Ouvida pela CPI, Maria Teresa deu o único voto contrário ao licenciamento da Mina Córrego do Feijão, da Mineradora Vale, que se rompeu em Brumadinho
Maria Teresa disse que atropelo é uma constante nos processos de licenciamento

Conselheira denuncia máquina de licenciar no Estado

Membro do Copam aponta, em CPI da ALMG, irregularidades no processo de autorização de barragem da Vale que se rompeu.

11/04/2019 - 13:57 - Atualizado em 11/04/2019 - 16:30

“Máquina de licenciar”. Foi assim que Maria Teresa Viana Corujo classificou os processos, considerados por ela como “atropelados” e repletos de irregularidades, de licenciamento de atividades minerárias em Minas Gerais.

Ela deu o único voto contrário ao licenciamento da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), da Mineradora Vale, no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) pouco mais de um mês antes do rompimento que matou mais de 300 pessoas em janeiro deste ano. O depoimento foi realizado em reunião na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho na manhã desta quinta-feira (11/4/19).

Logo após o rompimento da barragem de rejeitos da Vale, no dia 25 de janeiro deste ano, Maria Teresa Corujo foi a público para criticar o processo que garantiu ao empreendimento um rebaixamento de risco, inicialmente classificado como 6, para 4, entre novembro e dezembro do ano anterior.

O rebaixamento garantiu que fosse possível conceder as três licenças necessárias (Prévia, de Instalação e de Operações) simultaneamenteemitidas em 11 de dezembro do ano passado.

Documentos - Segundo Maria Teresa, membros da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad), porém, a atacaram dizendo que ela mentia ao dizer que a barragem foi licenciada para operar quando, na verdade, a autorização seria apenas para descomissionamento da estrutura. Na reunião da CPI, Maria Tereza levou documentação para apresentar aos deputados como provas do seu testemunho.

Em um dos documentos, produzido pela Superintendência de Projetos Prioritários (Supri), vinculada à Semad, o processo é apresentado como pedido de licenciamento para continuidade das atividades das Minas do Feijão e Jangada, que são próximas, com aumento de 80% da sua produção. O pedido era licença para operação por dez anos de acordo com a documentação apresentada por ela.

Maria Teresa também apontou que, nos registros, a Supri aconselha a emissão da licença se isentando de avaliar a auditoria, feita pela própria Vale, para garantir a estabilidade das barragens. Essa responsabilidade, de acordo com o documento, seria da Defesa Civil e da prefeitura local, mas Maria Teresa questiona o posicionamento, já que licenciamento de atividades minerárias é responsabilidade do Estado.

Convidada aponta irregularidades sistêmicas dos licenciamentos

Maria Teresa, que ocupa uma cadeira no Copam como representante da sociedade civil na Câmara Técnica Especializada em Mineração (CMI), apontou ainda o que ela considera irregularidades no processo. Ela mostrou, por exemplo, que em audiência pública realizada em 2017, a Vale teria apresentado um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que não considerava algumas regiões, como a conhecida como Parque da Cachoeira, como área de influência direta.

A partir dos questionamentos, algumas dessas áreas foram incluídas na área de influência direta, mas apesar disso o EIA não foi refeito para considerar o impacto na região, bem como as comunidades dessas áreas não foram consultadas, conforme determina a legislação.

O Parque das Cachoeiras foi atingido pela avalanche de lama em janeiro deste ano e teve moradores mortos. Situações como essas levaram a questionamentos oficiais, com pedidos de adiamento de discussões e de esclarecimento feitos por Maria Teresa, mas ela diz não ter sido atendida.

Questões procedimentais - Segundo ela, o processo foi rápido e não levou em conta sequer os prazos legais entre as reuniões. A ambientalista diz ter enviado ofício ao secretário de Meio Ambiente, Germano Vieira, questionando a legalidade do processo e, em sua resposta, ele teria dito que não se ocuparia de questões “meramente procedimentais” de uma câmara técnica. Germano é o único secretário de Estado do último governo que foi mantido pela atual gestão estadual.

Maria Teresa enfatizou várias vezes que o atropelo não aconteceu apenas nesse caso, mas que é uma constante nos processos de licenciamento. O Copam, ela explicou, é formado por 12 membros com direito a voto, seis da administração pública (estadual e federal) e seis da sociedade civil. Entre os membros da sociedade civil, porém, dois são representantes do setor minerário.

“Então são as empresas mineradoras decidindo sobre as licenças para os seus empreendimentos”, disse. Segundo ela, em todas as 40 reuniões das quais ela participou, as licenças foram concedidas.

Parlamentares discordam sobre convocação de secretário

Os parlamentares da CPI fizeram perguntas a Maria Teresa para entender melhor a cronologia do processo de licenciamento e as pessoas envolvidas. Os deputados Gustavo Valadares (PSDB) e Sargento Rodrigues (PTB) discordaram sobre o convite ou a convocação de Germano Vieira, secretário de Meio Ambiente, e Rodrigo Ribas, superintendente da Supri durante o processo de licenciamento da Barragem do Córrego do Feijão, para prestar esclarecimentos à CPI.

Para Gustavo Valadares, basta o convite para que eles façam o contraponto às falas de Maria Teresa. Já para Sargento Rodrigues, há indícios de que eles tiveram responsabilidade na emissão irregular de licenciamento, e, por isso, precisam ser convocados, de forma que não possam faltar à reunião. Gustavo Valadares, presidente da comissão, insistiu que acordo anterior entre os parlamentares já havia determinado que eles seriam convidados, não convocados.

Gustavo Valadares também teve alguns embates com Maria Teresa, ao considerar que ela estava fugindo do assunto ao exemplificar sua fala com processos de licenciamentos de outros empreendimentos que não a barragem do Córrego do Feijão. Ela então alegou ser importante mostrar que é um problema sistêmico. O deputado Sargento Rodrigues concordou com ela sobre a importância de outros exemplos.

Diante da colocação de Maria Teresa de que todos os votos dos membros do poder público do Copam sempre foram favoráveis ao licenciamento, o presidente da CPI a questionou se ela também sempre teve o mesmo voto negativo. Ela respondeu que sempre pedia diligências (novas informações) ou aumento de prazos diante do que ela considerava falta de cumprimento de requisitos legais e, como isso era negado, votava contrariamente.

Repetição de problemas - O deputado Sargento Rodrigues destacou que há embasamentos legais para os posicionamentos de Maria Teresa, o que foi reforçado pelo deputado Bartô (Novo), que disse que a repetição de posicionamentos negativos de Maria Teresa era motivado pela repetição de problemas no processo de licenciamento.

Por fim, a convidada disse que os documentos entregues provam seus posicionamentos e fez um apelo para que os parlamentares os analisassem cuidadosamente.

Também estiveram presentes na reunião a deputada Beatriz Cerqueira (PT) e os deputados André Quintão (PT), Celinho do Sintrocel (PCdoB) e Glaycon Franco (PV). Eles parabenizaram Maria Teresa pela atuação vigilante no Copam.

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