Modelos alternativos para a educação foram discutidos na reunião desta terça (14)
Para Ana Maria Camargo, educação básica deixa a desejar tanto em universalização como em equidade e qualidade
Especialistas defendem gestão de escolas públicas por entidades privadas sem fins lucrativos

Liberdade de escolher onde estudar é defendida em audiência

Para convidados, modelos como voucher e gestão compartilhada com rede privada teriam menos gasto e melhor resultado.

14/09/2021 - 18:44

Alternativas para a oferta de educação em Minas foram debatidas nesta terça-feira (14/9/21), em audiência da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) solicitada pelo deputado Bartô (sem partido).

Críticas à qualidade da educação pública, defesa da liberdade de escolha e preocupação com gastos sem que haja o devido retorno em qualidade do ensino marcaram a fala de convidados, que apoiaram a adoção de alternativas, entre elas a do voucher educacional e as chamadas charter schools.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

O voucher seria um subsídio oferecido pelo Estado às famílias para que elas paguem as mensalidades de seus filhos em escolas e creches particulares, ao passo que as charter são escolas públicas geridas por entidades privadas sem fins lucrativos, nos moldes adotados por países como Estados Unidos e agora em vias de implementação no Estado, por meio do projeto piloto Somar.

Para Anamaria Camargo, presidente do Instituto Livre para Escolher, é lastimável  a situação da educação básica no País, que, segundo ela, deixa a desejar tanto em universalização como em equidade e qualidade, demandando alternativas educacionais.

Em contrapartida, ela disse que países como o Chile gastam pouco a mais do que o Brasil por aluno, mas teriam desempenho escolar bem superior.

“Isso (melhor desempenho) não se dá às custas de segregação, pois vem caindo a diferença entre pobres e não pobres. É preciso ter em mente que o Brasil tem PIB baixo porque escolheu ser pobre”, disse.

Segundo ela, em posição oposta, em melhor situação de PIB e desempenho educacional, estão países que se encontram no topo do ranking em liberdade econômica e de escolha.

Ela também comparou a situação brasileira com a Estônia. Disse que este país, até 1995, era pobre como o Brasil, mas que hoje estaria entre os top cinco da OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico –, que coordena  o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).

Mesmo com somente 11% de escolas privadas, a Estônia teria escolas públicas com autonomia de gestão, inclusive com diretores decidindo sobre questões salariais dos professores, a partir de um mínimo definido, o que segundo Anamaria explica a melhoria da situação educacional daquele país.

Ela ainda mencionou que das 30 melhores escolas de Nova Iorque, 23 adotam o modelo charter, atendendo em sua grande maioria alunos pobres.

Com vagas limitadas, a entrada nessas escolas americanas é por sorteio, e estudos mostram que os sorteados alcançam resultados melhores em relação aos que ficaram de fora, afirmou ela. Essas escolas, de acordo com Anamaria, gastam 33% menos recursos por aluno do que as escolas públicas e teriam melhores resultados. 

Ela também citou como outro exemplo de alternativa a poupança educacional criada nos EUAs, em que pais gerenciam recursos em conta da criança, para serem usados em mensalidades escolares, serviços e produtos educacionais. “No Brasil, alternativas assim vão requerer reforma na Constituição e reforma administrativa, mas o orçamento público deve servir melhor ao estudante”. 

A presidente do instituto ainda lamentou que esteja ganhando força no País a defesa de um sistema nacional de educação, sob a justificativa de falta de coordenação entre União, estados e municípios.

Estado - Kellen Nunes, assessora da Subsecretaria de Desenvolvimento da Educação Básica da Secretaria de Estado de Educação (SEE), defendeu o projeto Somar e ainda o projeto Trilhas, de formação profissional, como as duas grandes frentes do Estado na discussão de alternativas educacionais.

Segundo ela, a perspectiva do governo é buscar a melhoria da qualidade do ensino com gestão compartilhada, no caso do Somar, e aproveitar também a estrutura privada para dar mais oportunidades de educação profissional, no caso do Trilhas, que teria 96% de vagas ocupadas por alunos oriundos da rede pública.

