PL passa a incluir todo o conteúdo do projeto Mar de Lama Nunca Mais, assinado por mais de 60 mil pessoas, logo após a rompimento de barragem em Mariana
Público acompanhou a votação do parecer, fruto de construção coletiva com entidades e movimentos sociais

Projeto das Barragens está pronto para Plenário em 2º turno

Barragens em operação com o método de alteamento a montante deverão migrar para tecnologia alternativa em até três anos.

22/02/2019 - 15:46 - Atualizado em 22/02/2019 - 17:27

A Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou, no início da tarde desta sexta-feira (22/2/19), parecer de 2º turno favorável ao Projeto de Lei (PL) 3.676/16, que trata do licenciamento ambiental e da fiscalização de barragens no Estado.

O relator, deputado João Magalhães (MDB), opinou pela aprovação na forma do substitutivo nº 1, rejeitando o vencido (texto aprovado com alterações no 1º turno). Agora, o projeto já pode ser votado em 2º turno pelo Plenário da Assembleia. Ele está na pauta da Reunião Extraordinária do Plenário ainda nesta sexta (22), às 18 horas.

Leia a íntegra do texto aprovado pela comissão.

A proposição, de autoria da Comissão Extraordinária das Barragens, foi aperfeiçoada com a participação popular e de várias entidades, e passa a incluir, na forma do substitutivo da Comissão de Administração Pública, todo o conteúdo do projeto Mar de Lama Nunca Mais (PL 3.695/16), assinado por mais de 60 mil pessoas, logo após a rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (Região Central do Estado), ocorrido no final de 2015.

O projeto institui a Política Estadual de Segurança de Barragens, que deverá ser implementada em Minas Gerais, articulada com a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), também de acordo com as políticas nacional e estadual de Meio Ambiente.

Construção coletiva - O parecer foi assinado por todos os deputados membros da comissão, a pedido do relator João Magalhães. Os deputados Cássio Soares (PSD), João Vítor Xavier (PSDB), Raul Belém (PSC), Sargento Rodrigues (PTB), Osvaldo Lopes (PSD) e a deputada Beatriz Cerqueira (PT) declararam satisfação com relação ao texto aprovado, fruto de um trabalho coletivo. No decorrer da reunião, diversos parlamentares falaram a respeito do projeto.

Deputados destacam importância da proposição

Os deputados presentes na reunião desta sexta (22) enfatizaram a relevância do PL 3.676/16 e a construção da proposta em conjunto com Ministério Público e movimentos sociais.

João Vítor Xavier destacou que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) reconhece o texto como o mais avançado e abrangente sobre a questão de segurança de barragens no País.

Sargento Rodrigues não só parabenizou a todos os que participaram das discussões do projeto, mas também destacou a necessidade de se instalar, na Assembleia, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a mineração. Concordaram com ele em relação à CPI a deputada Beatriz Cerqueira, os deputados Raul Belém e Noraldino Júnior, ambos do PSC, e o deputado federal Rogério Correia (PT-MG).

Beatriz Cerqueira também ressaltou que, embora a votação desse projeto tenha grande significado, se questiona se as tragédias de Mariana e de Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte) poderiam ter sido evitadas se isso tivesse ocorrido antes. Ela alertou ainda para a necessidade de uma legislação que trate especificamente dos atingidos por barragens, o que não é objeto dessa proposição.

Para Osvaldo Lopes, a sociedade civil sai vitoriosa com esse processo. Ele também comemorou o fato de a causa animal estar contemplada pela primeira vez em um projeto nesse sentido. Glaycon Franco (PV) comentou que se trata de um novo marco da mineração. Já Raul Belém destacou que esse é um momento importante para o Estado.

Noraldino Júnior alertou para o fato de o PL 368/19, que integra a reforma administrativa do Estado e propõe a redução de secretarias de Estado e a extinção de cargos, fragilizar o papel da fiscalização do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), em um momento em que deveria ser aprimorado.

De acordo com Rogério Correia, o avanço da tramitação desse projeto é a resposta que a sociedade espera. Ele falou que levará a proposição para Brasília para que seja uma referência ao trabalho na Câmara dos Deputados. O parlamentar destacou a atuação da Comissão Extraordinária da Barragens, criada na Assembleia após o rompimento de barragem em Mariana.

Anseio da população - A coordenadora da Promotoria Estadual de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, promotora Giselle Ribeiro, enfatizou que a Assembleia faz valer a vontade da população ao acatar no novo substitutivo sugestões do projeto Mar de Lama Nunca Mais.

Representantes de movimentos sociais pedem diálogo aberto com a ALMG

O representante do gabinete de crise da sociedade civil e do Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela, Rogério Saraiva, demandou que a Assembleia tenha sempre um canal aberto com a população. Ele disse que a abertura dada aos movimentos sociais neste momento não ocorreu no início da tramitação do PL 3.676.

A integrante do Projeto Manuelzão e do Instituto Guaicuy, Jeanine Oliveira, também solicitou continuidade desse diálogo e disse que, mesmo que ele tenha ocorrido na construção do substitutivo, ela não considera que o tempo disponibilizado tenha sido o ideal.

