”, artigos em resposta ao “O Estado de São Paulo”, páginas 53, 88 e 90, e na “Revista Brasileira de Engenharia (Vol. XI, pág. 224), analisando a Função Econômica de Ramais Ferroviários”.

Citei, ali, exemplos, que se passaram nos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, França, Itália e aqui.

Assim, o regulamento proposto procura tornar estas construções, em qualquer tempo, vantajosas às redes existentes e dificultá-las a quaisquer outros concessionários.

Esta medida é altamente econômica e razoável. Visa respeitar as melhores doutrinas da economia ferroviária.

“Se for necessário construir uma pequena estrada de ferro independente, dever-se-á permitir que arrecade tarifas e taxas muito mais excessivas do que as razoáveis para as linhas troncos. Segundo, os concessionários próprios para construir as pequenas estradas são as companhias que possuem as linhas principais, com as quais se ligam, porque elas obtém com a construção do novo ramal um acréscimo de tráfego, que, além de contribuir para a remuneração do capital da antiga linha tronco, em regra, nunca implica emprego de novo capital, nesta linha, para a sua circulação”.

“As companhias francesas de estradas de ferro compilam e publicam estatísticas, fornecendo, separadamente, para cada seção ou ramal de seu sistema, os transportes, as rendas, as despesas e os lucros líquidos. Claramente estes resultados mostram que as linhas troncos, com tarifas médias baixas, são esplendidamente rendosas, enquanto que as linhas de pequeno tráfego, a despeito de suas tarifas elevadas, são exploradas na maioria dos casos, deficitariamente”.

Ambos os trechos são tirados de Acworth – The Elements or Railway Economics e no original se lêem:

If it is necessary for a light railway to be built independently, it ought to be permitted to charge rates and fares very much in excess of those which would be reasonable on main lines.

Secondly, the proper people to build light lines are the main-line companies with which the light lines connect, for they obtain from the construction of a new branch an accession of new traffic which, while contributing to the remuneration of the old main-line capital, does not as a rule imply any expenditure on that line of new capital for its accommodation.” (pág. 21).

The French railway companies compile and publish statistics giving, for each section and branch of their system separately, the traffic carried over it, the earnings, expenses, and net proflit. Broadly, the result is to show that the main-lines with low average rates are splendidly profitable, while the lines with light traffic, spite of higer rates, are in most cases worked at an actual loss.” (pág. 60).

Ainda recentemente, maio de 1926, na Revue Générale dos Chemins de Fer, o sr. Berthelier, em artigo sobre as Modifications à apporter aux Contrats des Chemins de Fer d'Intérêt Local, diz:

Les résultats déficitaires obtenus dans un assez grand nombre de cas pour l’exploitation des lignes d’intérêt local devraient conduire à la suppression de certaines lignes; quelques-unes pourraient être remplacées par des lignes d’autobus.”

Le groupement des lignes entre les mains de quelques grands concessionnaires, groupement qui se poursuit d'ailleurs peu à peu est à favoriser dans l’intérêt de la réduction des dépenses et de meilleures méthodes d’exploitation.” (pág. 344).

Ora, os atuais regulamentos e contratos absolutamente não preveem estes casos,

Assim, as grandes redes atuais enfeixam inúmeros contratos e os governos passados fizeram concessões de estradas, que são verdadeiros ramais da Rede de Viação Sul Mineira e outros da Leopoldina Railway.

Outorgando-lhes a Rede facilidades, eles se construíram e já estão em condições precárias.

Os seus concessionários não poderão arcar com as despesas improdutivas, que ocasionarão.

Assim, o prolongamento de Campanha a São Gonçalo do Sapucaí já está entregue ao Estado; a E. F. Machadense e E. F. Trespontana estão sendo trafegadas pela Sul Mineira e, na Câmara dos Deputados Federais, já existe projeto para a encampação desta última.

VI

Escolhido o traçado, verificadas as condições de viabilidade econômica da estrada a construir e feita a concessão, é preciso que o contrato resultante estabeleça a intercomunhão completa de interesses entre o concessionário e a zona a explorar, e traduza uma combinação financeira fortemente organizada, capaz de permitir à empresa vida folgada e progressista, sem tolher nenhuma das condições de desenvolvimento da região.

Assim, o regulamento deverá definir a duração e extensão dos privilégios concedidos; organizar a estrutura econômica-financeira da empresa que vai explorar a estrada; prever os meios e recursos de que terá de lançar mão para acompanhar os progressos da região, e determinar a ingerência fiscal do Governo, de modo claro e expresso, real e eficiente, a fim de que possa intervir sempre na defesa dos interesses públicos ligados à concessão.

VII

El más importante de los problemas de las compañías ferroviarias corresponde en qualquer país a la obtención de capitales. (R. Simon, cit., pág. 155).

Lavrado o contrato, terá o concessionário ou a empresa que organizar, de obter capitais, com que possa levar avante a construção da estrada. É um problema difícil: os capitalistas, no momento, procuram garantias amplas e juros altos.

Por outro lado, o capital particular, obtidas estas seguranças, procura abusivamente descansar nelas, deixando de valer-se de uma gerência econômica, ativa e eficiente.

Com o fito de atrair capitais particulares, a Lei nº 1.001 de 21 de setembro de 1927, muniu os poderes públicos das seguintes autorizações:

a) a concessão da subvenção quilométrica até 30 contos;

b) a garantia tarifária de um juro razoável;

c) a faculdade do concessionário tornar-se proprietário perpétuo da estrada;

d) o aumento da duração dos privilégios.

Não falo no monopólio de transportes, porque, hoje, é pacífica a doutrina de que não poderá haver serviço ferroviário sem ele.

Mesmo nos países, como os Estados Unidos e a Inglaterra, em que legalmente não existia, acabou por se estabelecer de fato, como resultado da própria concorrência.

Os grupos capitalistas mais fortes venceram os mais fracos, e retiraram suas vias férreas do campo da luta comercial, ou fizeram combinações assegurando os próprios interesses e descurando os do público.

On voit que ce n’est pas sans de sérieux motifs qu’un grand nombre d’hommes d’Etat, d’ingénieurs et d’économistes admettent que la concurrence doit être écartée de l'industrie des chemins de fer.” (La Gournerie, Exploitation des Chemins de Fer, pág. 30”).

Com a concorrência, apareceram as competições de tráfego, que foram nefastas por toda parte, quer facilitando a dispersão de enormes capitais, construindo ferrovias desnecessárias, em regiões que já estavam suficientemente servidas; quer, depois de abertas ao tráfego, estatuindo as competições tarifárias, com as consequentes bancarrotas.

Acabou sempre o público pagando todas estas louсuras e prejuízos, porque as empresas vencedoras ou consolidadas procuravam ressarcir abusivamente prejuízos anteriores.

Les transports auxquels une ligne aurait suffi étant alors répartis sur plusieurs chemins, pour chacun d’eux les recettes sont faibles et l’exploitation relativement dispendieuse. On ne peut alors éviter des tarifs élevés, et les capitaux engagés dans la construction ou dévorés dans la lutte ne reçoivent qu’un petit intérêt.

Dans son ouvrage sur le Régime des Travaux Publics en Angleterre, M. Ch. de Franqueville en a publié des fragments, qui montrent que les luttes se terminent toujours par un accord, que les prix définitifs sont généralement plus élevés que ceux qui étaient primitivement perçus, sans que, pour cela, les dividendes soient satisfaisants, de sorte que, suavant un témoin “la balance est au préjudice du publie aussi bien que des actionnaires.”

(La Gournerie – cit. págs. 25 e 26).

Em um país, como o nosso, em que falta sobretudo o capital e sobejam meios de empregá-lo lucrativamente, são indispensáveis o monopólio dos transportes e a existência de um plano de construções ferroviárias, sábia e criteriosamente desenvolvido, que evite a dispersão dos parcos recursos nacionais.

Evidentemente, este plano, a que me refiro, não será o mapa esquemático do Estado, com algumas linhas rabiscadas a esmo, incongruentemente, sem que se conheçam os recursos das regiões atravessadas, nem se cogite dos meios para levá-las a efeito. É coisa mais séria. Não poderá ser esboçada por uma comissão pacificamente reunida na Capital.

