Parlamentares e representantes de comunidades terapêuticas mostraram preocupação com o futuro devido à proposta de reforma administrativa
Presentes no Brasil há 50 anos, há em Minas 380 comunidades terapêuticas regulares
Comunidades terapêuticas criticam mudanças na política sobre drogas no Estado

Críticas à reforma marcam dia das comunidades terapêuticas

Em audiência pelos 50 anos dessas entidades, convidados apontam riscos de retrocesso na política estadual sobre drogas.

03/04/2019 - 16:03 - Atualizado em 03/04/2019 - 16:49

Em clima de comemoração, mas também de temor com relação ao futuro das políticas públicas sobre drogas em Minas, os 50 anos da instalação da primeira comunidade terapêutica no Brasil foram celebrados em audiência pública realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quarta-feira (3/4/19).

Comunidades terapêuticas são instituições privadas que prestam serviços de acolhimento temporário a dependentes químicos, de forma voluntária, não trabalhando com internação compulsória.

Reunidos na Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas, parlamentares, representantes de comunidades e de entidades presentes se uniram no consenso de que a proposta de reforma administrativa enviada à ALMG pelo governador Romeu Zema ameaçaria a atuação das comunidades terapêuticas e a própria continuidade da política sobre drogas.

Eles criticaram a fusão das subsecretarias de Políticas Sobre Drogas e de Prevenção à Criminalidade, que dariam origem a uma só subsecretaria vinculada à Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, ficando a política sobre drogas a cargo de uma superintendência da nova subsecretaria.

Nesse contexto, a presidenta da comissão, deputada Delegada Sheila (PSL), que pediu a reunião, destacou ser preciso tanto comemorar a data, como debater assuntos vitais para o trabalho das comunidades terapêuticas, a exemplo da reforma administrativa.

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) também ressaltou que o dia era especial. “Mas precisamos aproveitar o momento para deixar uma mensagem a toda a sociedade e sobretudo ao Governo do Estado de que acreditamos numa política pública sobre drogas”, frisou a parlamentar.

Já o deputado Gustavo Mitre (PSC) defendeu a atuação das comunidades terapêuticas, questionando o que seria do governo sem as frentes do terceiro setor.

“Elas suprem demandas importantes e, no caso das comunidades, é preciso que se dê a elas mais condições de atuarem em todos os municípios mineiros”, frisou.

Requerimentos - Os três deputados tiveram aprovado um requerimento de visita ao governador para discutir a condução das políticas sobre drogas no Estado e, ainda, requerimento de audiência pública para discutir a criação de um dia estadual em defesa das comunidades terapêuticas.

“A reforma não passará da forma como nos foi apresentada”, disse, por sua vez, o deputado Professor Cleiton (DC). Sua maior preocupação, segundo registrou, é com a precarização de políticas públicas essenciais, a exemplo daquelas sobre drogas.

Frente parlamentar pede reflexão

Presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Comunidades Terapêuticas do Congresso Nacional, o deputado federal Eros Biondini (Pros-MG) também pediu mudanças nas propostas da reforma administrativa para o setor.

“É preciso que o governo de Minas reflita humildemente sobre o equívoco monstruoso de se desfazer da política sobre drogas no Estado”, afirmou ele, também destacando a importância das comunidades terapêuticas.

“Nada se compara ao que vocês fazem no dia a dia, recebendo adultos, idosos, adolescentes e até crianças dependentes de drogas. Cada caso é uma vida, é uma família envolvida”, destacou, ao saudar representantes de 32 comunidades mineiras que lotaram o Auditório da ALMG para a audiência e que, juntas, ofertam 1.600 vagas para dependentes químicos.

Uma amostra de um contingente maior, já que, segundo o presidente da Associação de Comunidades Terapêuticas de Minas Gerais, Diego Aguiar, há em Minas 380 comunidades terapêuticas regulares.

“As comunidades têm salvado vidas há 50 anos”, destacou Diego, revelando que ele próprio conheceu o trabalho de uma delas há 10 anos, quando, dependente de crack e em situação de rua, foi acolhido e tratado.

Vinculação de política sobre drogas à Secretaria de Governo é defendida

Procurador de Justiça aposentado, Rômulo de Carvalho Ferraz avaliou que, nos últimos 20 anos, as comunidades terapêuticas vêm enfrentando dificuldades na relação com o poder público em função da luta antimanicomial surgida no País para combater a internação para tratamentos.

“Em Minas, houve, no governo anterior, um agravamento dessa relação com as comunidades terapêuticas, que tiverem dificultada sua sobrevivência”, admitiu ele, que foi subsecretário de Relações Institucionais na gestão anterior, de Fernando Pimentel, e ainda secretário de Defesa Social do Governo Anastasia.

Rômulo defendeu que a política sobre drogas na gestão atual seja preservada no mínimo em torno de uma subsecretaria. “A situação financeira do Estado é grave, mas a política de drogas ficar numa superintendência e com pouco orçamento é preocupante”, alertou ele.

Na mesma linha, o deputado federal Eros Biondini apresentou levantamentos indicando que o Governo do Estado poderia gastar em quatro anos somente 3% do que dispende no mesmo período para manter presos no sistema prisional, caso investisse numa política sobre drogas eficiente.

Isto porque, segundo ele, 70% dos crimes e prisões estariam relacionados direta ou indiretamente ao consumo ou à comercialização de drogas. “Por isso investir em tratamento e prevenção é mais barato", frisou o parlamentar.

Nesse sentido, Eros Biondini e também o presidente do Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas, Aloísio Andrade, defenderam que a política sobre drogas saia da esfera da segurança pública e fique a cargo de uma subsecretaria vinculada à Secretaria de Estado de Governo.

Qualificação - Já Fabiane Oliveira, superintendente de Acolhimento aos Usuários de Drogas da Secretaria de Estado de Segurança Pública, destacou que Minas criou, em 2005, a primeira rede de suporte social ao dependente, que, segundo ela, serviu de modelo no País, contando, também, com as comunidades terapêuticas.

“É na articulação de esforços que se potencializa a política pública”, disse, defendendo, por outro lado, critérios de qualidade mais rígidos para a qualificação e o credenciamento dessas comunidades.

Consulte o resultado da reunião.