Especialistas brasileiros e estrangeiros trocarão experiências e informações sobre políticas públicas sobre drogas em evento que será realizado nos dias 16 e 17/11
Antônio Jorge acredita que regulação do uso de drogas pode trazer menos prejuízos que repressão

Assembleia discute alternativas à guerra contra as drogas

Legislativo mineiro analisa a experiência de outros países com a regulamentação ou descriminalização do uso de drogas.

06/11/2017 - 11:10

Uruguai, Portugal, Holanda, Colorado (nos Estados Unidos), Jamaica: a variedade de experiências internacionais de descriminalização ou legalização do uso de drogas vem alimentando uma polêmica que está suspensa, no Brasil, desde setembro de 2015, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) interrompeu um julgamento que decidirá se é crime o porte de drogas para uso pessoal.

A fim de contribuir para o debate, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realiza, nos dias 16 e 17 de novembro, o Encontro Internacional Descriminalização das Drogas, aberto ao público, com inscrições gratuitas e limitadas, que podem ser feitas até o dia 16 de novembro.

Para o deputado Antônio Jorge (PPS), uma discussão desse tipo não pode ficar restrita ao STF, mas deve envolver toda a sociedade e passar necessariamente pelo Poder Legislativo. É ele o autor do requerimento para realização do Encontro Internacional e presidente da Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas.

“Se é verdade que, nesse assunto, dependemos de normativas que são prerrogativas da União, nenhuma lei terá eficácia se não houver consciência e debate na sociedade. Portanto, é papel muito relevante dessa Casa trazer esse debate”, avaliou Antônio Jorge.

Focos - O tema será discutido sob os pontos de vista da saúde, da segurança e da justiça. Outro foco do debate é a experiência de Portugal e Uruguai. A legislação portuguesa foi modificada em 2000, deixando de classificar como crime a compra e a posse de drogas para consumo pessoal, até certo volume.

No Uruguai, a produção, a venda e o consumo de maconha foram regulamentados de forma detalhada em 2013, sendo permitidos sob circunstâncias específicas, apenas para cidadãos uruguaios, maiores de 18 anos e registrados.

Os dois casos serão detalhados, na ALMG, pelo secretário de Estado da Saúde de Portugal, Manuel Delgado; pelo subdiretor-geral do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (Sicad-Portugal), Manuel Ribeiro Cardoso; e pelo advogado Daniel Rueda Kramer, que foi consultor do governo uruguaio para a regulamentação do consumo de maconha.

Uruguai regularizou o consumo da maconha

O modelo uruguaio legalizou o comércio e o consumo de maconha, mas sob regras minuciosas e controle rigoroso. É possível portar até 40 gramas sem ser importunado pelas autoridades, mas, assim como o álcool, é terminantemente proibido dirigir sob o efeito da maconha.

Para produzir, comercializar e consumir essa droga é preciso ser cidadão do país, maior de 18 anos e se registrar. Existem três modalidades:

  • O cultivo doméstico, para o qual são permitidas até seis plantas por casa e a produção de até 480 gramas por ano.
  • A associação a clubes específicos para esse fim. Os clubes, que são pessoas jurídicas, podem ter de 15 a 45 membros e lá é permitida a produção das mesmas 480 gramas por sócio por ano, com o limite de 99 plantas por instituição. Toda a produção deve ser dividida entre os sócios e os clubes devem se situar em locais específicos (nunca perto de escolas, por exemplo).
  • A compra em drogarias autorizadas. Além da licença para isso, as drogarias têm sua venda limitada a 40 gramas mensais por cidadão (ou as mesmas 480 gramas por ano).

No centro do sistema está o Instituto de Regulação e Controle de Cannabis (IRCCA), vinculado tanto à Secretaria Nacional de Drogas quanto ao Ministério da Saúde. O instituto tem um conselho nacional honorário com participação de todos os segmentos envolvidos, inclusive usuários.

O deputado Antônio Jorge compara a regulamentação uruguaia ao que foi feito no Brasil em relação ao cigarro. “Não proibimos o cigarro, mas conseguimos reduzir seu consumo em 30%. Isso significa milhares de vidas salvas, economia absurda de assistência, sem entrarmos em uma política proibicionista, mas de regulação de uso”, avaliou.

Portugal escolhe descriminalização e assistência ao usuário

Exemplo de descriminalização do consumo de drogas, mas não de legalização. O comércio e o consumo de drogas em Portugal continuam proibidos, mas a legislação aprovada em 2000 deixou de classificar como crime punível com prisão a posse de qualquer droga suficiente para o consumo em um período de até 10 dias. O volume específico de cada substância é regulado.

O consumo em lugares públicos continua proibido. Caso alguém seja flagrado com drogas para consumo pessoal, a pessoa pode optar por entrar em um programa de tratamento de sua dependência ou pagar uma multa, por infração administrativa. O diferencial desse modelo é esse sistema de acompanhamento dos usuários por meio de programas e serviços públicos de apoio.

A multa não é definida pelo Judiciário, mas por organizações sociais de convencimento de dependentes de drogas, principalmente o Serviço de Intervenção em Comportamentos de Vício e Dependências (Sicad).

Caso a pessoa seja detida com um volume de droga superior ao que a lei especifica como suficiente para o consumo por dez dias, pode ser enquadrada no crime de tráfico de drogas. Também não é permitido cultivar maconha para consumo próprio.

O sucesso da experiência portuguesa, na avaliação do deputado Antônio Jorge, é demonstrado pela mudança de posicionamento de setores que inicialmente resistiam às novas regras.

“Portugal passou por isso que estamos passando hoje, um debate na sociedade, posições arraigadas, ligas de mães contrárias à descriminalização… Hoje, essa liga de mães é uma ardorosa defensora da descriminalização, porque elas viram que seus filhos passaram a ter tratamento. Todos os indicadores apresentaram uma grande melhora: morte por overdose, número de usuários e outros”, elogiou o parlamentar.