Sua elaboração será demorada, exigirá a colaboração de todas as forças vivas do Estado e se fará de conformidade com as circunstâncias. Cada região, em harmonia com suas possibilidades econômicas, no momento propício, despertará a necessidade da construção de sua via férrea. Esta estrada, então será perfeitamente estudada pelo reconhecimento prévio do seu traçado, pelo exame de suas ligações com o sistema ferroviário existente e pelo cômputo das despesas, a que vai dar lugar e recursos necessários para cobri-las.

Examinando, assim, o caso particular de cada estrada, será fácil julgar se é possível ou não a sua construção e, no caso afirmativo, obter capitais para levá-la a efeito.

“Cada linha constitui, por si, um problema, com as condições físicas e comerciais, que lhe são peculiares”.

Every line is a problem, by itself, with its own peculiar físical and commercial conditions.”

(Wellington – Cit. pág. 4).

O papel do regulamento de concessões será facilitar estes estudos; despertar iniciativas particulares que os promovam; garanti-las eficazmente depois de empenhadas na realização dos projetos; coordenar todos os esforços, integrando-os no plano de viação férrea existente. Este programa viverá, progredirá de acordo com as circunstâncias financeiras do momento, procurando adaptar-se às regiões que ofereçam melhores condições econômicas ao seu desenvolvimento.

Não serão letra morta, como o têm sido até agora, estes planos gerais de viação, abraçando o Estado todo pelo seu traçado, mas em que se veem os recursos necessários à sua realização.

De acordo com este meu modo de pensar, o regulamento proposto não cogita do traçado prévio da rede ferroviária do Estado. Ao contrário, dispõe que se examine cada estrada de per si, quando surgirem capitais que proponham a construí-la, e procura fazer com que ela se coordene no sistema de viação existente.

VIII

Como já vimos, a Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, procura atrair os capitais, necessários às construções ferroviárias, concedendo-lhes garantias completas, de juros razoáveis e amortização integral, se forem empregados com discernimento e geridos com economia.

Ela estabelece subvenções quilométricas e garantias de juros.

Sobre estas concessões, Raul Soares, traduzindo a opinião geral, assim se exprimiu, em sua plataforma:

“A experiência, porém, das garantias de juros e subvenções quilométricas não nos permite, sem muitas cautelas, voltar àquelas formas, a que devemos não só o vulto de grandes despesas anuais, mas os danos que ainda hoje experimentamos com as tarifas altas e a insuficiência do tráfego, decorrentes do custo exagerado das linhas e suas defeituosas condições técnicas”. (pág. 15)

Analisemos a questão, a fim de mostrar quais são os inconvenientes das garantias de juros e os das subvenções quilométricas, e indicar os meios porque procuramos obviá-los.

Das garantias de juros pelo tesouro resultaram as estradas de custo exagerado, administradas de modo antieconômico, sem que os seus diretores se interessassem pelo desenvolvimento do tráfego, nem pelo da zona a que serviam. Em geral, as estipulações contratuais eram feitas de tal forma, que a empresa não tinha o menor interesse em construí-la barato, porquanto a maior custo corresponderiam, na certa, maiores e mais folgados rendimentos; nem em explorá-la com economia, porque, se a sua renda líquida ultrapassasse um certo nível, ela poderia perder aquele cômodo e seguro favor.

Das estradas concedidas com subvenções quilométricas provieram as más condições técnicas. O concessionário procurava fazer com que a subvenção cobrisse o custo das obras, portanto, procurava construí-las o mais barato possível, em detrimento das suas capacidades de tráfego e de tração. Nestas vias férreas, o tráfego é sempre precário, porque exige constantemente obras de consolidação e melhoramentos; a tração é difícil e onerosa; os trens, curtos, de pequena capacidade e vagarosos. Construíram-se, portanto, estradas de pequena capacidade de transportes e tarifas altas.

Estes sistemas foram nefastos aos interesses públicos, a que as vias férreas devem servir; aos do tesouro do Estado, cujos sacrifícios inúteis orçam por dezenas de milhares de contos, e aos capitais particulares, invertidos nas estradas de ferro, que se perderam quase por completo.

Assim, pois na sua forma primitiva, eles não podem vigorar e serão ineficazes para atrair novos capitais, porque não oferecem confiança.

Urgia, portanto, reformar aquele sistema de favores pecuniários, que fracassaram por completo.

Os seus defeitos eram:

1º – quanto ao interesse público, desinteressar às empresas da construção de vias férreas que pudessem ser trafegadas com economia e eficiência, proporcionando o desenvolvimento da sua zona, que, por sua vez, iria fazê-la progredir, ampliando o seu tráfego;

2º – quanto ao tesouro do Estado, fazer com que os seus sacrifícios resultassem improfícuos;

3º – quanto aos capitais particulares, que fossem malbaratados no seu emprego e finalmente, com a reversão pura e simples, findo o prazo contratual, perdessem todas as garantias.

A Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, e o atual regulamento procuram coibir os abusos e evitar essas causas de fracassos.

Com este intuito, a lei estabeleceu:

a) a reversão pura e simples só não se dará, se a empresa dentro de um certo prazo pré-estabelecido resgatar os auxílios fornecidos pelo Tesouro, por meio de subvenções quilométricas;

b) os juros serão garantidos por meio de tarifas, isto é, por meio do tráfego da estrada e não pelo Tesouro.

Nestas condições, a estrada que se construir, em virtude de concessões feitas por este regime, terá, antes de tudo e acima de tudo, de contar com um tráfego volumoso, próspero e remunerador.

Com efeito, a renda de uma ferrovia depende muito mais do volume do seu tráfego do que de suas tarifas

O concessionário terá, portanto, de buscar estabelecer sua estrada em zona capaz de desenvolver-se rápida e intensamente, para que haja o tráfego volumoso e rendas compensadoras. Deverá escolher com critério a obra a realizar.

La cantidad de tráfico de un ferrocarril – más que de las tarifas depende, lógicamente, de las condiciones comerciales de la zona de influencia del ferrocarril”. (R. Simon – cit. pág. 161).

Obtida a zona capaz de produzir transportes volumosos, se as tarifas forem justas e razoáveis, – a empresa terá sua renda bruta garantida. Para que tenha, porém, os juros razoáveis do capital empregado, deverá evitar que suas despesas ultrapassem uma certa percentagem máxima sobre a renda bruta isto é, terá de ser gerida com zelo, atividade e economia.

Só conseguirá, entretanto, este desideratum, o concessionário que, além de estabelecer sua estrada em uma boa zona, a construir em boas condições técnicas, porque, como é sabido, a eficiência econômica depende, diretamente, da eficiência técnica.

Diante desta circunstância, a administração particular concessionária estará inibida, no seu próprio interesse, de repetir os abusos, a que se prestam as subvenções quilométricas.

Construída e gerida por esta forma, a empresa disporá sempre de crédito e capacidade financeira, podendo, no momento oportuno, de acordo com a lei, tornar-se proprietária perpétua da estrada.

Nesta ocasião, seu capital estará perfeitamente garantido, porque o tráfego da estrada, com tarifas razoáveis garantirá seus juros e só o resgate a tirará das mãos da empresa.

Poderemos, por estes motivos, depositar a maior e mais fundada confiança na estrutura econômico-financeira dos contratos, que resultarem destas concessões.

La construction d’un chemin dont l’exploitation n’est pas assurée par une combinaison financière sérieuse, est une source de mécontentements, de pertes et de difficultés de divers genres”.

(La Gournerie, cit. pág 51).

Além de tudo, este regime contratual já está vigorando com pleno êxito em São Paulo nas unificações de contratos da C, Mogiana e E. F. Paulista.

IX

Lorsque les intérêts du concessionaire paraissent em opossotion avec ceux du public, des stipulations avec des responsabilités pécuniaires doivent être insérées au cahier des charges.”

(La Gournerie, cit. pág. 47).

O regulamento, aprovado pelo Decreto nº 906, de 21 de março de 1896, regula a fiscalização das estradas de ferro, estabelecendo as obrigações dos engenheiros fiscais. Suas disposições, entretanto, não se adaptaram às dos regulamentos de concessão, pelas quais se estipulavam os contratos.

Assim, a certos deveres dos engenheiros fiscais não correspondiam às respectivas obrigações contratuais das companhias.

No redigir a presente consolidação das leis existentes sobre concessão, procurei com suprir estas faltas.

