Comissão de Participação Popular debateu o tema nesta sexta-feira (23)
Para Wellerson Corrêa, o encaminhamento ao judiciário deveria acontecer em último caso

Irregularidades no acolhimento compulsório são denunciadas

Judiciário sinaliza para revisão de norma que prevê apartamento de bebês de mães usuárias de drogas.

23/06/2017 - 14:30

Os abusos referentes ao acolhimento compulsório de bebês, filhos de mulheres usuárias de drogas ou em situação de vulnerabilidade, podem estar perto de ter um fim. De acordo com um ofício do juiz Marcos Flávio Lucas Padula, da Vara Cível da Infância e da Juventude de Belo Horizonte, uma nova portaria sobre o assunto já estaria sendo elaborada, com a revogação dos pontos polêmicos da norma em vigor.

O tema foi abordado nesta sexta-feira (23/6/17) na Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A prática do acolhimento compulsório de bebês, que deveria acontecer de forma excepcional, foi duramente criticada por representantes de entidades e órgãos ligados aos direitos da criança, que consideraram que o procedimento tem sido feito sem o direito de defesa dos genitores e sem o envolvimento dos órgãos competentes para mediar a questão, como o Conselho Tutelar.

Portaria 3 da Vara Cível da Infancia e Juventude de BH, de 2016, determinou que os profissionais de saúde e de instituições hospitalares que constatarem ou identificarem evidências de que os genitores e/ou crianças recém nascidas se encontram em situação de vulnerabilidade ou risco deverão comunicar o fato, em até 48 horas, à Vara Cível da Infância e da Juventude de Belo Horizonte.

Entretanto, a norma tem sido alvo de críticas, na medida em que o procedimento, que deveria ser a última medida cabível, tem se tornado praxe, já que a portaria determina que a não comunicação do fato pode ensejar responsabilidade criminal do profissional da saúde.

Documento - A deputada Marília Campos (PT), que solicitou o debate, disse que, em junho de 2017, enviou ao juiz Marcos Flávio Lucas Padula, da Vara Cível da Infância e Juventude de Belo Horizonte, um documento com sugestões de diretrizes para a elaboração de termo de cooperação tecnica, com a solicitação da suspensão provisória da Portaria 3.

Em resposta, segundo a parlamentar, Padula informou que uma nova portaria sobre o assunto já estaria em elaboração, com proposta de revogação da anterior nos pontos polêmicos, entre eles a comunicação preferencial da situação de vulnerabilidade ou risco ao Conselho Tutelar.

O juiz ainda informou na resposta que já estaria em estudo um ato normativo para esclarecer aos profissionais da área da saúde que a comunicação imediata ao Conselho Tutelar é sempre preferencial e que ela exclui a responsabilidade do profissional.

Acolhimento é visto como última medida a ser adotada

O defendor público da Infância e da Juventude,Wellerson Eduardo da Silva Corrêa, disse que a Defensoria Pública já apresentou medida para revogar a portaria, já que nela teriam sido constatadas ilegalidades e incongruências, que usurpam e invadem competências de outros atores do sistema de garantia de direitos.

“O acolhimento é ato de competência judicial, mas só deve ser levada em efeito após o esgotamento da atuação do Conselho Tutelar. Cabe ao conselho ser a porta de entrada desse sistema de garantias e, no caso de violação de direitos e risco para a criança, agir na aplicação das medidas protetivas”, disse. Dessa forma, segundo ele, o encaminhamento ao judiciário deveria acontecer em último caso.

A defensora pública da Infância e Juventude, Danielle Belletato, também fez críticas ao abrigamento compulsório, que segundo ela retira a oportunidade de atuação da família e não dá direito de defesa aos pais. “As famílias não tiveram a oportunidade de serem família. Então, como chegamos à conclusão de que elas serão riscos para as crianças? Há um pré julgamento”, disse. Segundo ela, um alto percentual de bebês que são abrigados vêm diretamente das maternidades, o que significa que as mães nem puderam exercer a maternidade.

A defensora ainda criticou pontos da resposta enviada pelo juiz da Vara Cível da Infância e da Juventude, que afirmou que, no momento do abrigamento, os pais são ouvidos e encaminhados à Defensoria. “Esse procedimento, embora previsto na portaria, nunca foi cumprido. A defensoria nunca foi intimada para audiência para verificar a necessidade de abrigamento”, disse. 

Dados - A gerente de promoção e proteção especial da Secretaria de Assistência Social de Belo Horizonte, Kátia Rochael, defendeu que o fortalecimento da rede de proteção básica pode impactar na redução da demanda e da pressão pelo acolhimento na alta complexidade. Segundo ela, entre 2012 e 2017, cerca de 590 bebês entre zero e 11 meses foram acolhidos nas 47 unidades de acolhimento institucional existentes. Ela também acrescentou que o custo de acolhimento de uma criança é de R$ 3 mil.

A representante do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, Eleusa Andrade Veiga, também reafirmou que o acolhimento institucional só deve ocorrer em casos extremos como última medida protetiva.

O presidente do Fórum Mineiro de Conselheiros e ex-Conselheiros Tutelares, Wellington Amorim, também lembrou que o principal objetivo preceituado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é a permanência da criança com a família, cabendo ao Conselho Tutelar atuar nesse sentido.

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