Qualidade e equidade justificariam novo modelo

Gabriel Mendes, presidente do Echoice Brasil, também defendeu a liberdade educacional pela qual, segundo frisou, cabe aos pais o direito de escolher a educação para seus filhos. Ele disse que o modelo charter envolve escolas conveniadas e representaria uma boa opção. “O governo se torna um fiscalizador em vez de um provedor (de educação)”, endossou.

Ele ainda disse que muitos pais querem uma escola diferente e afirmou esperar que mais instituições entre as cerca de 3.600 do Estado venham a inovar nessa direção. Na sua avaliação, o projeto Somar já representaria um avanço, embora ainda pequeno, na direção da autonomia da gestão escolar.

Autor do livro Vouchers da Educação, Marcos Ricardo dos Santos disse que, a partir de 2014, o Brasil triplicou seu orçamento de educação em relação aos anos 2000, mas isso não teria se revertido em qualidade

Ele afirmou que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em todos os estados mostraria que as escolas privadas têm resultados melhores do que a educação pública. “Hoje a elite pode escolher, é preciso aproximar os dois mundos”, argumentou sobre a defesa do voucher, segundo ele um modelo que combina equidade e eficiência.

Mudanças demandam tempo e preparação

Mário Cenni Júnior, presidente da Cidade dos Meninos, do Sistema Divina Providência, relatou que a Escola Estadual Lar dos Meninos, com 320 alunos, e a Escola Estadual da Cidade dos Meninos, com três mil alunos no ensino fundamental e médio, além de mil alunos no infantil, funcionam em termo de colaboração com a SEE e com doações de empresários que apadrinham alunos.

Ele disse que alternativas educacionais como essas são importantes, mas ponderou que elas dependem de tempo para serem escolhidas e implementadas, e manifestou o temor de que várias formas de financiamento da educação venham a não dar certo sem uma preparação sólida dos professores.

Também Adriano Naves Brito, professor universitário e ex-secretário de Educação de Porto Alegre, disse que mudar o sistema é complexo. Ele expôs que experiência em sua gestão mostrou que a rede municipal de Porto Alegre, mesmo tendo a maior remuneração média salarial dos professores do País e um quadro dos mais bem qualificados, ficou entre as que tiveram os piores resultados em português e matemática em 2017, tendo sido pouca a adesão nas provas seguintes, de 2019.

Ele disse que há 216 escolas comunitárias em Porto Alegre, como são chamadas aquelas que possuem um contrato com o poder público, um termo de cooperação assinado por cinco anos, com aumento previsto e evitando-se apadrinhamento político ou descontinuidade. 

“Mas investimento em educação é para 20 a 30 anos, o sistema vai precisar de tempo para que seja uma mudança consistente, os Estados Unidos fazem essas mudanças há 40 anos e só 10% das escolas lá são charter”, também ponderou.

Essas escolas em parcerias, segundo ele, mostram que em níveis como Educação de Jovens e Adultos gastou-se por aluno três vezes menos com resultados quatro vezes melhores do que da rede pública.

Deputados apoiam inovações

O deputado Bartô e a deputada Laura Serrano (Novo) avaliaram que todas as falas mostraram que o objetivo de alternativas discutidas para a educação deve ser o resultado final entregue para o aluno.  

Laura Serrano acrescentou que o governo estadual tem inovado na gestão da educação. “A ciência mostra que parcerias inovadoras trazem bons resultados. Trouxeram aqui evidências, como por exemplo a de que o voucher permite a redução das desigualdades”, acrescentou a parlamentar.

Por sua vez, o autor do requerimento da audiência acrescentou que muitas vezes há setores que se utilizam de desculpas para que não haja melhorias que possam garantir a autonomia de gestão e liberdade de escola. “Na prática, em 2015 e 2016, de cada um real investido na educação, vemos que só 23 centavos chegavam de fato no seu fim, para o aluno ou professor”.