Comissão pediu dados mais atualizados sobre a situação das crianças e adolescentes durante a pandemia
Segundo Ana Carolina Gusmão, a maioria das agressões denunciadas acontece dentro de casa
Entidades discutem políticas para garantir direitos de crianças e adolescentes em Minas

Meninas estão vulneráveis diante de pais e padrastos

Em Minas, cerca de 40% dos acusados de agressões e estupros são pais ou padrastos das vítimas, do sexo feminino.

26/05/2021 - 16:27

Quase metade dos casos registrados de denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes em Minas Gerais tem como agressores pais e padrastos. Os dados foram apresentados pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quarta-feira (26/5/21). 

A Superintendente de Participação e Diálogos Sociais da secretaria, Ana Carolina Gusmão da Costa, apresentou dados do Disque 100, do Mapear (elaborado pela Polícia Rodoviária Federal) e do Observatório da Segurança Pública. Segundo ela, as agressões denunciadas, incluindo o estupro de vulneráveis, acontecem na maior parte dos casos dentro dos domicílios

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

“Pais e padrastos são acusados em 40% dos casos, e 82% das vítimas, segundo o Disque 100, são do sexo feminino. Tivemos um pequeno decréscimo no número de casos comparando os três primeiros meses de 2020 aos três primeiros meses de 2021. Mas aí podemos atribuir isso às questões relacionadas à pandemia. Sabemos das dificuldades das vítimas de saírem de suas situações atuais e das pessoas próximas denunciarem”, explicou. 

Coordenador do Fórum de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes de Minas Gerais e da Associação Circo Belô, Moisés Barbosa Ferreira Costa reclamou da falta de dados mais atualizados sobre exploração sexual, tendo em vista as mudanças trazidas pela pandemia.

“Precisamos de ferramentas mais eficazes porque agora temos divulgação de menores de idade em exploração sexual via WhatsApp, algumas são inclusive exploradas no ambiente virtual, sem o encontro pessoalmente. Como vamos chegar até esses casos? Se não entendermos de fato onde e como está acontecendo, impossível enfrentar com qualidade esses casos”, afirmou. 

Ele também clamou por mais campanhas educativas e placas nas rodovias e em estabelecimentos nas margens de estradas, locais onde, historicamente, muitos casos de exploração sexual ocorrem no interior do estado. Nesse seu apelo, o coordenador foi acompanhado pelo Presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, Edson de Oliveira Cunha. 

“Não há recursos para investimentos para difundir essas campanhas pelo Estado. O poder público tem falhado. A pandemia provavelmente trouxe resultados diferentes de estatísticas, mas não temos como ter certeza. Não há fontes para sabermos como estão as crianças e adolescentes com suas famílias. E eu me pergunto onde foram parar os R$ 24 milhões arrecadados para o Fundo Especial para Infância e Adolescência (FIA), que o governo não usou pra nada”, questionou Cunha.

Imunização - Presidente do Fórum Mineiro de Conselheiros e Ex-Conselheitos Tutelares de Minas Gerais (FMCT), Carlos Guilherme da Cruz disse que, por causa da natureza do trabalho, o governo deveria priorizar a vacinação dos conselheiros tutelares, que, na maioria das vezes, precisam atuar presencialmente junto às famílias. 

“Isso sem falar no sucateamento dos conselhos, na falta de qualificação e treinamento. Porque eu percebo uma diferença muito grande entre videoaulas e treinamento. Treinamento permite tirar dúvidas. E no dia a dia surgem muitas práticas que precisam ser resolvidas por esses agentes, que têm o dever de zelar pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pela proteção das crianças e adolescentes”. 

Promotora de Justiça e Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, Paola Domingues Botelho Reis de Nazareth pediu a ampliação de ambientes e novas salas de depoimentos especiais que abranjam todo o Estado.

“Precisamos de um fluxo de atendimento mais articulado, mais pessoas capacitadas a fazer uma escuta protegida das crianças e evitar a revitimização, com compartilhamento das informações entre os órgãos”. 

Parlamentares cobram dados atualizados

Deputados autores do requerimento para a realização da reunião, Ana Paula Siqueira (Rede) e Doutor Jean Freire (PT) destacaram a importância de saber dados mais atualizados sobre como estão as crianças e adolescentes durante a pandemia.

“Crianças e adolescentes vulneráveis podem se tornar mercadorias, serem vítimas de tráfico, pornografia, prostituição e exploração em turismo sexual”, afirmou a parlamentar. Ela também informou que, ao longo da audiência, foram propostos vários requerimentos endereçados a diferentes órgãos do Estado solicitando informações e providências. Ela disse que eles serão votados na próxima reunião da comissão, em razão de quórum.

A deputada Laura Serrano (Novo) lembrou que, pelo Disque 100 e pelo 180, qualquer pessoa pode denunciar gratuita e anonimamente violações de direitos humanos, 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. “Fundamental que todos tenham conhecimento disso”, reforçou.

Já a deputada Andréia de Jesus (Psol) demonstrou preocupação com cidades do Norte de Minas, onde o índice de violência contra crianças aumentou durante a pandemia e não há serviços específicos para atendimento. “Ir à delegacia acaba sendo uma segunda violência, com os atendentes despreparados para receberem as famílias, que ficam estigmatizadas nas cidades”, completou.