A principal e mais razoável crítica, que se faz aos aparelhos fiscalizadores do Governo, é serem absolutamente negativos. Seus poderes e atribuições só lhes permitem evitar ou, opôr-se aos erros e faltas das empresas. É preciso dar-lhes, também, poderes reais e positivos, de modo que possam atuar eficazmente no sentido de melhorar seus serviços, torná-los mais eficientes, acompanhando o progresso da região e as crescentes necessidades de transportes, dele decorrentes. Esta necessidade surge com o desenvolvimento do tráfego.

“O próprio problema do melhoramento dos caminhos de ferro em regra só aparece quando as zonas atravessadas chegaram a um certo grão de prosperidade, para o qual elas concorreram, embora possam tornar-se depois um empecilho à continuação do seu adiantamento.”

(Raul Soares – Manifesto citado)

Para que se consiga, porém, este desideratum, deveremos organizar o regulamento e, por consequência, as estipulações contratuais dele decorrentes, de modo que aos deveres dos engenheiros fiscais de exigir os melhoramentos e ampliações nos serviços, corresponda a obrigação do concessionário obedecê-los, mantendo-se sempre com plena capacidade financeira e facilidades de crédito, para que se possa prover dos recursos necessários à execução daquelas exigências.

Os contratos, devem, pois, proporcionar às empresas concessionárias uma estrutura econômico-financeira perfeitamente elástica e adaptável às circunstâncias do tráfego ferroviário; dar amplos poderes aos engenheiros fiscais da estrada, estabelecendo, ao mesmo tempo, penalidades financeiras precisas, rigorosas e de fácil aplicação administrativa, nos casos em que suas determinações não sejam cumpridas dentro dos prazos marcados.

Procurei alcançar esta meta, utilizando-me de disposições, que já figuram no termo de novação de contratos da Leopoldina Railway, aprovado pelo Decreto nº 7.457, de 21 de janeiro de 1927, e ali introduzidos como diz a exposição de motivos do sr. Secretário, no intuito de dar “à fiscalização do Estado meios eficazes para intervir junto à administração da companhia, a fim de que o aparelhamento de suas linhas e os serviços de transportes se mantenham sempre seguros, regulares e eficientes”.

X

A caducidade do contrato, todos o reconhecem, é uma pena rigorosa demais, de difícil aplicação, a que só se recorre nos casos extremos.

La decadenza è una pena difficile a pronunziarsi perché è molto rigorosa e perché essa concerne tutta la concessione, mentre le irregolarità potrebbero verificarsi su una sola linea. È perció prudente prevedere nei capitolati delle multe, da pagarsi, ad esempio, nel caso di ritardo dei lavori.

(Tajani, Le Strade Ferrate in Italia pag. 122).

La déchéance est une mesure rigoureuse, réservée à des cas très graves et qui a été peu appliquée jusqu’ici.

(Humbert – T.C Chemins de Fer – vol. I, pág. 48).

Busquei, por isso, resolver todos estes casos por meio de penalidades pecuniárias, – multas, que serão, a critério do Governo, sucessivamente dobradas nas reincidências.

XI

O regulamento 1.018, estabelecendo que a fiscalização estadual decorria do simples fato da concessão, independente de qualquer favor pecuniário, – criava, como aconteceu no início de minha fiscalização na Leopoldina Railway, dificuldades e embaraço aos engenheiros fiscais. Ele não adaptava cada fiscalização ao gênero de concessão outorgada, com os respectivos favores e privilégios.

A rigidez das suas fórmulas gerava dúvidas, e até atritos inúteis, que indispunham os fiscais com a empresa, sem o menor resultado para o interesse público e, antes, com prejuízo para o rápido desempenho de suas funções.

Espirrando-me em Hauriou (Droit Administratif, t. I, pág. 564) e nas praxes do Governo Federal, procurei obviar aqueles inconvenientes.

A ces droits spéciaux il faut appliquer des règles spéciales, qui sont des règles de droit public, et proprement des règles de droit administratif. Mais il faut dire bien haut que ces règles spéciales doivent s’inspirer du grand principe d'égalité qui fait le fond de l'idée de justice dans tout le droit moderne” (Hauriou, apud B. C. T. P, – “Controle des Chemins de Fer, pág. 3).

Procurei, por isso, de acordo com a natureza da concessão da estrada, criar três modalidades distintas de fiscalização.

Elas se justificam da maneira seguinte:

a) Fiscalização de polícia e segurança das linhas e circulação dos trens.

É a fiscalização mais geral e ampla; a ela estão sujeitas todas as estradas de ferro no país e a sua regulamentação é feita pelo Governo Federal (Decreto Federal nº 15.673 de 7 de setembro de 1922), que aprovou “o regulamento para a segurança, polícia e tráfego das estradas de ferro”.

Este direito de fiscalizar e a polícia e a segurança das linhas e da circulação dos trens procede do dever, da obrigação mesmo, que tem todo o Governo civilizado, de zelar pela vida e segurança dos habitantes do país. Abrange não só as estradas de ferro, bem como qualquer outra via carreteira, e as próprias ruas das cidades, com a fiscalização das construções civis e as atribuições das Inspetorias de Veículos.

Este direito do Estado se exerce desde a construção da estrada, porque o poder público tem o dever de prover de modo que todas as construções e obras de infra e superestrutura da via férrea apresentem as necessárias garantias de solidez e estabilidade ao seu futuro tráfego.

Prolonga-se posteriormente, aberta a estrada ao tráfego, fiscalizando convenientemente a conservação da via permanente, a execução das obras novas, estabelecendo regras sobre a composição e circulação dos trens, rondas, inspeção do material rodante e de tração, de modo que o tráfego se faça sob as melhores condições de segurança para a vida dos passageiros

Assim, pois, este direito de fiscalização procede do mais elementar dos deveres dos governos civilizados, – o de garantir a segurança corpórea, a vida dos habitantes do país.

b) Fiscalização de horários e tarifas.

As estradas de ferro, entre nós, são concebidas e construídas com o privilégio de zona, dentro da qual gozam, de fato, do monopólio do serviço de transportes, e de regalias especiais como o direito de desapropriação, isenção de impostos, etc.

Como a tendência natural dos acionistas e diretores de companhias, livres de concorrência na zona, seria procurar os maiores lucros, podendo por essa forma entravar o progresso da região, prejudicando o interesse público, nada mais procedente do que o direito do Governo, que concede o privilégio de poder refrear essa tendência.

E ele o faz, estabelecendo os preços máximos por que devem fazer os transportes, tarifas; impondo as obrigações e deveres recíprocos das estradas e do público durante a execução deste serviço, condições regulamentares de transportes, e organizando o serviço de trens com sequência e regularidade de horários.

Esta modalidade do direito de fiscalização procede da obrigação de zelarem os governos pelos interesses financeiros, intimamente ligados ao progresso da zona concedida à estrada de ferro. É menos geral, menos ampla do que a anterior.

É regulamentada e exercida pelos governos que fazem as concessões.

Como, geralmente, em todos os países, exceto a Inglaterra e a América do Norte, as estradas de ferro são construídas com o privilégio de zona, estas duas primeiras modalidades do direito de fiscalização têm quase a mesma amplitude e a elas estão sujeitas todas as estradas de ferro.

Vou citar, entretanto, um exemplo bem frisante para mostrar a diferença das duas. Ao Governo Federal só compete a fiscalização de polícia e segurança na Rede Mineira da Leopoldina, ao passo que ao Governo de Minas, que a concedeu, competem ambas as fiscalizações.

c) Fiscalização da gestão financeira e consequente tomada de contas.

Quando o governo, além de conceder a estrada de ferro com privilégio de zona, fizer à companhia concessionária a concessão de favores pecuniários, previstos em lei, ficará tendo o direito de fiscalizar intimamente a gestão financeira da empresa, para evitar que o dinheiro público seja malbaratado.

Este direito, ele o exerce de maneira eficaz e imperiosa, podendo restringir ou mesmo suprimir despesas, que são fiscalizadas desde a sua origem, pela aprovação prévia dos projetos e orçamentos; durante a execução das obras, cujas faturas, folhas de pagamento, folhas de medição, etc., são visadas por agentes de sua confiança; e as contas, assim autenticadas, são submetidas finalmente ao exame da comissão de tomada de contas e aprovação do governo.

Assim, nas estradas concedidas com favores pecuniários, o contrato deve sempre reservar ao Governo os seguintes direitos:

a) de evitar que a renda líquida ultrapasse um certo máximo;

b) de definir o capital da empresa e suas garantias;

c) de precisar as despesas consideradas como de custeio:

d) de fazer as tomadas de contas;

e) quando a estrada se compuser de diversos trechos, sujeitos a contratos diferentes, determinar o modo de distribuição das despesas pelos diferentes trechos.

