Parlamentares visitaram Santuário de Nossa Senhora da Piedade, para averiguar impacto da mineração em área vizinha
Miguel Andrade disse que empresa está autorizada a destruir mais 30 hectares de Mata Atlântica
Santuário recebe 500 mil pessoas por ano e é patrimônio religioso da região

Deputados participam de missa contra mineração na Piedade

Transtorno de caminhões para quem frequenta local e acordo que permite ampliar área de exploração foram criticados.

16/04/2019 - 20:55

Sacerdotes, deputados estaduais, prefeitos, vereadores, ambientalistas e militantes do movimento contrário à mineração na Serra da Piedade, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), se uniram em uma missa no Santuário da Padroeira de Minas Gerais, nesta terça-feira (16/4/19), em defesa do patrimônio ambiental, religioso e histórico da região.

O evento fez parte de uma visita de parlamentares que integram as Comissões de Cultura e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) ao Santuário de Nossa Senhora da Piedade, com o objetivo de averiguar o impacto das atividades de mineração em área vizinha ao patrimônio religioso.

As queixas apresentadas pelas autoridades religiosas e por ambientalistas envolvem, por um lado, o perigo e o transtorno que representam os caminhões de minério para os frequentadores do Santuário. Tanto o número de caminhões quanto de visitantes aumentou muito nos últimos anos, pois a retomada das atividades mineradoras coincidiu com reformas das instalações religiosas que ampliaram muito o turismo no local.

Por outro lado, sacerdotes e ambientalistas também criticam o acordo judicial firmado entre o poder público e a mineradora AVG Empreendimentos Minerários, em 2012, que permitirá à empresa ampliar a área de exploração antes de recuperar uma área degradada da serra.

Essa área degradada inclui duas cavas minerárias abandonadas pela empresa Brumafer, que cessou suas atividades em 2005. Dois anos mais tarde, ela foi adquirida pela AVG, que assumiu a obrigação de recuperar essas áreas.

Para cumprir essa tarefa, foi fechado o acordo com diversos órgãos estaduais, homologado pela Justiça, que prevê a exploração do minério disponível em função do trabalho de descomissionamento (desativação) da estrutura existente, mas também ampliando a atividade minerária para áreas adjacentes.

Durante a visita realizada ao Santuário, os argumentos contrários à mineração foram apresentados pelo coordenador da Agência de Desenvolvimento Regional Integrado da Arquidiocese de Belo Horizonte, professor Miguel Ângelo Andrade, especialista em gestão de áreas protegidas.

De acordo com Miguel, para recuperar a área destruída, a empresa está sendo autorizada a destruir mais 30 hectares de Mata Atlântica. “Você gera mais danos para recuperar uma área. É um contrassenso”, criticou.

Segundo o professor, já circulam na serra hoje 400 caminhões, diariamente. “Não há qualquer controle. E o Santuário está recebendo 500 mil pessoas por ano. A pergunta é: isso é compatível? Achamos que não”, argumento Andrade.

Reforma ampliou visitação ao Santuário da Piedade

A Ermida (Igreja) Basílica de Nossa Senhora da Piedade foi fundada em 1767, mas passou por momentos de maior e menor visitação. Em 2010, segundo a administração do Santuário, foram recebidos apenas 30 mil visitantes.

Após reformas e melhorias na estrutura turística, esse número cresceu para 500 mil em 2018. Esse é um dos argumentos para se rever a autorização para mineração: as avaliações oficiais levaram em conta dados ultrapassados, que já não refletem o fluxo turístico atual, muito maior. Outra queixa dos religiosos é que o barulho dos caminhões inviabiliza o descanso dos hóspedes do Retiro da Piedade, onde os visitantes podem passar alguns dias de reflexão espiritual.

O bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, Dom Vicente Ferreira, foi o celebrante da missa na Ermida, com o apoio do reitor do Santuário, padre Fernando César do Nascimento, do pró-reitor, padre Carlos Antônio da Silva, e do diácono Luís Gustavo de Oliveira, administrador do Retiro.

Os sacerdotes abençoaram os parlamentares que se opõem à mineração e, durante a missa, fizeram uma convocação. “Se os homens se calarem, até as pedras falarão”, afirmou o padre Carlos, citando uma expressão de Jesus, do Evangelho de Lucas.

Autor do requerimento para realização da visita, o deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) salientou a importância de se proteger um patrimônio que já foi reconhecido pelo Papa João XXIII. “Essa riqueza não é de Minas, é do mundo”, afirmou.

Presidente da Comissão de Cultura, o deputado Bosco (Avante) afirmou que a Assembleia não se omitirá, mas ressalvou que é necessário “calçar as sandálias da humildade”, tendo em vista que há um acordo homologado pela Justiça e que os poderes da Assembleia tem seus limites. O deputado Ulysses Gomes (PT), também autor do requerimento de visita, afirmou que os parlamentares visitarão a empresa mineradora, a fim de buscar oportunidades de diálogo.

O deputado Professor Wendel Mesquita (SD) defendeu um “abraço” ao Santuário e rejeitou a ideia de ampliar a exploração mineral na Serra da Piedade: “Não podemos degradar ainda mais esse ambiente que já foi tão prejudicado por tantos anos”, afirmou.

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) lembrou que a Serra não possui apenas um patrimônio religioso e histórico incomparável, mas também abriga espécies únicas de fauna e flora. “Há orquídeas que só florescem aqui”, salientou. Também participaram da visita os deputados João Vítor Xavier (PSDB) e Gustavo Santana (PR).