Deputados defendem CPI para apurar contrato com Minas Arena
Eles suspeitam de desvios nas obras do Mineirão pela empresa, que exigiu que documento seja cumprido.
08/05/2019 - 20:07Parlamentares da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) defenderam a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar denúncias envolvendo o contrato entre a Minas Arena, empresa que gerencia o Mineirão, e o Governo do Estado. Eles suspeitam de irregularidades nas obras de reforma e modernização do Estádio Magalhães Pinto para a Copa do Mundo de 2014.
O contraponto veio do representante da Minas Arena Gestão de Instalações Esportivas, que garantiu a legalidade do contrato e das condições pactuadas. Ele foi alvo de protestos de torcedores do Cruzeiro, que pediram a revogação do documento, alegando serem mal atendidos no Mineirão. Também mostraram bandeira com a foto de um torcedor morto dentro do estádio e cobraram: “Onde estão os envolvidos na morte do nosso amigo?”
Esses personagens participaram de audiência da Comissão de Transportes, Comunicação e Obras Públicas, nesta quarta-feira (8/5/19). O evento foi requerido pelo presidente da comissão, deputado Léo Portela (PR), que também é o primeiro signatário do requerimento para instalação da CPI.
O deputado destacou que há suspeitas envolvendo o contrato entre a concessionária e o governo e denúncias de superfaturamento e desvio de recursos nas obras. Para ele, já está demonstrado de modo inequívoco que uma CPI sobre o tema precisa ser criada. “Já temos as assinaturas necessárias, só falta a autorização do presidente desta Casa”, afirmou.
Crise - Léo Portela também criticou o atual governo por ter repassado ao consórcio neste ano cerca de R$ 9 milhões, o que é inaceitável num contexto de crise financeira do Estado. “Causa estranheza um governo que prega austeridade pagar essas parcelas no momento de caos que vivemos. Não tem dinheiro para as escolas integrais, para a saúde, mas para o Minas Arena não falta”, condenou.
Vários parlamentares presentes apoiaram a criação da CPI, como Professor Irineu (PSL), Beatriz Cerqueira (PT) e Professor Cleiton (DC). Já o deputado Virgílio Guimarães (PT) defendeu apurações por parte dos órgãos estaduais.
E o deputado Cleitinho Azevedo (PPS) afirmou que o contrato pode ser rompido. “O que não pode é um Estado quebrado, sem dinheiro até para manter as crianças na escola, ficar pagando para essa empresa, que diz que está tomando prejuízo”.
Balanço - Ao apresentar balanços da Minas Arena, o ex-deputado Iran Barbosa (MDB) atestou que a concessionária está obtendo lucro: em 2013, foi de R$ 38 milhões; em 2014, de R$ 17 milhões. Ele estranhou alguns valores lançados no balanço do consórcio, formado pelas empresas Construcap, Egesa e HAP Engenharia, como as despesas administrativas, da ordem de R$ 11 milhões por mês. “O Cruzeiro, com estrutura infinitamente maior, gasta R$ 8 milhões”. Também questionou o gasto com manutenção, de mais de R$ 12 milhões por ano.
Ele denunciou ainda que sócios da Ernest Yong, empresa que auditou o contrato de parceria público-privada (PPP) entre governo e Minas Arena e audita os balanços da empresa, têm participação na concessionária, o que é vetado pelo contrato. Por todos esses motivos, o ex-deputado defendeu a instalação da CPI.
BNDES - O advogado Jarbas Filho de Lacerda, que acompanha o contrato desde sua assinatura em 2013, informou que o custo da reforma do Mineirão estabelecido no documento foi de R$ 695 milhões, com R$ 400 milhões financiados pelo BNDES para a Minas Arena.
A empresa arcou com os R$ 295 milhões restantes, captando R$ 276 mi desse total também no BNDES, tendo o Governo de Minas como avalista. Para os outros 19 milhões, a concessionária utilizou recursos próprios.
De acordo com Jarbas Lacerda, pelo contrato, que vigora até 2037, os R$ 400 milhões deverão ser ressarcidos à empresa pelo governo, em parcelas mensais ao longo de 12 anos. Cada uma das parcelas fica em torno de R$ 7 milhões. Ainda segundo o advogado, foram pagos pelo governo, da assinatura até o presente momento, cerca de R$ 700 milhões.
Na opinião dele, o contrato pode ser rescindido, apesar de essa possibilidade ser difícil de concretizar. “A Minas Arena fez um ótimo negócio, mas que foi péssimo para o Estado, os clubes e os usuários”, concluiu.
Para empresa, contrato é legal e é cumprido à risca
O representante da Minas Arena, Samuel Henrique Cornélio Lloyd, contestou as falas afirmando que o contrato deve ser explicado do início ao fim, em seus dois anos de obras e 25 anos de exploração. De acordo com ele, na licitação, o valor inicialmente previsto para as obras era de R$ 771 milhões. A Minas Arena propôs realizá-las com uma economia de R$ 94 milhões.
Ele destacou que o estádio foi entregue no prazo e passou a receber várias competições internacionais, como a Copa do Mundo de 2014. Isso continua até hoje, tanto que, dos 12 estádios brasileiros feitos para esse torneio, o Mineirão é o único que vai receber cinco jogos da próxima Copa América.
Samuel acredita que esse sucesso se deve à boa gestão do estádio, considerado o mais sustentável do mundo. “Em todos os jogos, utiliza-se apenas energia solar e a água da chuva também é reaproveitada, propiciando economia de 70% na conta”.
Ele destaca que a economia repercute nos custos mais baixos da arena comparada a outras: “No Maracanã, paga-se R$ 120 mil pela conta de água enquanto aqui ela fica em R$ 20 mil”, atestou. Outro dado nesse sentido é de que o custo de uma partida no estádio carioca seria de R$ 1 milhão para apenas R$ 140 mil no Mineirão.
O diretor explicou ainda que as prestações pagas pelo governo vão decrescendo com o tempo e, a partir de 2023, vão cair ainda mais. Para ele, “é um grande mito dizer que o Estado paga o lucro da Minas Arena, quando está apenas ressarcindo o investimento na modernização do Mineirão”.
Lembrou ainda que apenas os jogos das Copas do Mundo e das Confederações geraram R$ 80 milhões em tributos. “Estamos aqui pleiteando o cumprimento do contrato. A licitação em nenhum momento foi questionada. A Minas Arenas cumpre todos os seus compromissos contratuais”, cobrou.
Sobre a queixa dos clubes que jogam no Mineirão, ele respondeu que a empresa não cobra aluguel deles, que só arcam com custos de terceiros, como de segurança, limpeza e brigadistas.
Especificamente sobre o Cruzeiro, Samuel informou que há um contrato de fidelidade com o clube, pelo qual a empresa arca com 30% desse custo e o time com 70%. Ainda assim, o Cruzeiro teria paralisado os pagamentos, segundo o dirigente, e hoje acumula uma dívida de R$ 26 milhões.
Desconforto - O secretário de Estado de Transportes e Obras Públicas, Marco Aurélio de Barcelos Silva, disse que os valores dispendidos atualmente pelo governo com o contrato lhe trazem desconforto. Ele considerou não ser viável rasgar o contrato, mas avaliou que é possível rediscuti-lo, de forma que se torne “juridicamente sustentável, negocialmente interessante para as partes e benéfico para os torcedores”.