Esta definição é importantíssima, porque, como muito bem observa BRICKA (Cours de Ch. de fer, vol. II, pág. 480):

Rien n'est plus facile, sur un réseau où existent à la fois des lignes importantes et des lignes à faible trafic, que de grever ou de dégrever ces dernières dans une forte proportion; il suffit pour cela de choisir convenablement les bases de répartition.

XII

Garantida uma ingerência real e eficaz de fiscalização estadual nos negócios da estrada, sempre que o seu tráfego ou o progresso da sua região exigir melhoramento, ampliações e obras novas nas suas instalações fixas, reforma ou aquisição de material rodante, ou reorganização dos seus serviços de transporte, é preciso prever meios pelos quais o concessionário possa sempre e com facilidade dispor dos capitais necessários à execução destas obrigações.

Não só o capital do primeiro estabelecimento, como também o resultante das obras novas e aquisições reclamadas pelo desenvolvimento da estrada, – precisa ser reconhecido pelo governo e gozar das mesmas garantias.

Do contrário, a estrada não terá capacidade financeira e ficará sujeita a frequentes crises de transporte, com prejuízo do comércio e da produção da zona, a que serve.

Avec quelque soin qu'aient été étudiés à l'avance les besoins de l'exploitation, il arrive toujours un moment où les travaux exécutés pour la construction d'un chemin de fer deviennent Insuffisants; l'extension du trafic, l'augmentation de la vitesse et de la charge des trains, des mouvements imprévus dans les terrains traversés, etc., exigent des travaux complémentaires qui s'ajoutent au capital de premier établissement et qui, sur les lignes dont le trafic a pris un grand développement, peuvent arriver jusqu'à le doubler et au delà. (Bricka. Ch. de Fer., vol. II, pág. 501).

Estas necessidades aparecem sempre, e as crises transporte, por que têm passado e ainda estão passando as nossas estradas, decorrem quase exclusivamente delas.

Cai-se, desta forma, “no infalível círculo vicioso: - as más finanças se refletem sobre a conservação do material fixo e rodante, que, por sua vez, estabelece as irregularidades do tráfego, diminui a capacidade de transportes, ocasiona os desastres e acidentes, com a seu cortejo de prejuízos, que ainda mais agrava aquela situação econômico-financeira” (Revista Brasileira de Engenharia, T. VII-pág. 11).

Ora, em um sistema ferroviário qualquer, uma questão de capital importância econômica é a sua perfeita eficiência técnica.

An economic problem of prime importance is that of maintaining adequate and ininterrupted railroad service. (Ely – Railway Rates and Cost of Service – pág. 129)

Este período de crise, em que o aparelhamento da estrada não corresponde às necessidades de transporte, ainda por cima encarece o custo do serviço.

“Quando o tráfego exceder à capacidade da via-férrea, sua eficiência diminuirá e o custo direto do transporte crescerá rapidamente; haverá assim, um curto período de rendas decrescentes.”

No original:

When trafic exceeds capacity, efficiency will decrease and direct cost of operation will increase rapidly, so that there will be a short period of decreasing returns. (Ely cit. pág. 101).

Estes períodos têm sido custos na América do Norte, porque lá as estradas têm encontrado sempre recursos para se reaparelharem. Aqui, ao invés, quase sempre prolongados, porque, no geral, nossos estadistas no poder se acham imbuído de ideias erradas, sob este ponto de vista.

Estes erros são antigos e inveterados. Vem da assinatura dos primeiros contratos, na Monarquia. Quase todas as concessões com garantias de juros se baseavam numa certa despesa máxima de construções por quilômetro entregue ao tráfego, ou em capital máximo para o estabelecimento de toda a estrada.

Estes contratos, visivelmente, não poderiam criar estradas de ferro capazes de preencher os seus fins, por- que, depois de incentivar o desenvolvimento das regiões atravessadas, não poderiam acompanhar este progresso e, finalmente, viriam entorpecê-lo

O certo é que, como afirma La Gournerie:

Les raisonnements qui ont pour base le prix de construction d'un Quilomètre de chemin exigent de grandes précautions. (pág. 53).

Estas precauções, entretanto, não foram tomadas.

As mesmas dificuldades surgem nos contratos, que se baseiam exclusivamente na renda bruta da estrada.

Eles, em geral, nunca se adaptam à sua situação financeira.

Temos, aqui, um exemplo flagrante e conhecido deste fato: – o contrato de 1908 do Estado com a Leopoldina Railway, em cuja vigência se deu a prolongada crise de transportes, em que esta via-férrea se tem debatido, com prejuízo para a nossa ubérrima zona da Mata.

É admirável que hajamos cometido tais erros e permanecido neles, quando poderíamos lucrar da experiência alheia.

La Gourneris, estudando os efeitos de tais contratos, em França, chegou à seguinte conclusão:

En résumé, le produit brut est un élément qui ne paraît pas convenir pour servir de base à des stipulations dans les concessions de chemins de fer, à moins que le tarif et le nombre des trains de voyageurs ne soient fixés d'une manière invariable (pág. 114).

Adotando esta ressalva, o tráfego da estrada não progrediria e, portanto, ela não poderia ficar em correspondência com as necessidades de sua zona.

Assim, pois, a conclusão lógica é que não se deve basear uma concessão ferroviária na renda bruta.

A estas duas causas econômicas dos fracassos de nossas estradas de ferro ainda se pode juntar uma terceira: – a disseminação de pequenas concessões pelo País, que ocasionou dispersão de capitais, custo exagerado e pequena eficiência.

Teive e Argolo, competente engenheiro, tratando destas causas, por ocasião do “Congresso de Engenharia e Indústria do 4º Centenário”, transcreveu os seguintes conceitos da “Railroad Gazette”, de 20 de outubro de 1893, que ainda merecem meditação:

“O meio mais seguro do Brasil remir as somas já empregadas em linhas curtas, é reuni-las em redes.

“Ele já despendeu, em garantias a empresas particulares, o suficiente para construir uma linha do Ceará ao Rio de Janeiro, a qual teria desenvolvido o País, o que não acontecerá sem tal meio de comunicação.” “(Rev. do Clube de Engenharia, dezembro de 1900, pág. 208)”.

A estes erros e preconceitos devemos juntar outro, que tem determinado as mais funestas consequências ao nosso desenvolvimento ferroviário: – a suposição de que a exploração das estradas de ferro seja sempre muito lucrativa.

Isso não se verificou em parte alguma, segundo o testemunho de fatos conhecidos, facilmente encontráveis nos autores, que se dedicam a este assunto.

“De fato, o sistema ferroviário do mundo, tomado em conjunto, e especialmente o dos Estados Unidos, somente tem sido muito moderadamente proveitoso sob uma forma direta.” (Wellington Cit. pág. 14).

No original:

In fact, the railway system of the world, taken as a whole, and especially that of the United States, has been only very moderately profitable in any direct form.

“… l'exploitation des chemins de fer ne donne pas de produits suffisants pour rémunérer directement le capital de construction. L'exemple des deux pays exceptionnellement riches ou les chemins de fer ont été abandonnés à l'industrie privée, le démontre d'une manière péremptoire.” (Bricks – Cit. vol. II – pág. 493).

Não se pode contar com as rendas de custeio, para cobrir todas estas despesas de reaparelhamento. Nem é justo, porque, assim, teríamos tarifas excessivamente altas, para permitirem o aumento do capital ativo e real da empresa, à custa do público.

Raul Simon, no seu excelente estudo sobre Administración Comercial de Ferro-carriles (pág. 52), classifica de imoral:

“incluir entre los gastos de explotación los gastos de aumento del capital invertido, o sea, en hacer pagar a las tarifas, a más de los gastos de transporte, el aumento del valor del ferrocarril.”

Procurando satisfazer a este conjunto de condições econômico-financeiras, o regulamento proposto não fixa o capital das empresas.

Ao contrário, permite-lhe um crescimento anual, paulatino e constante, de acordo com as necessidades do tráfego da estrada, mas sob o controle do Governo, que terá de aprovar previamente os projetos e orçamentos de construções de tomadas e compras e, depois, por meio de contas, apurar anualmente o que for efetivamente gasto, que será aprovado e reconhecido como capital.

