Durante a reunião, participantes cantaram o hino de luta das comunidades
Comunidades temem que mineração afete patrimônio hídrico da região

População repudia mineração na Serra do Brigadeiro

Moradores da Zona da Mata falam sobre impactos socioeconômicos e ambientais que podem ser gerados com projetos da CBA.

23/10/2019 - 20:57 - Atualizado em 24/10/2019 - 11:46

Cerca de cem pessoas, entre membros de entidades e cidadãos de municípios do entorno do Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, na Zona da Mata, disseram não à atividade minerária na região. Eles participaram de audiência da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quarta-feira (23/10/19).

Solicitada pela deputada Beatriz Cerqueira (PT), a reunião teve como objetivo debater os impactos socioeconômicos e ambientais da mineração nessas localidades, incluindo a violação de direitos da população atingida por esses empreendimentos.

Jean Carlos Martins, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), foi enfático: “a mineração não tem o que oferecer a esta população; se for preciso, vamos para a frente das máquinas”.

De acordo com ele, há ilegalidades nos processos de licenciamento ambiental, como o desrespeito a uma Lei municipal de Rosário da Limeira a qual prevê que não pode haver mineração em área de preservação permanente (APA). Outro problema é que a mineração estaria particionando os relatórios de impacto ambiental, o que impede os órgãos de ter uma visão do impacto total dos empreendimentos.

O professor do Instituto Federal de Educação do Sudeste de Minas, Lucas Magno, destacou que a Serra do Brigadeiro tem uma das maiores jazidas brasileiras de bauxita. A substância, que se transforma em alumínio após o refino, é cobiçada principalmente pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA).

Lucas explica que a bauxita torna poroso o solo onde é encontrada, criando grandes reservatórios de água. “Por isso, nossa região é considerada uma verdadeira caixa d’água. Se retirarem a bauxita, esse processo geológico será freado”, alertou. Com isso, seria deteriorado um grande patrimônio hídrico, que inclui diversas nascentes que ajudam na formação de rios como o Doce e o Paraíba do Sul.

O professor acrescentou que, se todas as áreas pleiteadas pela CBA forem concedidas, a região ficará como um “queijo suíço, cheio de buracos”. E invadiria APAs de três municípios da Mata: em Pico do Itajuru (Muriaé), Serra das Aranhas (Rosário de Limeira) e Rio Preto (São Sebastião da Vargem Alegre).

Agroecologia - Vários convidados reforçaram a vocação da região para a atividade agropecuária. Adriana Ribeiro, da Cooperativa dos Produtores da Agricultura Familiar Solidária, enfatizou que a região é rica em fauna, flora, água e agricultura familiar, que sustentam a população. “Nossa região tem associações e cooperativas que só existem porque na ponta tem o agricultor. Essa produção não combina com a mineração”, rechaçou.

Isaías Freitas, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Miradouro, reforçou que a cidade é mantida com a agricultura familiar. Gilsilene Mendes, coordenadora da Comissão Pastoral da Terra (CPT), disse que a região constitui atualmente um polo agroecológico da Zona da Mata, com 70% da produção local extraída da agricultura familiar.

Religioso foi ameaçado por se opor à mineração

O frei Gilberto Teixeira, vigário da Paróquia Santo Antônio, em Belisário (Mata), agradeceu o apoio dos parlamentares à causa. Afirmou que isso representa um contraponto importante para pessoas que, como ele, sofrem ameaças. E lembrou que foi incluído num dos programas de proteção da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, após ser ameaçado de morte em 2017 por pessoas ligadas à mineração.

"A partir da ameaça, mais de 70 entidades de Minas e outros Estados se manifestaram a favor da causa", realçou. Segundo ele, o setor minerário tenta primeiro cooptar lideranças e, se não consegue, parte para ameaças. “Não queremos a CBA na região, pois a mineração tem uma safra só e a agricultura é permanente", resumiu.

Leonardo Pereira, advogado do Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab), enfatizou que é importante a resistência no início, pois “lutar para resgatar direitos é mais difícil que lutar por direitos apenas”. Ele solicitou à comissão que oficie o Ministério Público em Muriaé, para cobrar atuação quanto aos empreendimentos pretendidos na Serra do Brigadeiro.

Também quer que seja oficiada a Secretaria de Estado de Meio Ambiente, para que exija análises dos impactos ambientais cumulativos. 

Contraponto - Claudiomir Vieira, prefeito de São Sebastião da Vargem Alegre (Mata), apesar de se colocar contra os crimes das mineradoras, opinou que em seu município a mineração não foi ruim, já que foram gerados 550 empregos, com investimento de US$ 12 milhões. Os presentes reagiram e criticaram o gestor, gritando “Mineração aqui não!”. 

Os parlamentares presentes, todos do PT, fizeram coro à indignação das comunidades. Beatriz Cerqueira considerou que “a mineração explora a terra, acaba com a água, destrói o modo de viver da população e ainda tira a vida de muitas pessoas”. Para ela, é fundamental as comunidades se organizarem para não se tornarem reféns da pressão das empresas.

“Essa luta de vocês energiza nossa alma”, parabenizou André Quintão. Na opinião dele, a mineração é tão poderosa que consegue infundir a visão de que é fundamental para as comunidades, o que acaba indo contra atividades locais, como a agricultura familiar.

A presidenta da comissão, deputada Leninha, aproveitou para denunciar outro projeto minerário, no Norte do Estado, de construção de mineroduto para escoar a produção, em uma região que já enfrenta a falta de água.

O deputado Betão valorizou ações bem-sucedidas contra a mineração, como no distrito de Humaitá, em Juiz de Fora (Mata) e em Carrancas (Sul). “Graças à luta, felizmente, a população conseguiu reverter projetos de mineração nesses locais”, comemorou.

Consulte o resultado da reunião.