Itamar Alves lembrou que os pescadores ficam o tempo todo a procura de uma área que não esteja tomada para tentar fazer seus trabalhos
Segundo Vítor Carvalho, o surgimento dos aguapés pode se dar pelo uso incorreto das águas, como em Nanuque

Proliferação de aguapés no Rio Mucuri barra pesca em Nanuque

O despejo de esgoto no curso d´água e represamento em hidrelétrica são as causas do crescimento desordenado das algas.

26/05/2022 - 21:39

Cobrar da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e de órgãos mineiros do setor providências para acabar com a praga de macrófitas (aguapés) que invadiu o Rio Mucuri, em Nanuque (Jequitinhonha/Mucuri), prejudicando cerca de 150 pescadores impedidos de continuar a atividade. Essa foi a conclusão a que chegaram participantes da audiência pública realizada no município, nesta quinta-feira (26/5/22), pela Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Consulte o resultado da reunião.

O drama dos pescadores começou em 2007, quando a empresa responsável pela Usina Hidrelétrica de Santa Clara, onde está ocorrendo o problema, suspendeu o trabalho de retirada das algas. Associado ao despejo de esgoto no curso d´água, pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e por indústrias locais, sobretudo a Frisa Frigorífico Rio Doce, as plantas se proliferaram descontroladamente, cobrindo boa parte do rio.

Itamar Alves dos Santos, um dos profissionais atingidos, contou que os pescadores passam o tempo todo procurando alguma área que não esteja tomada para tentar fazer seus trabalhos. Na tentativa de evitar o avanço dos aguapés, eles instalam cordas aquáticas de uma superfície à outra fazendo um bloqueio.

“Mas, quando o vento vira (a direção), as macrófitas destroem as cordas e as redes, que queimam debaixo d´água”, conta Itamar. Muitos barcos também acabam ficando retidos no emaranhado vegetal.

Paulo Célio Gonçalves Souza contou que precisam ficar até 8 horas no rio, aguardando uma trégua das algas para conseguir navegar de volta pra casa. “Antes da construção da barragem eu tinha vida, ganhava entre R$ 2 mil e R$ 3 mil. Hoje já não consigo. Misericórdia para os pescadores de Nanuque”, apelou o pescador.

Empresa se recusa a receber pescadores

O presidente do Sindicato Colônia dos Pescadores Profissionais Z9, Moisés de Oliveira Rocha, lamentou que a Ibitu Energia, responsável pela represa, sequer responda aos ofícios e pedidos encaminhados pelos pescadores.

O Sindicato já ganhou uma ação contra a Ibitu, que foi condenada por danos ambientais, mas ainda não tomou as providências para a retirada das algas. A entidade também acionou a justiça contra a Copasa, exigindo o tratamento do esgoto e aguarda, há dois anos, que um perito seja mandado ao local para verificar as denúncias.

O problema já afeta a sobrevivência dos pescadores e muitos estão desistindo do ofício, segundo Moisés Rocha. A Ibitu foi convidada, mas não compareceu e nem mandou representantes para a audiência pública.

As causas do problema

Vitor Carvalho Queiroz, representante do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea/MG), explicou que o surgimento dos aguapés pode ser um fenômeno natural ou trazido pelo uso incorreto das águas, como em Nanuque. As plantas crescem desordenadamente pela presença excessiva de matéria orgânica, presente nos rejeitos despejados no rio.

No caso da Hidrelétrica Santa Clara, a água represada contribui para a proliferação das algas. O excesso das macrófitas provoca a morte de plantas aquáticas e impede a entrada de luz e a troca de gases, reduzindo o oxigênio da água e prejudicando os peixes. A água contaminada pode ainda, segundo o especialista, liberar toxinas, disseminando doenças contraídas por bactérias e impedindo outros usos do recurso, como lazer e consumo.

Por se tratar de um rio federal, a responsabilidade é da ANA. Vitor Queiroz explicou que a Resolução nº 40, de 2020, da agência, trata das condições de uso das águas na bacia do Rio Mucuri. E para acompanhar essas condições, o órgão realiza reuniões anuais na região, readequando os termos de alocação da água.

Ele sugere que os pescadores participem desses encontros para denunciar à agência a situação de Santa Clara e solicitar a remoção das macrófitas, além da regularização da destinação dos esgotos lançados in natura no rio. “Tem que juntar as empresas e retirar os aguapés, mas se não atacar as causas, eles vão voltar em pouco tempo”, advertiu.

Providências

O presidente da comissão, deputado Marquinho Lemos, e a deputada Andréia de Jesus (ambos do PT), presentes à reunião, redigiram requerimentos solicitando providências dos órgãos responsáveis. À ANA foi pedido fiscalização das irregularidades cometidas pelas empresas, inclusão da retirada dos aguapés no plano de manejo do Rio Mucuri e o convite aos pescadores para a reunião pública que a agência realiza anualmente para tratar de assuntos relativos ao curso d´água.

Marquinho Lemos lamentou a ausência também da Copasa e das empresas na reunião e reafirmou que o problema precisa ser resolvido com urgência. “O principal problema é o lançamento do esgoto no rio. Espero que a Copasa assuma sua responsabilidade”.

Para Andréia de Jesus, a situação é também de insegurança alimentar, pois além de retirar o emprego dos pescadores, impede que os peixes sejam ofertados à população. “Vocês (os pescadores) carregam nas mãos uma forma de alimentar o Estado. Temos direito à água potável e a um rio com vida”, defendeu a deputada.

O secretário Municipal de Meio Ambiente de Nanuque, Daniel Miranda de Sá Filho, afirmou que a prefeitura tem mantido reuniões com as empresas para discutir a melhor forma de retirar as plantas.

O policial ambiental da cidade, cabo Apolônio, informou que a Ibitu já foi acionada e que procuradores do Ministério Público Federal estiveram na região para verificar os danos causados pelas algas. No município vizinho de Carlos Chagas, a Suzano Papel e Celulose, que cuida da represa local, já iniciou os trabalhos de remoção.