Deste capital, deduzir-se-ão todos os anos, também, as depreciações devidas ao material estragado, consumido ou substituído.

Far-se-á, assim, anualmente a avaliação do capital da empresa ferroviária, que deverá constar de:

A) Costo original de las inversiones, y

B) Variaciones por depreciación, compensaciones de la depreciación y capitalización de utilidades.” (R. Simon. Cit. pág. 101).

A empresa ferroviária terá, pois, de contrair dívidas para o seu reaparelhamento constante, porque, continuando a respeitar os conselhos de Raul Simon:

una tarifa justa no debe, en ningun caso, atender a aumento del capital, pero si:

1 – A los gastos ordinarios de explotación;

2 – A la cuota de amortización del capital activo, considerada como compensación de la depreciación; y

3 – Al servicio de interés y amortización de la deuda.” (Cit, pág. 106).

XIII

O regulamento prevê que as tarifas sejam justas e razoáveis não só para a estrada, que presta os serviços, como também para o público, que as paga.

Este assunto se desdobra em dois dos seus capítulos: no VIII – Tarifas e no X – Finanças ferroviárias.

Neste último, define as rendas da estrada, suas despesas de custeio e qual deverá ser o emprego legal, justo e razoável do excesso das rendas sobre as despesas, ou da renda líquida.

Julgo que a receita das estradas deverá cobrir:

1º – as despesas propriamente de custeio;

2º – os juros das dívidas contraídas. com o fim de aumentar o seu capital ativo;

3º – os dividendos dos acionistas;

4º – a amortização das dívidas; e

5º – a criação de contas de reserva.

Exclui, como se vê, todas as contas que tenham por efeito aumentar o capital da empresa.

Il n’y a guère de doute au sujet des éléments à faire entrer dans les comptes d’exploitation; on y comprend les dépenses de toute nature qui n’ont pas pour effet d’augmenter le capital de premier établissement, à l’exception des services d’intérêt d’amortissement de ce capital.” (Bricka – Cit. vol. II – pág. 479).

Como frequentemente e abusivamente, visando maiores lucros, certos concessionários procuram passar despesas de capital como de custeio, tratamos de definir com precisão e clareza estas últimas.

No fixar os limites justos e razoáveis dos juros concedidos ao capital do concessionário, segui à risca a letra expressa da Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927. Somente, procurei evitar cautelosamente que este capital se pudesse tornar, de qualquer forma, aguado: – proibimos o desdobramento das ações e a emissão de empréstimos, sem autorização prévia do Governo, na qual virá declarado o fim a que se destinam.

Estes empréstimos só serão emitidos sob fiscalização do Governo e só se poderão destinar a dois fins:

1º – Aumentar o capital físico ativo; ou

2º – Amortizar dívidas anteriores.

O primeiro fim justifica-se por si mesmo.

Não é tão clara e evidente a razão de ser do segundo. Ela se baseia, entretanto, na prática de um dos sistemas ferroviários mais adiantados, mais eficientes e melhor fiscalizados do mundo – o Norte, Americano.

El valor del capital emitido – junto con destinarse a incrementos de Capital Físico se ha empleado así, principalmente, en la amortización, o, mejor dicho, reemplazo del Capital Pasivo. Es esta una observación que merece recordarse, por cuanto otros ferrocarriles, fuera de los Estado Unidos, tienden a amortizar la deuda con sus propias entradas, lo cual lleva a la inconsecuencia de que los Balanços producen grandes utilidades simultáneas con déficits de Caja.

(R.Simon – Cit. 160).

Este mesmo autor, estudando o que se passa com as vias férreas chilenas, justifica a utilidade e razão de ser deste procedimento das estradas americanas.

Foram, também, tais fundamentos, que me fizeram adotar estas ideias no regulamento proposto, atendendo a que nossas vias férreas têm tráfego escasso.

Eis seu raciocínio:

Estas amortizaciones, por el hecho de representar una reducción del Capital Pasivo, provocan una utilidad correlativa en el Balance. En cierto modo esto favorece a los ferrocarriles, ya que el gobierno autoriza las tarifas necesarias para costear las amortizaciones respectivas. Pero, en otro sentido, debido a la escasa densidad de tráfico, resulta imposible hacer efectivas tarifas tan elevadas que produzcan el excedente de entradas necesario para reducir a dinero el valor de esta amortización.

Se ha producido así, en la práctica, una situación curiosa de utilidad en el Balance simultánea con un Déficit de Caja.”

Se comprende que, ante el hecho de una escasa densidad de tráfico, la mejor solución para los ferrocarriles de Chile sería el no recargar las entradas ordinarias con el peso de una amortización violenta de la Deuda para lo cual podría recurrirse a la conversión de la Deuda Consolidada requiriendo una amortización menor, distribuida. en mayor número de años, o efectuar anualmente nuevas emisiones de bonos por valor de la amortización el por efectuar. La última solución sería la más correcta, pues toda empresa solo está obligada, teóricamente, a mantener una deuda igual al Capital Física y, en ningún caso, a eliminar su deuda con las entradas ordinarias, ya que ello obligaría a una elevación injusta de tarifas.” (Cit. pág. 214).

Estas ideias, como se vê, aplicam-se como uma luva às nossas linhas férreas.

XIV

No estado atual do nosso desenvolvimento ferroviário temos necessidade, pode-se dizer inadiável, de uniformizar a contabilidade de todas as nossas estradas de ferro, os conceitos, regras, instruções e procedimentos para a coleta dos dados e informações que nelas devem figurar e nas suas estatísticas anuais.

Neste assunto, tudo está por fazer entre nós.

Na América do Norte já existe este sistema uniforme de contabilidade, imposto pela lei “Valuation Act”, de 1913, regulamentado sob a fiscalização eficiente da Interstate Commerce Commission, vigorando desde 1º de julho de 1914,

Lá, a Railway Accounting Officers Association, cujos membros representavam 72.000 milhas (115.000 quilômetros) de estradas em tráfego, resolveu secundar os esforços do Governo, porque uma boa e eficiente uniformização da contabilidade a todos interessava – no estabelecer as normas e modelos, redigir as definições e conceitos, instruindo o pessoal das contadorias ferroviárias.

Na Inglaterra vigora, também, a contabilidade uniforme, estabelecida pelo Railway Companies Act, de 19 th December, 1911, cujo artigo 1º reza:

1º – Every railway company shall annually prepare accounts and returns in accordance with the form set in the First Schedule to this Act, and shall submit their accounts to their auditors in that form.

Tradução:

“Todas as companhias de estrada de ferro anualmente organizarão sua contabilidade e seus lucros de acordo com a fórmula imposta no primeiro anexo desta lei e submeterão suas contas aos seus auditores (conselho fiscal) naquela fórmula”.

4º – If any railway company fails to prepare or forward, in accordance with this section, such accounts and returns as are thereby required, the company shall be liable on summary conviction to a fine not exceeding five pounds for every day during which the default continue.”

Tradução:

“Se alguma companhia de estrada de ferro deixar de organizar ou remeter, de acordo com esta seção, tal contabilidade e demonstração de lucros como já foi por este decreto estabelecido, a companhia será responsável e sumariamente condenada a uma multa, que não excederá a cinco libras esterlinas por dia, em que a falta persistir”.

Os artigos 2º e 3º desta lei que manuseio no Railway Accounts and Finance de Newhook, (pags. 63 e seguintes) determinam que uma via destas contas será enviada ao Board of Trade e que somente esta repartição fiscal poderá introduzir modificações nas fórmulas legais de contabilidade.

Aqui, o nosso governo ainda não se abalançou a legislar sobre este assunto, mas já os nossos congressos de estrada de ferro e os técnicos, que se dedicam a estes assuntos, reclamam a lei, criando a repartição centralizadora e as normas de uniformização da contabilidade.

O nosso primeiro Congresso de Estradas de Ferro, em 1882, assim estabeleceu a sua tese IX:

“Há outra questão de ordem diversa, mas também de grande importância, pois dela depende o proveitoso resultado que pode trazer o estudo comparativo do serviço das nossas estradas de ferro; referimo-nos a uniformidade que convém haver na discriminação das despesas e nos quadros estatísticos relativos a locomoção, conservação, tráfego e administração das estradas de ferro em tráfego”.

