A fundação é responsável pela criação, gestão e execução das medidas de compensação das áreas e comunidades atingidas pela tragédia
O promotor Guilherme Meneghin disse que existem 19 ações na Justiça contra a Vale/BHP
Segundo Celise Laviola, a qualidade da água do rio piorou muito com as chuvas
Roberto Waack declarou que um dos focos da Renova é tentar ampliar o diálogo com a população atingida

Vítimas de Mariana reclamam de demora nas ações de reparação

Em reunião na ALMG, deputados e representantes de MP e MAB questionam Renova, responsável pela indenização dos danos.

06/12/2017 - 21:02 - Atualizado em 07/12/2017 - 12:32

Há uma resistência em reparar os direitos das vítimas do desastre ambiental resultante do rompimento da barragem de rejeitos de Fundão, em Mariana (Região Central do Estado), em 5 de novembro de 2015. Essa má vontade partiria das proprietárias da Samarco (empresa responsável pela barragem), Vale e BHP Billiton, que estariam dificultando os acordos para beneficiar os atingidos, por meio de medidas protelatórias e judicialização das questões.

A constatação é do promotor Guilherme de Sá Meneghin, da 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Mariana, que participou de audiência da Comissão de Direitos Humanos, nesta quarta-feira (6/12/17).

Essa tendência de dificultar o andamento das iniciativas em prol dos atingidos foi endossada pelas falas dos deputados que solicitaram a reunião – Rogério Correia e Cristiano Silveira, ambos do PT, do promotor André Sperling Prado, coordenador de Inclusão e Mobilização Social do Ministério Público, e de atingidos pelo desastre.

A reunião teve como objetivo debater pendências e atrasos no cumprimento das ações da Fundação Renova, responsável pela criação, gestão e execução das medidas de reparação e compensação das áreas e comunidades atingidas pela tragédia. 

A Renova foi criada após termo de ajuste de conduta (TAC) firmado entre as empresas implicadas e os governos federal e estaduais de Minas e Espírito Santo.

Animais - O promotor ressaltou que, em várias situações, o grupo empresarial responsável pela Samarco vem travando negociações. Ele exemplificou com o acordo firmado com a Renova de que a empresa ficasse com os animais atingidos, compromisso feito logo após a tragédia.

A empresa propôs comprar os bichos, mas queria pagar valores abaixo do mercado, fazendo inclusive contratos ilegais, com menores, idosos e analfabetos. O MP entrou com liminar suspendendo esses contratos e determinou que os valores pretendidos pela Samarco fossem acrescidos de 30%, mas ela não aceitou. “Agora, perderá na Justiça e o prejuízo vai para a Renova. Com R$ 100 mil, o problema seria resolvido”, constatou Meneghin.

Ele divulgou que, ao todo, são 19 ações na Justiça contra a Vale/BHP, sendo 17 civis e duas penais. Acrescentou que o Tribunal de Justiça mantém R$ 300 milhões bloqueados do grupo econômico, para pagamento de indenizações.

Além disso, há três ações de cumprimento de sentença, que resultaram no pagamento de auxílio financeira a cem atingidos. Foram assinados ainda outros dois TACs, com a Prefeitura e com a Arquidiocese de Mariana, que arrecadaram R$ 1,2 milhão e R$ 900 mil, respectivamente, em doações. O acordo é para que os recursos sejam distribuídos diretamente aos atingidos.

Ainda segundo o promotor, como resultado da ação do MP, a Renova já custeia o aluguel de casas para 300 famílias, o auxílio financeiro para cerca de 8 mil atingidos e algumas antecipações de indenização.

Rio Doce estava vivo antes da tragédia

Abordando a questão ambiental, o promotor André Sperling Prado, afirmou que, ao contrário do que tenta emplacar a Renova, o Rio Doce estava vivo antes do crime. “Milhares de pescadores de Minas e Espírito Santo viviam da pesca. Os índios Krenac reverenciavam espiritualmente o rio. Mesmo sendo um depósito de rejeitos da Vale, o Doce assim sobrevivia, mas o desastre o matou", disse.

Ele buscou confrontar o discurso da Renova com a realidade. “Ela afirma que desenvolve vários programas, mas na prática não quer negociar ou quer pagar valores irrisórios”. André Prado questionou ainda o alto gasto da Renova com propagandas, em detrimento do pagamento de indenizações. E qualificou como discriminação a atitude da fundação de insinuar que os atingidos não são capazes de decidir sobre o que é melhor para eles. 

