Comissão debateu a judicialização de necessidades das pessoas com deficiência, em especial daquelas que sofrem do transtorno do espectro autista
A criação de uma vara judicial especializada foi defendida pelos participantes da reunião
Reunião faz parte da Semana de Conscientização sobre o Autismo

Autoridades discutem como apoiar pessoas com deficiência

Para conseguir atendimento adequado, especialmente para crianças com autismo, famílias recorrem à Justiça.

03/04/2018 - 19:47

Um processo de adoção que demorou três anos foi um dos exemplos mais graves de morosidade da Justiça que foi apresentado em audiência pública realizada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta terça-feira (3/4/18). A reunião, organizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, discutiu a judicialização de necessidades das pessoas com deficiência, em especial daquelas que sofrem do transtorno do espectro autista (TEA).

O advogado Alexandre Corradi, de Sabará (Região Metropolitana de Belo Horizonte), é hoje pai de uma menina de sete anos de idade com paralisia cerebral. Ele relatou à comissão, no entanto, que nem mesmo sua formação profissional evitou a lentidão do processo de adoção.

Segundo Corradi, sua filha teve que aguardar dois anos e meio em um abrigo, antes de ir para sua casa, apenas em decorrência da burocracia. É um tempo muito longo para uma criança, que pode fazer uma diferença ainda maior no tratamento da paralisia cerebral ou outra condição especial, conforme ele lembrou.

Várias foram as pessoas que participaram da reunião para apresentar seus problemas. Entre os casos relatados, estão dificuldades para obter medicamentos do Estado, vagas em escolas especiais, tratamento de saúde ou mesmo transporte para esse tratamento.

Presidente da comissão, o deputado Duarte Bechir (PSD) disse saber do caso de um pai que teve recusada a matrícula de seu filho em 17 escolas. Nesse caso, a decisão do pai foi de não procurar a Justiça, por medo de que o filho fosse maltratado em uma instituição obrigada a acolhê-lo.

O perigo de maus-tratos é real. Um exemplo foi relatado pelo representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG) de Santa Luzia (Região Metropolitana de Belo Horizonte), Fabrício Diego Costa. “Eu judicializei o caso de um aluno autista que foi agredido, torturado e acorrentado dentro do banheiro por um coordenador da escola que frequentava”, afirmou.

Autoridades propõem ampliar atendimento especializado

Uma das ideias defendidas durante a reunião, para agilizar a assistência às pessoas com deficiência, foi a criação de uma vara judicial especializada. Para a representante da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB-MG, a advogada Mariana Batista Resende, seria uma forma de permitir uma especialização dos magistrados responsáveis.

O deputado Arnaldo Silva (PR) chamou atenção para o peso da judicialização para os municípios, que acabam assumindo responsabilidades que seriam do Estado ou da União. “Se estamos judicializando, é porque alguém não está cumprindo sua obrigação”, declarou.

O coordenador da Defensoria Especializada do Idoso e da Pessoa com Deficiência, Estêvão Carvalho, disse que o Estado é hoje o maior violador de direitos das pessoas com deficiência. “São casos de falta de acesso à educação, adaptações curriculares, acesso ao mercado de trabalho”, relatou. Para ele, o ideal é resolver a maior parte dessas demandas administrativamente, sem necessidade de judicialização.

O desembargador Saulo Versiani Penna, 3º vice-presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), disse ver a judicialização de forma positiva, por acreditar que ela reflete a busca, pela população, de fazer valer seus direitos.

Quanto à ideia de criação de uma vara especializada em direitos das pessoas com deficiência, ele lembrou que essas demandas podem ser resolvidas pelos 120 Centros Judiciais de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs) espalhados pelo Estado. São órgãos de conciliação, que em sua avaliação poderiam resolver essas disputas de forma mais ágil, evitando a judicialização.

O juiz auxiliar da 3ª vice-presidência do TJMG, Maurício Pinto Ferreira, propôs que o Poder Judiciário e a comissão parlamentar se unam para criar, na ALMG, um Cejusc que seria “um posto avançado” para atendimento às demandas das pessoas com deficiência. A criação de uma vara especializada, em sua avaliação, não resolveria o excesso de demanda. “O grande caminho é a conciliação”, afirmou.

O deputado Carlos Pimenta (PDT) elogiou a ideia de priorizar o Cejusc no caso das demandas de saúde, com o objetivo de contornar a morosidade da Justiça. "A fila da judicialização da saúde já está maior que a fila do SUS", afirmou.

Deputados aprovam requerimentos

Ao final da reunião, foram aprovados três requerimentos de autoria dos deputados Duarte Bechir, Carlos Pimenta e Arnaldo Silva, todos para realização de audiências públicas.

Uma delas se destina a ouvir o desembargador Saulo Versiani e o juiz Maurício Ferreira sobre a proposta de instalação de um posto avançado de atendimento pré-processual em parceria com a Assembleia. Uma segunda é para ouvir representantes da Defensoria Pública e do Ministério Público sobre a criação de um fórum permanente para discussão e defesa dos direitos da pessoa com deficiência.

Por fim, o terceiro requerimento é para realização de uma audiência pública conjunta com as Comissões de Saúde e de Educação, Ciência e Tecnologia para debater a articulação entre as políticas de educação e saúde voltadas para a pessoa com deficiência.

Semana de Conscientização - A reunião da Comissão da Pessoa com Deficiência faz parte da Semana de Conscientização sobre o Autismo, promovida pela ALMG e 32 entidades parceiras. A programação de debates e atividades culturais prossegue até sexta-feira (6).

Consulte o resultado da reunião.