Preocupação com o fim do atendimento psiquiátrico no Galba Veloso motivou protesto
Número de leitos em hospitais psiquiátricos está abaixo do recomendado pela OMS

Fim da psiquiatria no Galba Veloso é mantido pelo Estado

Governo argumenta que hospital é necessário para garantir atendimento clínico prejudicado pela pandemia de Covid-19.

14/10/2020 - 19:25

A transformação do Hospital Galba Veloso, em Belo Horizonte, de uma unidade de tratamento psiquiátrico para outra de atendimento clínico será mantida pelo Estado, ainda que tenha sido incisivamente criticada por deputados e por representantes do governo federal em audiência pública realizada nesta quarta-feira (14/10/20), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

Durante a reunião, organizada pela Comissão de Saúde da ALMG, parlamentares e representantes da União afirmaram que o fechamento dos 130 leitos psiquiátricos está agravando um deficit de atendimento que já existia em Minas Gerais.

Já os representantes do Estado argumentaram que a mudança de função do Galba Veloso foi a melhor alternativa encontrada para cobrir outro deficit produzido pela pandemia de Covid-19, relativo a atendimentos clínicos não relacionados à nova doença. 

A coordenadora-geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde, Maria Dilma Teodoro, afirmou que o governo federal não foi oficialmente comunicado sobre o fechamento dos leitos psiquiátricos e que continua repassando recursos para custeá-los. “Temos leitos fechados e não sabemos para onde estão indo os recursos desses leitos”, disse a representante do Ministério.

Com relação a esse repasse de recursos, o presidente da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), Fábio Baccheretti, informou que a instituição não recebe verbas diretamente da União, mas que estas são repassadas primeiramente para o município.

Ele acrescentou que a Fhemig já não recebe esse financiamento da prefeitura desde que os últimos pacientes psiquiátricos deixaram o Galba Veloso.

De acordo com o dirigente da Fhemig, a transferência e a alta dos pacientes psiquiátricos do Galba Veloso ocorreu entre março e junho deste ano. Em 20 de outubro, deverá ser concluída a obra de adaptação do hospital para atendimentos clínicos.

Ele negou que a intenção do Estado tenha sido, em qualquer momento, usar as instalações para tratar vítimas da Covid-19, mas sim de outras doenças, que estariam mal assistidas em função do redirecionamento de vagas para enfrentar a pandemia.

Segundo ele, a avaliação do governo é que o novo coronavírus continua sendo uma ameaça. “Não sabemos quando virá um novo pico da Covid”, afirmou.

O principal motivo da escolha do Galba Veloso para a transformação em hospital para atendimento clínico, explicou Fábio Baccheretti, foi seu índice de ocupação de 64,54% no mês de março de 2020, inferior ao do Instituto Raul Soares, que seria a outra opção.

Baixo índice de leitos psiquiátricos é apontado como causa de suicídios e crimes

Um dos autores do requerimento para realização da audiência pública, o deputado Cássio Soares (PSD) afirmou que Minas Gerais, mesmo antes do fechamento do Galba Veloso, contava com uma taxa de leitos psiquiátricos inferior à média brasileira. Ele ressaltou que essa média, no Brasil, é de 0,1 leito por mil habitantes, enquanto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda um índice entre 0,3 e 0,5.

Tanto Cássio Soares quanto o secretário nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas do Ministério da Cidadania, Quirino Cordeiro Júnior, relacionaram essa baixa oferta de leitos psiquiátricos ao crescimento do número de suicídios e de crimes relacionados a pessoas com sofrimento mental. “Houve um aumento de 620 para 1,5 mil notificações ao ano, de 1996 a 2018”, afirmou Cássio Soares, em relação aos suicídios consumados.

Sobre o argumento de que o Galba Veloso apresentaria baixa ocupação, Cássio Soares disse que o próprio Boletim Informativo da Rede Fhemig mostra que a média de ocupação do hospital em 2019 foi de 88%. "Há um movimento de desmonte dos hospitais psiquiátricos em Minas Gerais", afirmou.

Precarização - Também autor de requerimento para realização da audiência pública, o presidente da Comissão de Saúde, deputado Carlos Pimenta (PDT), salientou que a precarização da rede de atendimento psiquiátrico ocorre em um momento particularmente cruel, em que um grande número de idosos enfrentam problemas mentais decorrentes do confinamento imposto pela pandemia de Covid-19.

Esse argumento foi repetido pelo deputado Bartô (Novo), que atribuiu a redução das vagas de internação psiquiátrica a questões ideológicas. “O fechamento do Galba Veloso só pode ser definido como uma loucura”, disse.

Os deputados Professor Cleiton (PSB), Hely Tarqüínio (PV) e Zé Guilherme (PP) também defenderam a ampliação dos leitos psiquiátricos públicos em Minas Gerais. “O fechamento do Galba foi um grande erro”, afirmou Zé Guilherme.

Sobre a cobrança de ampliação de leitos psiquiátricos, o subsecretário de Políticas e Ações em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde, Marcílio Magalhães, informou que o Governo de Minas já prepara uma nova política hospitalar, que deverá ampliar em 143% a oferta deste tipo de vagas. No entanto, isso ainda dependeria de tempo e recursos.

A promessa de uma nova política hospitalar, no entanto, não convenceu o deputado Cássio Soares, que cobrou medidas mais urgentes. “Isso é um processo de dois a três anos. Como ficam os pacientes até lá? O secretário (de Saúde) falou para esperarmos o fim da pandemia. Não dá para esperar”, criticou.