E este Congresso votou:

“Evidentemente a perfeição em tal matéria seria organização dos relatórios por um sistema único, adoção de um número suficiente de tabelas, as mesmas para todas as empresas e onde se pudesse encontrar informações minuciosas sobre todos os assuntos importantes necessários”.

O Congresso de Vias e Transportes, reunido na Capital Federal, em 1909, por sua vez resolveu:

O Congresso de Vias e Transportes no Brasil é de parecer que:

“1º – Todos os trabalhos estatísticos se centralizem, se não nas mãos de um único empregado, ao menos sob a mesma direção”.

As razões e vantagens desta uniformidade são óbvias. Para patenteá-las, será utilíssima a leitura do estudo publicado pelo Dr. Palhano de Jesus, na Revista Brasileira de Engenharia (T. IX número 3, pág. 79), “Memorial sobre estatística ferroviária no Brasil”. São dele os seguintes conceitos, que transcrevo:

“Notemos antes que, a nosso ver, a necessidade da estatística ferroviária comporta três grãos, correspondentes a três funções distintas.”

“1º – Habilitar a administração de determinada ferrovia a acompanhar por meio de comparações criteriosas e oportunas, a marcha dos serviços complexos e conexos de que depende a prosperidade financeira e econômica da empresa”.

2. “Habilitar os presidentes das companhias e os acionistas a exercerem, mesmo de longe, uma fiscalização real sobre a gestão dos negócios em que hajam empenhado os seus nomes e os seus capitães”.

“Foi, se não me engano, esta consideração que exerceu maior influência na América do Norte ao tratar-se de dar uniformidade e publicação periódica às estatísticas e balanços ferroviários”.

“3º – Habilitar o poder público a exercer uma fiscalização especial e notável sobre o desenvolvimento econômico geral, pelo exame comparativo e especial do instrumento ferroviário, tão intimamente ligado às indústrias agrícolas, manufatureiras e comerciais, cujo grão geral de prosperidade e declínio tal instrumento é ato a indicar sumariamente”.

Graças a este sistema uniforme de contabilidade, organizado sob a fiscalização direta da Interstate Commerce Comission, cujos membros e fiscais podem “inspecionar as estradas quando entenderem e outrossim examinar os livros de escrituração para capacitar-se de que são realmente observados os modelos oficiais por ela estabelecidos”, conseguiram a “fiscalização direta e pormenor da vida financeira das empresas”, e “todos os negócios ferroviários são patenteados ao público e nada têm de secretos”.

“O duplo alvo supremo visado por tal organização é”, como diz Emoris, “tornar o público capaz de exercer a sua influência fiscalizadora nos negócios de transporte e trazer o Congresso perfeitamente a par de tudo o que se passa em semelhante assunto”.

“Visa ela, em segundo lugar, o exame e solução das reclamações sobre tarifas”.

Esta solução, ensina o exemplo americano do norte, será particularmente útil e necessária às empresas particulares, cuja vida depende das tarifas. O Governo só poderá ter força e prestígio para impor tarifas remuneradoras, podendo provar facilmente, por simples comparações estatísticas, a honestidade de sua gestão financeira, a economia de suas despesas e a eficiência técnica dos seus transportes: o que conseguirá por meio das estatísticas uniformes, publicadas oportunamente.

É o que mostra de modo claro, patente e indiscutível Raul Simon:

Enseguida, establecida ya una tarifa, ο un sistema de tarifas uniforme, quedaba por estabelecer el valor financeiro de las tarifas. Logicamente, solo podia existir dos bases de cálculo. En efecto, se tenía una región geográfica con una producción por transportar; se tenía también, una empresa de monopolio para efectuar ese transporte. La tarifa, en consecuencia, debía calcularse sobre lo que la producción pudiese soportar o sobre lo que el ferrocarril debiese recibir. Naturalmente, si la producción no pudiese por lo menos soportar lo que el ferrocarril necesitase recibir, el transporte dejaría de efectuarse. Al mismo tiempo, si la producción pudiese pagar más de las necesidades del ferrocarril, el interés público exigiría una rebaja de tarifas. La cuestión quedaba entonces concretamente reducida a fijar como límite de las tarifas, las necesidades del ferrocarril.”

La legislación Americana sobre tarifas ferroviarias ha terminado así por basarse en este único principio: Ela establece que el producto de las tarifas no debe sobrepasar una razonable utilidad sobre el valor de los capitales invertidos. Pero, al tratar-se de utilidades o de valor de capitales, se encontraron luego tantas definiciones como opiniones consultadas o interesadas”.

Naturalmente, como sucede en la mayoría de los ferrocarriles fuera de los Estados Unidos, estos conceptos son largamente discutidos por parte de las empresas, el público y el Gobierno, ya que, por lo general, en cada uno de los tres casos existe puntos de vista e de conveniencia différentes. Aparte de ello, la no existencia de un régimen absoluto de Contabilidad que se extienda hasta donde la contabilidad se confunde con finanzas, es decir, hasta donde la contabilidad deje de ser pasiva para transformar-se en directiva, produce la dispersión y aun la contradicción en los conceptos que determinan los resultados de la explotación de un ferrocarril”.

Las estadísticas, balances y estados. financieros son así presentados por los ferrocarriles de acuerdo con las disposiciones del "Sistema Uniforme de Cuentas" aplicado a partir del 1º de julio de 1914. De ese modo todos los ferrocarriles Americanos son comparables entre sí. Del mismo modo, cualquier ferrocarril extranjero que adopte el Sistema Uniforme de Cuentas, tendrá la ventaja de poseer un régimen científico de contabilidad y producir resultados y estadísticas, comparables con 192 diferentes ferrocarriles de I Classe. Los Gobiernos, por su parte, encontrarán en el mismo sistema el único medio posible de control e información que permita autorizar tarifas calculadas sobre la base de una determinada utilidad.” (Simon – Administración Comercial de Ferrocarriles – págs. 96, 97 e 98).

Baseando-me nestas considerações, feitas em artigo. que saiu publicado na “Revista das Estradas de Ferro”, número de 15 de dezembro de 1927, procurei, no regulamento, criar as bases para o estabelecimento desta contabilidade uniforme, que será essencial à boa fiscalização das empresas de transportes, tornando comparáveis os resultados que figuram nos seus balanços e estatísticas.

Esta iniciativa, entretanto, para produzir os seus resultados não deveria partir do Governo do Estado, mas do da União, para que abrangesse todas as nossas vias férreas. Só assim poderíamos conhecer o movimento ferroviário nacional de um modo seguro, preciso e eficiente.

XV

Para empresas, que tenham grandes capitães empenhados em instalações fixas, dentro do Estado, julgo que as canções só devem existir e vigorar, no período inicial do contrato, como garantia pela execução das obras previstas.

Depois, devem ser levantadas, porque instalações fixas o garantem perfeitamente, durante a sua vigência.

É assim que determina a lei paulista de concessão de estradas de ferro (Lei nº 30, de 16 de julho de 1892, art. 2º § 3º), referendada pelo eminente engenheiro Alfredo Mala.

Aqui no Estado, nos termos do Decreto nº 3.357, de 11 de novembro de 1911, vigora princípio inteiramente diferente.

O § 2º – do seu artigo quinto estabelecia:

“§ 2º – Para garantir a execução do contrato, depositarão os concessionários nos cofres do Estado, em dinheiro ou em apólices federais ou estaduais:

a) 10:000$000 antes da assinatura do contrato;

b) 50$000 por quilômetro da estrada concedida, à medida que forem aprovados os estudos definitivos, se forem estes feitos por seções, nunca inferiores a 50 quilômetros.

§ 3º – A caução a que se refere a letra poderá ser levantada pelos concessionários, logo que esteja concluído e entregue ao tráfego cada trecho correspondente da estrada; a de que trata a letra a ficará retida e dela poderá o governo lançar mão para o pagamento de multas em que, porventura, tenham incorrido os concessionários.

Nesta hipótese, deverão os concessionários entrar para os cofres do Estado, no prazo de 30 dias, contado da data da imposição da multa, com as importâncias que faltarem para completar a dita caução e se, não o fizerem, perderão está em sua totalidade e será rescindido o contrato, salvo, porém, o caso de força maior, devidamente justificado, a juízo do governo.

Assim, os concessionários depositam duas cauções, e uma delas ficará retida no Tesouro durante toda vigência do contrato.

Anteriormente não era assim. Pelo regulamento 1.018 não havia caução.

Adotei, no regulamento proposto, já que não há lei fixando as cauções, – uma solução intermediária.