De acordo com o presidente do Projeto Manuelzão, Marcus Vinícius Polignano, se após o rompimento da barragem em Mariana tivesse ocorrido o enfrentamento à situação, neste momento não seria necessário lidar com a tragédia de Brumadinho.

“Não comemoro o avanço desse projeto agora porque a ALMG perdeu a oportunidade de fazer isso lá atrás e isso não se recupera. Saímos de um patamar de 19 mortes para 310. Minas deu o pior exemplo”, afirmou.

Barragens a montante são proibidas e planos de segurança devem ser detalhados

Entre as principais mudanças propostas pelo substitutivo ao PL 3.676/16, em relação à legislação já existente, está a definição de situações em que a construção de barragens fica proibida. Não serão mais concedidas licenças ambientais para operação ou ampliação de barragens destinadas à acumulação ou à disposição final ou temporária de rejeitos ou resíduos industriais ou de mineração que utilizem o método de alteamento a montante.

Esse método foi utilizado na Barragem de Fundão, em Mariana, e na barragem que também se rompeu em Brumadinho (RMBH), no último dia 25 de janeiro, com dezenas de mortos e desaparecidos. A primeira pertence à mineradora Samarco, controlada pela Vale e a australiana BHP, e a segunda era administrada diretamente pela Vale.

No caso das barragens já existentes que utilizem esse método, o empreendedor deverá descaracterizar (esvaziar) a estrutura, no caso das inativas; e promover, em até três anos, a migração para tecnologia alternativa de acumulação ou disposição de rejeitos e resíduos e a descaracterização da barragem, no caso das que estejam em operação.

Autossalvamento - Outro dispositivo considerado muito importante pelos representantes de movimentos sociais é que não serão mais permitidas barragens onde, após estudos de cenários de possíveis rupturas, haja comunidade na chamada zona de autossalvamento. Trata-se da porção do vale a jusante da barragem, onde não haveria tempo suficiente para intervenção em situação de emergência.

Para a delimitação da extensão da zona de autossalvamento, o texto estabelece que será considerada a maior entre as duas seguintes distâncias a partir da barragem: 10 quilômetros ao longo do curso do vale ou a porção do vale passível de ser atingida pela onda de inundação num prazo de trinta minutos.

Licenciamento - Outra proibição é com relação à emissão de licenças concomitantes. Nenhum empreendimento receberá várias licenças ao mesmo tempo, provisórias e/ou ad referendum, para as várias fases do licenciamento ambiental.

Para a construção, o funcionamento ou a ampliação das barragens, cada empreendimento deverá passar por três etapas de liberação: Licença Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO), além da apresentação preliminar do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (Rima).

Segurança- O Plano de Segurança da Barragem, que será exigido no pedido de Licença de Instalação, será submetido à análise do órgão ou da entidade estadual competente.

A divulgação e a orientação sobre os procedimentos nele previstos deverão ser feitas por meio de reuniões públicas em locais acessíveis às populações situadas na área a jusante da barragem, que devem ser informadas com antecedência e estimuladas a participar das ações preventivas previstas no referido plano.

Ainda segundo o texto, o Plano de Ação de Emergência (PAE) deverá ser elaborado e implantado com a participação dos órgãos ou entidades estadual e municipais de proteção e defesa civil, ficando disponível no empreendimento e nas prefeituras municipais.

Penalidades ficam mais severas e multas serão divididas com os municípios

O novo texto estabelece que o descumprimento da lei sujeita os infratores às penalidades previstas na legislação ambiental, sem prejuízo de outras sanções administrativas, civis e penais. Em casos de desastre ambiental decorrente do descumprimento de algum dispositivo da lei, o valor da multa administrativa poderá ser majorado em até mil vezes.

Outra novidade prevista no projeto, e que atende inclusive a uma demanda dos prefeitos de Brumadinho e de Mariana, é que o valor das multas aplicadas pelo Estado em caso de infração às normas de proteção ao meio ambiente e aos recursos hídricos decorrente de rompimento de barragem, será dividido. Pelo texto, 50% vão para o Estado e 50% serão destinados aos municípios atingidos pelo rompimento.

O empreendedor fica responsável, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados pela instalação e operação da barragem, bem como pelo seu mau funcionamento ou rompimento.

Avulso – Antes de ser votado nesta sexta-feira (22), ainda na noite de quinta (21), o deputado João Magalhães distribuiu cópias (avulsos) do parecer de 2º turno sobre a matéria, para que todos os parlamentares pudessem estudar o texto. 

Alguns deputados, que já tinham preparado emendas ao substitutivo, retiraram os pedidos, por considerarem que as mudanças solicitadas já haviam sido contempladas no parecer.

Requerimento – Ainda na reunião, foi aprovado requerimento para que seja encaminhado pedido de providências ao governador do Estado para que seja efetuado o repasse dos valores em atraso ao município de Brumadinho. O requerimento é assinado pelos deputados Gustavo Valadares (PSDB), Cássio Soares, Sávio Souza Cruz (MDB), André Quintão (PT), Ulysses Gomes (PT), Inácio Franco (PV) e Luiz Humberto Carneiro (PSDB).

Consulte o resultado da reunião.