Comissão Extraordinária de Proteção dos Animais da ALMG discutiu assunto na noite desta quinta-feira (5)
Paglia reforçou o impacto da medida em espécies com mais dificuldade de reposição

Repúdio a projeto que libera caça domina audiência pública

Participantes conclamaram a população a se mobilizar contra a proposta que tramita na Câmara dos Deputados.

06/10/2017 - 00:24

O Projeto de Lei (PL) Federal 6.268/16, do deputado Valdir Colatto (PMDB/SC), que dispõe sobre a política nacional de fauna, permitindo a caça de animais silvestres, foi rechaçado, na noite desta quinta-feira (5/10/17), em audiência pública da Comissão Extraordinária de Proteção dos Animais da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). “É inconcebível apoiar essa proposta”, afirmou o presidente da comissão, deputado Noraldino Júnior (PSC), que está coletando assinaturas para encaminhar uma moção de repúdio e um pedido de posicionamento contrário aos deputados federais mineiros.

Os participantes da audiência pública condenaram pontos considerados inconstitucionais e inaceitáveis no projeto. Um deles é a possibilidade de abate e eutanásia de animais avaliados como nocivos ou em descontrole populacional. Noraldino Júnior lembrou que o termo eutanásia significa abreviar a vida de um ser em estado terminal ou com doença incurável. “Isso é assassinar, massacrar, exterminar; 99% dos animais não estão em fase terminal de vida. Estão sendo assassinados”, vociferou.

Coordenadora do Centro de Triagem da Diretoria de Proteção à Fauna do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Alice Ribeiro de Sá Lopes atentou para a proibição sugerida pelo projeto de reintrodução à natureza dos animais capturados pelos órgãos de fiscalização. Segundo ela, a matéria propõe as seguintes alternativas de destinos: para criação e manutenção em cativeiros; usos em projetos de pesquisas e atividades de manejo; ou submetidos à eutanásia.

Alice afirmou que só em Minas Gerais o centro de triagem recebe mensalmente 10 mil animais que, em sua maioria, são devolvidos ao habitat, após a recuperação. “Os criadores não têm condições de receber tantos animais; os projetos de pesquisas são focados apenas em espécies em extinção. Como podemos eutanasiar 10 mil seres vivos? Qual profissional conseguiria trabalhar num ambiente desses?”, questionou.

Abates - A possibilidade de extermínio de animais também indignou os outros participantes. O projeto de lei permite que agricultores eliminem espécies que considerem prejudiciais às suas atividades. Adriano Pereira Paglia, professor de Ecologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), advertiu para o risco de abates descontrolados, que podem comprometer outras espécies. “Todo animal que pode caçar sua galinha, ele (o agricultor) será autorizado a caçar”, exemplificou.

Um dos animais que comumente rondam fazendas são as onças, que estão em risco de extinção, como alertou a integrante do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais, Adriana Araújo. O desparecimento do felino, que ocupa o topo da cadeia alimentar, pode trazer incalculável desequilíbrio ao meio ambiente e à existência de outras espécies.

Argumento de controle populacional também é rejeitado

Uma das justificativas do autor do projeto é de que a caça poderia controlar superpopulações de animais exóticos, como o javali, ou silvestres, que estariam prejudicando o equilíbrio dos ecossistemas e provocando devastações.

Segundo Adriana Araújo, quando se quer controlar o crescimento populacional deve se focar em técnicas de esterilização de fêmeas. “A caça não controla a população. É uma técnica bárbara, que embrutece as pessoas”, considerou.

Adriano Paglia também alertou para a falta de critérios sobre os diversos tipos de caças e os impactos que podem provocar em espécies com mais dificuldades, por exemplo, de reposição. “É uma irresponsabilidade”.

Os participantes da audiência também se indignaram com a possibilidade que o projeto abre de utilizar cães de caça em unidades de conservação. De acordo com o diretor de Fiscalização dos Recursos Faunísticos e Pesqueiros da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Marcelo Coutinho Amarante, isso pode contaminar os animais selvagens, que não têm proteção contra doenças como leptospirose ou cinomose.

Agronegócio - Na opinião da presidente da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), Maria Dalce Ricas, o projeto tem por objetivo beneficiar os setores do agronegócio e da indústria de armas.

“Um retrocesso violento a uma cultura que já considerávamos ultrapassada. Nossas florestas estão vazias. Vamos caçar o que restou dos nossos animais silvestres?”, questionou.

A possibilidade de manejo in situ (em vida livre) de espécies silvestres para caça também foi duramente criticada. “O manejo de espécies nativas tem que ser muito bem conduzido. Temos que ter mais estudos, mais controle e fiscalização. Vamos ter que aceitar um monte de aberração, se passar a lei”, considerou Marcelo Amarante.

O analista ambiental do Núcleo de Biodiversidades e Florestas do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama/MG), Júnio Augusto dos Santos Silva, criticou a justificativa de que o manejo pudesse gerar mais recursos para a economia. “Só vão investir em bicho que têm interesse de caçar”.

Inconstitucional - Edna Cardozo Dias, presidente da Comissão dos Direitos dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG) e do Instituto Abolicionista Animal (IAA), disse que a proposta é inconstitucional, pois confronta a responsabilidade do poder público de preservar a diversidade biológica do País.

Única exceção entre os participantes da reunião, o professor Romulo Ribon, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), defendeu a prática como forma de manejo, mas admitiu que a proposta precisa de ajustes para consertar erros. O ornitólogo acredita que a caça controlada pode injetar mais recursos para pesquisa e fiscalização.

Consulte o resultado da reunião.