Projetos - O deputado Rogério Correia avaliou que há "forças ocultas" agindo na Assembleia para dificultar a aprovação dos três projetos de lei (PLs) relacionados ao assunto. São eles:

  • PL 3.677/16, de autoria da Comissão Extraordinária das Barragens, determina a cobrança da taxa minerária, a ser destinada à Secretária de Estado de Meio Ambiente (Semad);
  • PL 3.676/16, também proposto pela comissão e que trata de fiscalização e licenciamento da mineração, visa proibir barragens de contenção de rejeitos;
  • PL 3.312/16, do governador Fernando Pimentel, cria a Política Estadual dos Atingidos por Barragens (Peabe).

O deputado Noraldino Jr. (PSC) questionou o colega sobre quais seriam essas forças ocultas. “Se for algo irregular, temos obrigação de combater”, afirmou. Tratando da negociação envolvendo os animais, ele acrescentou que a compra deles pela Renova representaria economia para a fundação. “Espero que a burocracia não continue a marcar essa questão”, defendeu.

O deputado Cristiano Silveira, presidente da Comissão de Direitos Humanos, respondeu que o setor minerário tem seus interesses e pode operar para que determinadas propostas não avancem na ALMG. “Isso nos preocupa, porque ficamos com medo de novas tragédias”, alertou.

A deputada Celise Laviola (PMDB), moradora de Governador Valadares (Vale do Rio Doce), disse que, com as últimas chuvas, a qualidade da água do rio piorou muito, com grande quantidade de lama sendo carregada. E pediu providências por parte da mineração e da Renova. “Não esqueçam do Vale do Rio Doce”, pediu.

Renova reconhece que há muito a ser feito

Roberto Waack, diretor-presidente da Renova, disse que a fundação tem por objetivo executar 42 programas para recuperação do desastre, sob supervisão do CIF. Ele destacou que um dos focos é tentar ampliar o diálogo com a população atingida. Por outro lado, reconheceu que a situação atual é angustiante também para a Renova. “Queremos esse problema resolvido o maís rápido”.

Sobre as ações em curso, registrou que está sendo feita a identificação dos atingidos, com o cadastramento até agora de 26 mil famílias. A fundação já está pagando auxílio emergenciais a atingidos, que recebem cartões, mas de acordo com Waack, o trabalho de cadastro para recebimento do auxílio, e se for o caso, de indenização, só será concluído em março de 2018.

Na área ambiental, Waack declarou que a estabilização de rejeitos na região de Germano começou a ser implantada, por pessoal especializado. Até agora, afirma, 101 afluentes do Rio Doce foram reparados. O trabalho de recuperação das margens do rio deve demorar, pelo menos, 3 anos para ser concluído.

Na Usina de Candonga, foram construídos três barramentos, para estabilizar os rejeitos no local. Também foram instaladas 92 estações de monitoramento no Rio Doce e os dados começam a ser apresentados a partir de janeiro de 2018, sob supervisão da Agência Nacional das Águas (ANA). Em relação à qualidade da água do Rio Doce, ele confirmou que “a água bruta do rio está em condições semelhantes àquelas de antes do acidente, ou seja, a água é potável”.

Quanto aos reassentamentos, disse que o plano não foi concluído, pois está sendo discutido com a comissão dos atingidos, com previsão de término em 2018. Como uma das entregas de trabalhos da Renova, ele destacou a reconstrução de parte do município de Barra Longa (Central), fortemente atingido pela lama da barragem rompida.

Governo estadual - Weslley Cantelmo, superintendente de Planejamento Urbano e Regional da Secretaria de Estado de Cidades e de Integração Regional, alertou para o fato de que a implantação do monitoramento da água do Rio Doce não significa a volta da qualidade desse recurso.

Sobre o cadastramento de atingidos, afirmou que há muitas pessoas reclamando a inclusão. Em relação aos reassentamentos, declarou que três comunidades estão envolvidas nisso: Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e Gesteira. A primeira está em fase mais adiantada, com perspectiva de conclusão do licenciamento ambiental até março de 2018.

MAB - De acordo com Camila Brito, do comitê estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o balanço não é positivo. “Há dois anos de impunidade e de direitos humanos violados. A fundação Renova age de forma autoritária porque não considera a posição dos atingidos. Queremos indenização justa e ainda a compensação dos danos materiais e imateriais causados”, clamou.

Consulte o resultado da reunião.