Especialistas da UFMG alertam para importância do isolamento
Para professores, prevenção tem sido essencial e flexibilização pode aumentar casos de contaminação pelo coronavírus.
29/04/2020 - 20:26A quebra do isolamento social como forma de conter a proliferação da pandemia de Covid-19 pode trazer o caos para o Brasil, como o verificado em países como Itália, Espanha e Estados Unidos. O alerta foi feito por especialistas da Universidade Federal de Minas Gerais que participaram, nesta quarta-feira (29/4/20), do websimpósio “A pandemia de Covid 19 e o isolamento social: reflexões e contribuições da UFMG”.
O evento foi transmitido pela TV Assembleia, fruto de uma parceria técnica entre a universidade e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que prevê a produção e disseminação de conhecimento sobre a doença e de legislação e instrumentos de fiscalização da atuação dos demais Poderes.
“Não é momento de desmobilização, e sim de estarmos atentos. A prevenção pode parecer invisível mas tem sido crucial para preservar o sistema de saúde e as pessoas mais vulneráveis”, advertiu a reitora da UFMG, Sandra Goulart. Ela lembrou que se em Minas a propagação da doença está menor que em outros Estados, é consequência das medidas que foram adotadas no início da pandemia.
Na mesma linha, Unaí Tupinambás, infectologista e professor da universidade, afirmou que, a partir do decreto que impôs o isolamento em Belo Horizonte, a transmissão da doença só tem caído.
A taxa de ocupação dos 906 leitos de unidades de tratamento intensivo (UTIs) gira em torno de 84% e, nos 208 leitos destinados aos pacientes com Covid-19, a taxa é 35%. Nas 4.740 enfermarias para atendimento geral, a ocupação é de 65%, enquanto esse percentual é de 39% nas 440 enfermarias separadas para o tratamento contra o coronavírus.
A rede pública de saúde também tem sido beneficiada com a retração do movimento na cidade. O gerente de Atenção à Saúde do Hospital das Clínicas, Alexandre Ferreira, disse que a parada foi importante para reorganizar as medidas de atendimento e proteção à população, reestruturar os equipamentos de assistência do Sistema Único de Saúde (SUS) e os sistemas de notificação e monitoramento epidemiológico.
“Hoje, tenho segurança que o SUS (em Belo Horizonte) está melhor preparado. Se perdermos o isolamento, podemos ter um colapso”, advertiu.
Desafios ainda são grandes
Se, por um lado, Minas está conseguindo controlar a propagação da Covid-19, o Estado ainda precisa se preparar para os desafios que o isolamento impõe, segundo os especialistas.
Hugo Cerqueira, economista e professor da Faculdade de Ciências Econômicas (Face), afirmou que ainda não se sabe o tamanho exato da crise econômica que se abaterá sobre todo o planeta, mas que é certo que a pobreza será maior.
Segundo ele, é unanimidade entre especialistas de diferentes correntes econômicas que a intervenção do Estado será fundamental para salvar vidas e a economia.
Para o professor, é preciso manter o isolamento e tomar medidas para minimizar os impactos da pandemia na redução de renda e no aumento do desemprego. Essas ações vão demandar mais gastos públicos para garantir renda básica emergencial, ampliar o seguro-desemprego, apoiar pequenas e médias empresas e financiar o sistema de saúde.
Ele criticou o governo federal por demorar a tomar medidas e insistir em querer abrir as atividades comerciais, com o intuito de evitar gastos públicos. “Diante de uma crise dessas, a equipe econômica continua presa a um discurso velho e inadequado”, se queixou.
De acordo com o economista, o financiamento desses gastos pode vir de medidas como a taxação de fortunas e patrimônios e alíquotas progressivas de impostos, aliviando quem ganha menos e exigindo de quem ganha mais.
Educação - Os desafios do isolamento ultrapassam, no entanto, os aspectos econômicos. Na área da educação, a pró-reitora de Graduação da UFMG, Benigna Maria de Oliveira, não vislumbra a substituição das aulas presenciais pelas virtuais como uma possibilidade, em função das grandes desigualdades e dificuldades de acesso dos estudantes e dos professores.
Segundo a professora, para a retomada das atividades, será preciso infraestrutura computacional e tecnológica, atividades de tutoria, investimento em formação docente, intervenção pedagógica e assistência estudantil, para garantir inclusão e acesso ao ensino público e de qualidade.
Risco de transmissão do coronavírus ainda é alto
A evolução da transmissão do coronavírus no Brasil ainda é considerada alta. O professor Flávio Figueiredo, do Departamento de Ciência da Computação da UFMG, explicou que o modelo que calcula os riscos de transmissão considera que, quando a taxa se aproxima de 1, representa baixos riscos sociais; acima disso, a projeção é de pandemia.
A média brasileira nos últimos dias foi, segundo ele, de 1,49. Tocantins é o pior estado, com taxa próxima de 4. Minas Gerais estaria melhor, com taxa de 1,07. Porém, como essa taxa sofre alterações muito rápidas, é preciso ter cautela. Para o pesquisador, o isolamento social só pode ser flexibilizado depois de um longo tempo com taxas abaixo de 1.
Testagem insuficiente - O professor Leonardo Ribeiro, do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG, relatou que o Brasil está no 20º lugar mundial na aplicação de testes por milhão de habitantes, aplicando 300 testes por milhão de pessoas.
O pesquisador estima que a subnotificação no País seja de 7,7, o que significa que, dos 70 mil casos confirmados pelo Ministério da Saúde, o número real pode chegar a 500 mil.
Também pesquisadora do Cedeplar, Mônica Viegas calculou que, se 1% da população brasileira for contaminada, o sistema daria sinais de exaustão. Com o contágio ocorrendo de forma rápida, em apenas um mês, todas as regiões chegariam ao colapso, com procura de leitos 200% superior a oferta. Já se o período for de 6 meses, o sistema conseguiria absorver o atendimento em todas as regiões.