Esta foi a quarta audiência sobre o projeto do governo de Minas, que propõe a municipalização do ensino fundamental
Itaúna aponta prejuízos com a implantação da municipalização escolar na cidade

Comunidade de Itaúna rejeita Mãos Dadas

Projeto do governo não ofereceria garantias no repasse dos recursos nem transporte aos alunos que serão transferidos.

09/08/2021 - 13:42

“O projeto Mãos Dadas em Itaúna (Centro-Oeste) está acontecendo sem garantia de transporte dos alunos, sem espaço nos prédios das escolas ou garantia do repasse dos recursos por parte do Governo do Estado”. Esta afirmação foi feita pelo vereador de Itaúna, Gustavo Dornas Barbosa, durante audiência pública sobre a implementação do projeto no município, realizada pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã desta segunda-feira (9/8/21). 

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

O objetivo do Projeto Mãos Dadas é ampliar a oferta dos anos iniciais do ensino fundamental nos municípios, por meio da municipalização de escolas estaduais. A proposta consiste no repasse de recursos técnicos, materiais e financeiros pelo governo.

Os repasses aos municípios que desejarem aderir ao projeto serão efetuados mediante a assinatura de termo de adesão, renovado anualmente, e que pode ser rescindido de forma unilateral a qualquer tempo.

A reunião não contou com a presença de nenhum representante da Secretaria Municipal de Educação ou do Governo do Estado, que foram convidados. De acordo com o vereador, a comunidade não foi ouvida e foram realizadas duas audiências públicas na Câmara Municipal de Itaúna, com questionamentos que não foram respondidos pela Prefeitura. A votação do projeto na Câmara Municipal está prevista para a próxima terça-feira (10).

“Meu posicionamento é técnico, não político. Fiz proposta para a superintendente, que os alunos da escola Das Neves continuassem no local e a escola fosse transformada em tempo integral, pois isso mitigaria o efeito da municipalização e traria um benefício para a comunidade. Mas o prefeito e o Governo do Estado estão fazendo negociações a portas fechadas”, explicou o vereador Gustavo Dornas Barbosa.

Segundo ele, cerca de 400 alunos serão migrados para o prédio da Escola João Dornas, que foi planejada para o ensino fundamental e possui salas de 43 metros quadrados, que comportam 25 estudantes cada uma.

“Os alunos não vão caber lá. E também temos 106 estudantes da Zezé Lima a serem transferidos para a Parque Jardim, o que implicará na construção de duas salas, que, segundo a Prefeitura, na verdade são quatro. Mas no projeto não há a previsão de construção de quatro salas, mas duas, nem os R$ 3 milhões que o Estado teria de repassar para a municipalização das escolas. O projeto não pode ser votado como está, precisa ser aprimorado”, ressaltou.

Para economista, adesão ao projeto trará prejuízos ao município

O economista e coordenador técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na Subseção do Sind-Ute/MG, Diego Severino Rossi de Oliveira, destacou que, se Itaúna aderir ao Mãos Dadas na forma como ele está proposto hoje, o prejuízo deverá ser em torno de R$ 6 milhões ao ano, considerando o atual custo por aluno nos anos iniciais. 

“Não temos acesso às informações atualizadas do município pela Secretaria de Educação. Mas se considerarmos os dados aos quais temos acesso, atualmente o Estado investe cerca de R$ 26 milhões, R$ 9.600 por aluno nos anos iniciais. Para manter esse investimento no nível que está, com a municipalização, a Prefeitura deverá investir a mais, por ano, mais de R$ 11 milhões. Como a contrapartida prevista pelo governo nesse processo será de R$ 5 milhões, teremos um débito. Lembrando que o projeto de lei fala que o repasse dos valores está condicionado à disponibilidade financeira e orçamentária. Ou seja, se não houver disponibilidade de recursos, o dinheiro não seria repassado”, reforçou.

O economista frisou, ainda, que um dos argumentos para a municipalização, que seria a melhoria no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no Estado, não se justifica. “Eles falam que no Ceará isso impactou no aumento do Ideb, mas a municipalização lá começou em 1996, com o crescimento no Ideb ocorrendo em 2019. E um crescimento que é equivalente ao índice atual do Ideb em Minas. Um processo de municipalização de mais de 20 anos para chegar no mesmo Ideb que já temos. É um processo que está sendo vendido aos municípios como uma melhoria, mas pode ter consequências drásticas, afirmou. 

Professora de Itaúna e integrante da Comissão contra a Municipalização, Zucimara Alves do Carmo afirmou que os pais, que não foram incluídos em nenhuma das etapas do processo decisório, estão desesperados.

“Eles estão com medo que as crianças sejam jogadas e distribuídas para outras escolas à revelia. E a maioria não tem dinheiro para bancar o transporte por conta própria. Falta empatia do governo com os nossos alunos. Ninguém é transparente sobre que crianças vão para onde, quantas crianças serão transferidas e quantas ficarão por turma”, pontuou. 

Planejamento – Representante da região, o deputado Gustavo Mitre (PSC) manifestou preocupação com a votação da matéria na Câmara Municipal sem ouvir os anseios da comunidade escolar. “Temos excelentes profissionais no Governo do Estado e na Prefeitura de Itaúna. Precisamos chegar num denominador comum. E eu espero que a partir deste debate na ALMG os vereadores de Itaúna repensem”. 

A deputada Beatriz Cerqueira (PT) lembrou que a comissão tem feito uma série de audiências sobre o projeto, debatendo os impactos da municipalização em diversas cidades. “O Estado tem o dever do diálogo e da escuta com a comunidade escolar. Como decidir algo que terá um impacto tão grande na vida de tantas pessoas sem ouvi-las? É um custeio permanente alto, do qual o município não dará conta. A educação é uma política de estado, não de governo", disse. 

Esta é a quarta audiência pública realizada pela comissão sobre o projeto Mãos Dadas, contido no Projeto de Lei (PL) 2.675/21, do governador, encaminhado à ALMG em abril. Na primeira, foram ouvidos representantes de instituições de ensino, sindicalistas, especialistas em educação e gestores do Executivo. Os outros dois debates abordaram as consequências da municipalização para a rede de ensino de Betim (Região Metropolitana de Belo Horizonte) e de Salinas, Grão Mogol e São Francisco, municípios do Norte de Minas.