Especialistas voltam a defender imunização infantil
Audiência destaca segurança de vacinas contra Covid; dois deputados questionam lei que obriga pais a vacinarem crianças.
10/02/2022 - 16:13A necessidade de se esclarecer as famílias sobre a segurança da vacinação de crianças contra a Covid-19 e de se buscar ativamente aquelas que ainda não receberam as doses foi o tom da maioria dos convidados de audiência pública da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Durante a reunião, realizada na manhã desta quinta-feira (10/2/22), houve questionamentos sobre a obrigatoriedade dos responsáveis em imunizar essas crianças, mas especialistas afirmaram que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina tal obrigatoriedade.
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Representantes da Secretaria de Estado de Saúde mostraram dados que evidenciam a ainda baixa adesão das crianças à campanha de imunização. De acordo com Marcela Ferraz, pouco mais de 20% das crianças entre 5 e 11 anos estão vacinadas. Em Minas Gerais, são, ainda de acordo com a representante da SES, cerca de 1,8 milhão de crianças nessa faixa etária, a última a ser incluída entre o público-alvo da vacinação.
De acordo com a convidada, faltam cerca de 450 mil doses para que o Estado tenha o suficiente para a primeira dose de todas as crianças desse público-alvo. O governo federal já teria se comprometido a entregar esse quantitativo ainda em fevereiro, mas Marcela Ferraz ressaltou que ainda existem imunizantes disponíveis e que o baixo índice de vacinação é reflexo da falta de adesão das famílias.
Nesse sentido, Janaína Passos de Paula, também representante da SES, apontou que a disseminação de informações erradas sobre a vacina têm prejudicado a campanha.
Ela ressaltou que a vacina não é experimental e que sua eficácia contra casos graves já está comprovada. Ela também apontou que a escola é uma instituição importante para a promoção da saúde infantil.
Volta às aulas presenciais
Uma das polêmicas que tem envolvido a vacinação e a educação é o retorno às aulas, que chegou a ser adiado em alguns municípios para que fosse possível vacinar todas as crianças antes da volta ao formato presencial de ensino.
A prefeita de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Marília Campos (PT), fez o relato sobre o município que comanda. As aulas não chegaram a ser adiadas, mas a prefeita afirmou que as escolas darão o prazo de 30 dias para os responsáveis legais pelas crianças mostrarem os cartões de vacinação dos alunos.
O objetivo não é impedir que as crianças frequentem a escola, mas, segundo a prefeita, conhecer a realidade das famílias, esclarecer dúvidas, estimular a vacinação e, se for o caso, informar o Conselho Tutelar sobre as famílias que se negarem. Isso, de acordo com Marília Campos, está amparado pelo ECA, que obriga os responsáveis a vacinarem as crianças.
A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) também foi favorável a aumentar o papel das escolas na imunização infantil, inclusive promovendo a vacinação dentro do ambiente escolar, como já foi feito em outras campanhas.
Obrigatoriedade de vacinação do ECA é questionada
Os deputados Bartô (sem partido) e Bruno Engler (PRTB) questionaram a obrigatoriedade citada pela prefeita Marília Campos e disseram que as ações por ela mencionadas são formas de coagir as famílias e tirar delas a autonomia. Segundo eles, a legislação só tem como obrigatórias as vacinas discriminadas no Plano Nacional de Imunização (PNI), que ainda não incluiu as doses contra a Covid-19.
O deputado Bartô disse, ainda, que o baixo número de óbitos de crianças por Covid-19 indica que elas não fazem parte do grupo de risco e falou que está assustado com o que chamou de “sanha pela vacina obrigatória”.
O parlamentar afirmou que não é "antivacina" e que já destinou emenda parlamentar para pesquisas sobre a vacina, mas que as próprias farmacêuticas indicam que ainda há estudos a serem feitos com relação a essas vacinas e que muitos deles estão para serem finalizados ao longo do ano de 2022 e 2023.
A obrigatoriedade legal, porém, foi reafirmada por outros convidados. A defensora pública Francis de Oliveira Coutinho, falou da saúde como direito coletivo listado na Constituição da República. Ela apontou também que o artigo 14 do ECA determina que é dever dos responsáveis garantir a vacinação de crianças menores de 18 anos com imunizantes recomendados pelas autoridades sanitárias.
Nesse âmbito, a defensora pública lembrou das recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a respeito da vacinação contra a Covid-19. “A liberdade individual não pode passar por cima de direitos coletivos e inalienáveis, como é o caso da saúde”, completou.
A médica sanitarista e membro do Coletivo Mães Pró-Vacina, Stela Deusa, se posicionou da mesma forma e lembrou nota técnica emitida pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais, que afirmou que o órgão também é favorável à imunização das crianças.
Também em diálogo com os dois parlamentares, a médica Ana Cristina Pimentel disse que “quem está constrangendo as famílias é quem está divulgando notícias falsas”. Ela afirmou, ainda, que o Brasil demorou a aderir à vacinação infantil e que vários países já estavam imunizando crianças desde meados de 2021.
Para ela, há uma campanha organizada para produzir medo nas famílias, o que ela chamou de “difusão ideológica do medo”. “Quem segue os preceitos da ciência está fazendo o papel oposto: tranquilizando e garantindo a saúde das crianças”, disse.
Médicos reiteram segurança da vacina
O médico infectologista e membro do Comitê de Enfrentamento da Covid-19 da Prefeitura de Belo Horizonte, Unaí Tupinambás, também se contrapôs diretamente à posição do deputado Bartô e reafirmou a segurança da vacina. “Nenhuma vacina para crianças foi tão estudada como essa contra a Covid-19”, afirmou. Ele acrescentou, ainda, que o Brasil é campeão em mortes infantis ocasionadas pelo novo coronavírus e disse que nenhuma morte por doença que pode ser prevenida por vacinação é aceitável.
No mesmo sentido, o professor e pesquisador do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), André Oliveira, salientou a segurança dos imunizantes e afirmou que a Covid-19 é uma doença pediátrica. Segundo ele, embora a maioria das crianças sejam assintomáticas ou tenham sintomas leves, muitas ainda podem precisar de tratamentos intensivos ou até morrerem.
O cientista disse que crianças que não se vacinam e contraem a doença têm 37 vezes mais chances de desenvolver miocardite do que as imunizadas. A inflamação, segundo ele, tem sido divulgada como um dos riscos de efeito colateral provocado pela vacina, mas, de acordo com André Oliveira, a incidência é ínfima para os que recebem o imunizante.
Ele sugeriu à Secretaria de Estado de Saúde que nas campanhas para vacinação, a informação da raridade de efeitos colaterais seja explicitado para evitar a hesitação dos pais. “A decisão de não vacinar a criança não é livre de riscos, pelo contrário, os riscos são muito mais severos. E isso precisa ser divulgado”.
A deputada Beatriz Cerqueira (PT) também advertiu para o fato de que mais crianças no Brasil hoje morrem por Covid-19 do que por qualquer outra doença. “Vacinação não é questão de opinião e sim de proteção à vida”, disse a deputada.