Fixei uma só caução, de dez contos por cem quilômetros ou fração de 100 quilômetros da estrada concedida. Esta caução, sendo maior, garantirá melhor do que as precedentes a execução dos contratos.

Ela será retida até que o concessionário tenha instruído mais da metade da quilometragem concedida e, neste período, garantirá as multas que lhe forem impostas, nos mesmos termos do regulamento atual.

Posteriormente, será restituída, ficando ao Governo facultado o direito de sequestrar a renda da estrada, no caso de ser necessário cobrar-lhe qualquer penalidade, que ela não haja satisfeito nos prazos contratuais.

Parece-me que essa solução consulta melhor ao interesse público e ao do concessionário.

Alla stipulazione dell'atto di concessione il concessionario deve dare una cauzione provisoria per assigurare che, entro il termine da fissarsi nell'atto stesso, egli farà il deposito definitivo, prescritto a guarentigia dell' esenzione dell’impresa assula. II deposito definivo viene restituito a rate, a misura che procedano i lavori di costruzione, salvo un'ultima rate che vien ritenta fin dopo il collaudo dell'opera”. (Tajani, Le Strate Ferrate in Italia -pag. 119).

XVI

Il principio che regola riscatti è che, volendo allontanare un concessionario, o perché la sua presenza impedisce di migliorare il servizio nell'interesse pubblico, o per qualsiasi altra ragione, non si può negargli il compenso che gli spetta.

La legge però, nell'interesse dell'erario, fissa a priori il prezzo del riscatto e lo determina in base agli utili netti ottenuti dalla ferrovia negli ultimi 5 anni precedenti alla diffida. Tra questi, 5 nani si scelgono i tre di maggior reddito, e si fa la media dei prodotti relativi; questa media rappresenta l'annualità da pagarsi no termine della concessione.” (Trajani, cit. pag. 122).

Servi-me de Tajani, professor do Real Politécnico de Milano e mestre consagrado nestes assuntos, para definir o fim a que se destina a cláusula de resgate ou encampação.

Como a Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, que estamos regulamentando, teve por escopo principal atrair capitais particulares para o desenvolvimento das nossas construções ferroviárias, procurei melhorar a redação da cláusula de resgate do regulamento 1.018, procurando garantir melhor os direitos do concessionário.

Prescrevia este regulamento (art. 96) que o preço do resgate seria fixado por dois árbitros:

“Na avaliação se tomará em consideração, não só a importância das obras no estado em que estiverem, sem alteração do seu custo primitivo, mas também a renda líquida da estrada nos cinco anos anteriores”.

“Em nenhum caso, porém, o preço do resgate que resultar do arbitramento será superior a uma soma, cuja renda anual de seis por cento seja equivalente à renda líquida média nos cinco anos anteriores”.

Combinando esta disposição regulamentar com o que dispõe o Decreto Estadual Paulista nº 3.179, de 9 de março de 1920, aprovando as cláusulas para unificação dos contratos da Companhia Paulista, procurei dar melhor redação às condições de resgate, dispondo o que constava de um único, em cinco artigos diferentes.

Separei as estradas em tráfego em dois grupos: a) com rendimento superior a 8% sobre o capital reconhecido pelo Governo; e b) com rendimento inferior a 8%.

Para as primeiras, o preço do resgate será fixado pelo termo médio do rendimento nos últimos 5 anos.

No segundo caso, o preço de resgate será fixado por acordo ou por meio de arbitramento. Nesta avaliação, não se levarão em conta somente as obras no estado em que estiverem, como prescreve o 1.018, mas, no contrário, “todos os bens do concessionário, no estado em que estiverem, com a depreciação razoável, tendo-se em vista a renda líquida que são capazes de produzir”.

A redação atual é mais ampla do que a anterior, compreendendo as estradas em tráfego e as em construção. A do 1.018, servindo-se da expressão: – “obras no estado em que estiverem”, parece referir-se especialmente ao caso das estradas em construção.

Dispõe o regulamento para a polícia, segurança e tráfego das estradas de ferro, aprovado pelo Decreto Federal nº 15.675, de 27 de agosto de 1973:

“Art. 35 – Os cruzamentos das vias férreas por condutores e canalizações de energia elétrica ou fios elétricos serão executados com observância das prescrições especiais estabelecidas pelo Governo no intuito de garantir a segurança da estrada, cabendo a esta exigir e fiscalizar o cumprimento de tais prescrições”.

“Parágrafo único – Os proprietários ou concessionários dessas instalações elétricas ficam obrigados a realizar, nos cruzamentos já existentes as obras e mudanças necessárias, exigidas de conformidade com as mencionadas prescrições”.

Por sua vez o regulamento estadual de “Quedas d’água”, Decreto nº 6.273, de 23 de março de 1923, dispõe:

“Art. 45 – Para os condutores elétricos prevalecerão mais, no que lhes forem aplicáveis, as disposições que regem as linhas telegráficas e telefônicas, feitas ou concedidas pelo governo da União ou do Estado”.

“Art. 83. Ao fiscal incumbe:

nº 8 – Determinar em qualquer tempo, por ordem do governo, reparação, modificação ou demolição, parcial ou total, das obras, sem direito de indenização ao concessionário, desde que se verifique que, por suas condições, prejudicam a saúde e segurança pública e os interesses gerais da navegação e da agricultura”.

Infelizmente, porém, não prescreveu as condições materiais, em que se fariam os cruzamentos da via férrea com os condutores de energia elétrica, nem as canalizações d’água. Resolvi, por isso, e, também, porque a E. F. Mogyana já nos reclamou contra esta falta, aproveitar-me do Regulamento francês (Hospitalier et Roux, Formulaire de l'Électricien Mécanicien, ano de 1901, pág. 1.124 e seguintes), redigindo tais prescrições.

Com o desenvolvimento do tráfego e os progressos da região, em que a estrada se desenvolve, já se têm verificado, entre nós, necessidades, que os primitivos regulamentos não previam a existência de indústrias, que exijam ramais e material rodante especiais para o seu serviço.

Felizmente, estas necessidades surgiram ao longo de estradas diretamente administradas pelo Governo Federal, que não estavam sujeitas a contratos e que por isso mesmo, melhor e com maior rapidez, se puderam adaptar às novas condições de tráfego.

Posteriormente, os Ministros da Viação, Pires do Rio e Francisco Sá, ambos notáveis engenheiros e competentes conhecedores das nossas necessidades ferroviárias, regularam este assunto (Portarias de 3 – VIII – 1926 e 18 – III – 1925).

Neste regulamento, previ tais casos, sem entrar em pormenores sobre a sua solução.

XIX

Una buona politica ferroviaria può creare la prosperità di un popolo; mal maneggiando questo potentissimo strumento economico si può per converso produrre l'impoverimento delle finanze nazionali, senza alcun adeguato vantaggioso effetto per il pubblico.” (Tajani, cit. pag. 1).

Nossas estradas de ferro já estavam à porta da bancarrota e já tem passado por duras crises de transportes. Fruto de uma legislação fragmentaria e, muitas vezes, incongruente, procurando de preferência, servir interesses das regiões, com a construção do nosso sistema ferroviário dispersamos enormes capitais em obras que, até hoje, ainda não puderam ser economicamente aproveitadas.

“Procurando satisfazer a todos, não se satisfaz realmente a nenhum”.

“Estas pequenas verbas são então empregadas em obras, que não têm mais fim, que nunca atingem no seu termo”.

“Capitais imobilizados em obras que nunca se completam, capitais que por isso mesmo não podem dar lucro, capitais perdidos pelo abandono das obras; eis o resultado dessa dispersão anti-econômica das rendas da União destinadas a obras federais, dispersão que esteriliza os capitais, esterilização que constitui um dos inúmeros fatores de situação econômica”. (Joaquim Murtinho Relat. citado).

No conceder as estradas e distribuir a cota parte do auxílio, que deverá caber a cada uma delas, cumpre ao Governo não perder de vista estes sãos princípios econômicos.

No regulamentar o tráfego de cada uma delas, durante a vigência dos respectivos contratos, muito lutaremos, observando as seguintes lições do dr. Raul Fernandes, em sua conferência de 14 de novembro de 1927, na Faculdade de Direito da Universidade desta Capital.

