Posição da instituição é a favor da equidade no acesso ao ensino superior, para que o Estado reflita sua diversidade
Bruno Costa defendeu que o governo promova democracia e direitos humanos, em vez de reproduzir injustiças históricas

Projeto sobre cotas vai incluir estudantes de escola pública

Alunos da Fundação João Pinheiro defendem ampliação de proposta de reserva de vagas para negros.

23/08/2017 - 19:50 - Atualizado em 24/08/2017 - 11:59

Ampliar a proposta original de cotas raciais na Escola de Governo da Fundação João Pinheiro (FJP), para incluir estudantes de escolas públicas e de situação econômico-financeira precária. A ação foi anunciada durante reunião realizada pela Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quarta-feira (23/8/17).

O objetivo do debate foi tratar da política de cotas adotada pela instituição. Atualmente, a FJP destina 10% de suas vagas no processo seletivo às pessoas com deficiência.

Após a reunião, a deputada Marília Campos (PT) anunciou a proposta de modificação do Projeto de Lei (PL) 4.355/17, para que as cotas sejam também sociais, distribuídas da seguinte forma: 40% das vagas para pessoas que cursaram o ensino médio em escolas públicas e, dentro dessas, 50% para negros e 50% para oriundos de famílias com renda de no máximo um salário-mínimo e meio per capita.

"Temos que reparar essa dívida histórica com a população negra, garantindo mais oportunidades aos que estão em desigualdade no País", reforçou a deputada.

Autora do requerimento para a realização da reunião, também é de sua autoria o PL 4.332/17, que prevê reserva de 20% das vagas para negros no curso de Administração Pública da FJP.

O PL 4.332/17 foi anexado ao PL 4.355/17, do governador, que altera a Lei 18.974, de 2010. Essa norma estabelece a estrutura da carreira de especialista em políticas públicas e gestão governamental, para a qual é necessário cursar a graduação em Administração Pública da FJP.

Substitutivo - A reserva de vagas proposta pela deputada está presente em substitutivo aprovado na Comissão de Constituição de Justiça ao PL 4.355/17. O projeto ainda será apreciado pela Comissão de Direitos Humanos, antes de ir a Plenário para discussão e votação em 1º turno.

O deputado André Quintão (PT) apoiou a ampliação da proposta original. "Posso dizer de experiência própria: quanto mais diversidade e pluralidade de vivências no serviço público, mais cresce a gestão pública. É bom para todos", afirmou

Democratização do acesso ao ensino

O professor da FJP, Bruno Lazzarotti Diniz Costa, estabeleceu que a posição institucional, aprovada em colegiado de curso, é a favor das ações afirmativas para a democratização do acesso à Escola de Governo. Segundo ele, é preciso garantir equidade no acesso ao ensino superior e essa equidade garantirá o mérito dos alunos.

"Um Estado que não reflete a diversidade será tendencioso, e isso vai impactar a maneira como trata seus cidadãos. Garantir que posições estratégicas reflitam a pluralidade da sociedade garante que o governo promova democracia e direitos humanos, em vez de reproduzir iniquidades históricas", declarou o professor.

A estudante da FJP e integrante do grupo Cotas em Minas, Ingrid Vitória Carvalho, lembrou que a Escola de Governo é a única instituição de ensino pública que ainda não possui cotas em Minas Gerais. "Precisamos formar gestores diversos e que vão pensar as políticas estaduais direcionadas aos públicos que precisam delas", afirmou.

Representando a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a mestranda da Faculdade de Educação Kely Cristina Cândido lembrou que a política de cotas raciais já foi legitimada pelo Supremo Tribunal Federal em 2012. Segundo ela, a disseminação dessa reserva de vagas resultou em maior inclusão social no ensino superior.

A necessidade de ações afirmativas, não apenas nas universidades, foi destacada pela representante do Coletivo Pretas em Movimento, Silvia Regina Costa. "Temos de democratizar as pós-graduações. As temáticas e percepções sobre a sociedade precisam ser deslocadas. A instituição de ensino só cresce e melhora com isso", defendeu.

Ações afirmativas combatem o preconceito

A superintendente de Políticas Afirmativas e Articulação Institucional da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, Yone Maria Gonzaga, frisou que o racismo é um processo estrutural e que, levando em consideração o perfil étnico e racial do Estado, são poucos os alunos negros atualmente na FJP.

A agente de inovação da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Luísa Souza Costa, afirmou que muitos ainda têm dificuldade em enxergar o racismo e a diferença salarial oriunda do preconceito. "Só quem vivencia, sabe. Já temos 123 anos desde a abolição da escravatura e ainda não conseguimos corrigir isso. É preciso fazer algo a respeito", opinou.

O doutorando em Antropologia Social da UFMG, Daniel de Oliveira Baptista, explicou que as cotas não favorecem nem extinguem o mérito das pessoas negras, pois elas têm de provar seu valor em inúmeras prestações de contas e seleções posteriores. "As cotas representam oportunidade e identidade, nos lembram quem somos e colaboram no nosso protagonismo", disse.

Consulte o resultado da reunião.