Deputados pedem suspensão de edital que licencia ambulantes
Licitação da prefeitura para vagas em Belo Horizonte gera insatisfação entre os que já estão nas ruas.
14/08/2019 - 14:40Os deputados Cristiano Silveira (PT) e Fernando Pacheco (PHS) encaminharam ofício ao prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, solicitando a suspensão do edital SMPU 080, de 2019, da Secretaria Municipal de Política Urbana, que trata do licenciamento do exercício de atividade comercial nas ruas da cidade, com veículo de tração humana.
A decisão de pedir a suspensão do edital foi tomada após quase quatro horas de discussões sobre o assunto, durante audiência pública da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quarta-feira (14/8/19).
Participaram da reunião representantes do Ministério Público, da Prefeitura, da Defensoria Pública e de entidades representativas dos ambulantes e mais de 100 trabalhadores que afirmam estar sendo diretamente prejudicados pelo processo licitatório, principalmente pipoqueiros que já trabalham nas ruas há muitos anos.
Autor do requerimento para a realização da reunião, o deputado Cristiano Silveira disse que a iniciativa da prefeitura de fornecer novas licenças para o trabalho nas ruas da Capital é louvável, mas questionou a quantidade de vagas disponíveis e o não envolvimento dos trabalhadores do setor na elaboração do edital.
"O comércio nas ruas é uma fonte de renda importante, num País onde há 13 milhões de desempregados, 28 milhões em subemprego e 5 milhões em desalento, que pararam de procurar emprego. O trabalho autônomo é uma possibilidade de subsistência para essas famílias”, defendeu o parlamentar.
Cristiano Silveira também criticou ainda o fato de a prefeitura não ter apresentado os dados que embasaram o número de vagas ofertadas, 350, considerado pequeno por ele e pelos trabalhadores.
“Só no Carnaval desse ano mais de 3 mil ambulantes foram cadastrados para trabalhar. Além disso, o Hipercentro foi excluído das vagas e não há nenhum plano para amparar os possíveis desempregados que não consigam se regularizar por meio do edital”, frisou.
Reunião - Diante das questões colocadas durante a audiência, o promotor de Justiça da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos da Comarca de BH, Mário Konichi Higuchi Júnior, agendou reunião para a próxima quarta-feira (21/8) com a secretária Municipal de Política Urbana, Maria Fernanda Caldas, para, segundo ele, tentar resolver o problema da falta de diálogo e esclarecer pontos que afligem os trabalhadores.
O pedido dos deputados, então, é que o edital seja suspenso pelo menos até a quinta-feira (22), para dar tempo de os trabalhadores se posicionarem diante da prefeitura, com a mediação do Ministério Público. A abertura dos envelopes com as propostas estava marcada para a próxima segunda-feira, dia 19.
Associações alegam que trabalhadores não foram ouvidos
Entre outros questionamentos, os ambulantes afirmam que é injusto que eles tenham que concorrer nas mesmas condições com pessoas que nunca exerceram a atividade. Alguns deles são filhos e netos de pipoqueiros, vêm de famílias que sempre trabalharam nas ruas.
O presidente da Associação dos Pipoqueiros Microempreendedores, Rogério Teixeira dos Santos, o diretor-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Informais, Ely de Fátima dos Santos, e a presidenta do Projeto Vida, Sandra Maria Fontes de Almeida, foram unânimes em criticar a Prefeitura da Capital por não dar aos ambulantes a oportunidade de discutir pontos do edital antes do seu lançamento.
Também membro do Projeto Vida, Jarbas Aredes Junior explicou que o edital falha, ainda, em definir as vagas de acordo com os 15 produtos cuja venda é autorizada por camelôs, uma vez que os produtos são muito diversos entre si. “Alguns vendem mais que outros, possuem produção e estoque específicos. Sentimos falta de um estudo técnico para avaliar a quantidade de vagas necessária para a cidade”, disse ele.
Representante do Movimento dos Trabalhadores em Logradouro Público (MTLP), João Bosco Rodrigues, mais conhecido como João da Locadora, criticou duramente a secretária Municipal de Política Urbana, Maria Fernandes Caldas, que desde o começo de 2018 não teria dado retorno a ofícios enviados pela entidade sobre a abertura de editais para ocupação das ruas da Capital por comerciantes.
Para João Bosco, a prefeitura não gosta de ambulantes e marginaliza ainda mais as pessoas, com pressões e fiscalizações crueis. "Às vezes, até recebem os movimentos, mas eles não têm o entendimento necessário para fazer uma discussão específica da lei. Somos uma assessoria que os acompanha, mas temos tido nossos pedidos por escrito, em ofício, ignorados", explicou.
Em sua opinião, os shoppings populares prejudicaram muito os comerciantes de rua. "Os camelôs foram jogados dentro dos shoppings e hoje passam fome. Pagam aluguel caro e ninguém vai lá, porque as pessoas consomem é na rua", afirmou.
O defensor público da Defensoria Pública de Minas Gerais, Vladimir de Souza Rodrigues, também enfatizou que a reorganização do Hipercentro de BH em shoppings populares tornou a situação dos trabalhadores inviável. “A defensoria teve dificuldade de conversar com a Maria Caldas, imagino então vocês. Não é democrático fazer política fechado no gabinete. Tem de ouvir a população". Na opinião do defensor, houve falta de diálogo, sim.
Prefeitura se defende dizendo que está cumprindo a lei
O diretor de Planejamento e Monitoramento da Secretaria Municipal de Política Urbana, Stefano Pagin, pediu desculpas pelo que chamou de “falha de comunicação” e disse que alguns representantes de entidades foram sim ouvidos na elaboração do edital.
“O problema é que licitação não podemos passar informações aos interessados antes da publicação. É exigência da lei, por ser concorrência. Ouvimos demandas e necessidades de vocês, juntamos com demandas de outros órgãos e membros da sociedade civil e chegamos a um caminho que acreditamos ser bom pra todos”, afirmou.
Segundo ele, essas novas vagas serão apenas para quem nunca teve licença antes. "Quem já tem, continua, inclusive no Hipercentro, não muda nada. Quem já teve e perdeu por algum motivo, pode pedir a renovação em até 90 dias”, pontuou.
Stefano Pagin esclareceu que o Código de Posturas do Município exige que toda atividade para ser licenciada passe por processso licitatório. Também por exigência legal, não seria possível conferir pontuação ou qualquer outra vantagem para os que já trabalham nas ruas, na concorrência.