“Esta última, (solidariedade social buscando o fundamento da autoridade na realização dos deveres incumbidos ao Governo) no domínio do direito administrativo, modificou substancialmente a noção do contrato, cuja teoria se inspira nas ideias gerais dominantes no direito privado, mas dobra-se ao império de um princípio diferenciador, que lhe dá fisionomia distinta. Esse princípio é o de que o contrato administrativo visa o funcionamento regular e contínuo de um serviço público. Desse elemento essencial decorre, entre numerosas consequências, a obrigação, para quem se compromete por um contrato administrativo, de assegurar antes de tudo a regularidade e a continuidade do serviço contratado. Esta obrigação tem um caráter extensivo, que não encontramos nas obrigações resultantes dos contratos civis; isto é: o concessionário, ligado estreitamente ao desempenho do serviço de utilidade geral, é adstrito a prestá-lo quaisquer que sejam as circunstâncias supervenientes”.

“Mas, por outro lado, se tais circunstâncias excedem o máximo das dificuldades previstas, ou ultrapassam o limite das variações econômicas que podiam ser levadas em conta no momento da celebração do contrato, ao poder concedente corre o dever de prestar ao concessionário uma compensação adequada por meio de indenização, ou de atenuação dos seus encargos, ou de qualquer outra composição. A economia do contrato pressupõe uma equação financeira, que é de equidade manter, fazendo-se variar certos elementos favoráveis ao empresário se, em outros elementos desfavoráveis, ocorrem modificações imprevistas. Esta é, em linhas gerais, a teoria chamada da imprevisão, sob cuja influência, sistematizada em uns países ou empírica em outros, o regime das concessões de serviços públicos industriais vai por toda a parte adquirindo essa flexibilidade necessária para conciliar o bem geral com a equidade”.

A Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, dispondo (art. 5º, parágrafo único) que as tarifas serão reguladas sobre a base média do movimento do tráfego, de forma que o rendimento líquido nunca seja inferior a 10% do capital despendido e reconhecido pelo Governo, – procurou satisfazer a principal destas condições.

No redigir o presente regulamento, considerando as condições econômico-financeiras das nossas estradas: – o seu capital, o seu tráfego e as suas tarifas, – procurei aproveitar tanto quanto possível a nossa já longa e por vezes dura experiência no assunto.

Busquei, com afinco, seguir o seguinte conselho de La Gournerie:

Rechercher et constater les lois naturelles, tâches de remonter à leurs principes, y conformer nos institutions: voilà les limites dans lesquelles notre activité peut utilement s’exercer”. (Cit. pág. 96).

É preciso, agora, que na sua execução, não percamos de vista estes ensinamentos. Deveremos, ao contrário, fiscalizar rigorosamente todas as concessões, evitar-lhes os possíveis erros dos seus administradores e amparar-lhes a existência, de modo que se desenvolvam com atividade e eficiência.

Não deveremos nos aferrar aos privilégios e favores concedidos, para, diante deles, fazer exigências descabidas ou impossíveis.

Les avantages accordés à une Compagnie ne sont pas des faveurs, mais la condition expresse sous laquelle elle a accepté différentes charges minutieusement stipulées dans les actes de concession”. (La Gournerie Cit. pág. 22)

As exigências exageradas ou descabidas, acarretando o fracasso dos capitais comprometidos na concessão, são duplamente prejudiciais aos interesses públicos: – desacreditam as nossas iniciativas e afugenta os capitais particulares.

XX

Entre os elementos de êxito com que poderá contar uma nova via-férrea, nenhuma supera o povoamento rápido dos terrenos marginais.

No governo Afonso Pena, sendo Ministro da Viação o dr. Miguel Calmon, todos os contratos de concessões se fizeram, obrigando a administração da estrada a empreender e ativar este povoamento.

Aproveitando-me daquelas cláusulas e do atual regulamento de colonização do Estado, procurei dar às empresas ferroviárias este elemento de êxito e introduzi no presente regulamento um capítulo sobre a “Colonização dos Terrenos Marginais”.

XXI

Os meus estudos e observações sobre vida econômico-financeira das estradas de ferro nacionais fazem-me considerar como retrógrada e antieconômica a cláusula de reversão gratuita.

Referindo-se à América do Norte, disse o dr. Raul Fernandes:

“Reconheceu-se, ali, que a reversão de obras e instalações sem indenização impõe necessariamente ao concessionário a necessidade de amortizar o capital dentro do prazo da concessão, e acarreta, por isso, duas consequências prejudiciais: – lança injustamente a cargo da geração atual o ônus de pagar, sob forma de taxas mais altas, o custo de um empreendimento destinado a beneficiar também outras gerações futuras; e, por outro lado, o cálculo da amortização pelas taxas dentro de prazo fixo supõe inalterável o capital investido na empresa, e impede que as instalações se ampliem à medida que o progresso local requer um desenvolvimento paralelo dos serviços prestados. A experiência mostra que, realmente, onde prevalece o regime da reversão gratuita não há outra alternativa senão: – o estacionamento do comércio, da indústria e, em geral, da atividade na região, por insuficiência do serviço de que dependem; ou sucessivas prorrogações do prazo das concessões para amortização de novos capitais, o que praticamente torna platônica a vantagem visada por esse regime.”

Aqui entre nós, onde todas as estradas, com raríssimas exceções, têm tido uma vida financeira precária, a exigência desta cláusula é iníqua.

Pelo regime anterior, Lei nº 148, de 10 de maio de 1948, e regulamento 1.018, ela era obrigatoriamente imposta a todas as companhias, que recebessem auxílios pecuniários do Tesouro Estadual.

Felizmente a Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, veio sanar este defeito, permitindo que as estradas resgatem este ônus, restituindo ao Tesouro os auxílios recebidos.

Esta medida foi justa e, como figura no presente regulamento, será razoável e útil: será um dos freios, com que poderá contar o governo do Estado, para fazer com que o concessionário procure gerir os seus negócios com economia, atividade e zelo.

XXII

“Mas tarifas móveis concessões não reversíveis sem indenização, supõem um governo tendo a noção justa do princípio diferenciador dos contratos de direito público, e dosando prudentemente, no espírito com que os executa, a imparcialidade, a energia e a equidade”.

“Para essa orientação, que explica em boa parte o adiantamento técnico e econômico dos serviços de utilidade geral em outros países, a administração, entre nós, está desarmada”.

(Raul Fernandes – Conferência citada).

A Lei nº 1.001, de 21 de setembro de 1927, regulamentada como o propomos, patenteará o adiantamento técnico e econômico da atual administração mineira; mostrará que tem esta “noção justa do princípio diferenciador dos contratos de direito público”.

Será preciso, porém, que, para o futuro, ela se mostre imparcial, enérgica e equitativa, na execução flexível de suas disposições, de modo a conduzir a feliz termo os grandes interesses em jogo e presos ao nosso desenvolvimento ferroviário.

XXIII

Acham alguns, exagerada a duração de 90 anos para os privilégios concedidos. Esta crítica já tem sido feita, por várias vezes, a João Pinheiro, por causa da novação de contratos da Leopoldina Railway, em 1908.

Não acho procedente a crítica, porque, em países capitalistas, como a França, a concessão das grandes redes é por 99 anos (Bricka-Chemirds de Fer, vol. II, pág. 496) e porque a longa duração do contrato torna visceralmente os mesmos, os interesses do concessionário e os de ordem pública da região explorada pela estrada.

Quand la concession est à long terme, la prospérité de chaque Compagnie de monopole est intimement liée à celle de la région qu'elle dessert”. (La Gournerie cit, pág. 51).

XXIV

Terminando, sr. Secretário, esta já longa exposição, estou certo que V. Exc. me perdoará o enfado, que causará sua leitura, tendo em vista o vulto dos interesses em jogo e as dificuldades da matéria a regulamentar.

Esforcei-me por fazer uma exposição precisa, com clareza e concisão, do problema ventilado, justificando as soluções propostas. Conto que este esforço será minha melhor excusa.

Trata-se, como V. Exc. sabe, de regular, questões de vulto, intimamente ligadas ao desenvolvimento dos nossos interesses econômicos.

Nestas condições, seguindo o bom exemplo, dado várias vezes pelo governo federal, acho conveniente a publicação prévia do regulamento esboçado, para que os interessados façam suas observações e sugiram as necessárias modificações.

Será um meio de melhor salvaguardar os interesses gerais.

Diretoria de Viação e Obras Públicas, 25 de janeiro de 1928. – Alcides Lins, diretor.