TV Assembleia recorda um ano da tragédia de Mariana
Documentário Memórias Rompidas destaca a importância do registro fotográfico na lembrança dos sobreviventes.
14/10/2016 - 18:35 - Atualizado em 07/11/2016 - 12:30A foto de um filho que se foi, de um casamento, de uma casa. Lembranças eternizadas em papel, em negativo, em álbuns. Para muitos moradores atingidos pela lama da mineradora Samarco - em Bento Rodrigues; no distrito de Paracatu, em Mariana (Região Central do Estado), e no município de Barra Longa (Zona da Mata) -, esses retalhos de papel e celulose guardam tesouros inestimáveis. Lembranças afetivas de um outro tempo, um tempo interrompido pelo inaceitável, pelo absurdo e pela tragédia.
Esse é o foco do documentário Memórias Rompidas, que a TV Assembleia exibe a partir de 17 de outubro, em seis episódios, nos intervalos da programação. No dia 5 de novembro, quando se completa um ano do desastre ambiental, social e cultural que devastou os distritos de Mariana, o filme, de 45 minutos, será exibido na íntegra.
Em cada episódio, de seis a oito minutos, um personagem da tragédia é abordado. Do bombeiro que participa das operações de busca ao fotojornalista que registra o resgate de uma criança; do promotor que cuida da indenização das vítimas ao homem que olha com saudades a casa da família; do fotógrafo que cede aos sobreviventes imagens de seu acervo à mãe que chora a perda da filha. Todos têm em comum o registro fotográfico como reforço da memória.
Essas e outras histórias estão presentes no documentário editado por Erick Araújo, com produção de Tatiana Fontes, tendo como cinegrafista Alex Ramos e assistente de câmera Wenderson Batista.
“É um trabalho coletivo da TV Assembleia”, faz questão de registrar Erick, destacando que o objetivo é mostrar o lado humano da tragédia de Mariana, cujas vítimas perderam não somente casas e bens materiais, mas foram sobretudo atingidas em sua própria história de vida, perdendo vínculos sociais e afetivos com parentes e vizinhos.
Daí a importância que a fotografia tem em todos os relatos. “Queremos buscar a memória dessas pessoas e dar visibilidade ao aspecto humano da tragédia”, diz Erick.
Personagens exibem fotos e falam de dores e esperança
O primeiro vídeo exibido retrata o trabalho de resgate das vítimas feito pelo subtenente Selmo de Andrade, do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, corporação que cedeu à TV Assembleia fotos e imagens tiradas a partir de drones. O militar conta que, entre os primeiros lamentos que ouviu dos sobreviventes, destacava-se a perda de fotografias e álbuns de família, registros afetivos que guardam a memória e a história de cada um.
O depoimento do repórter fotográfico do jornal Estado de Minas Euler Jr., autor da fotografia do menino Thiago, que pereceu na tragédia, é o tema do segundo episódio. A foto do menino, feita no calor do resgate, foi premiada no Brasil e nos Estados Unidos. Ao todo, foram contabilizadas 19 mortes em decorrência do rompimento da barragem da Samarco.
Moradora de Bento Rodrigues, Vilma Gonçalves é entrevistada no terceiro episódio. Ela descreve o distrito antes da tragédia e lamenta a perda do álbum de seu casamento, registrado por Élcio Rocha, fotógrafo de Mariana responsável pelo registro de muitos acontecimentos sociais em Bento Rodrigues. Penalizado, Élcio pesquisou em seu acervo e presenteou as pessoas da comunidade com novas cópias dos eventos que registrou. Vilma foi uma das agraciadas.
Marino D'Ângelo, de Paracatu, subdistrito de Mariana, é o personagem principal do quarto episódio. Ao contrário de Bento Rodrigues, totalmente destruído, Paracatu, após o desastre, deixou rastros e vestígios de casas, escola e outras construções.
Mesmo assim, Marino lamenta a devastação e lembra com saudades da casa onde a família se reunia no Natal para comemorar o aniversário do sogro, celebrando ao mesmo tempo as duas datas. Fotos antigas também mostram a casa, antes do desastre.
O quinto episódio retrata Pamela Rayane, que perdeu na tragédia a filha Emanuelly, cujas fotos revê com saudades. Grávida na ocasião do desastre, Pamela, também mãe de Nicholas, que sobreviveu, vê na chegada do terceiro filho, Moisés, a esperança da reconstrução, embora guardando a certeza de que a perda da filha é irreparável.
Finalmente, no último vídeo, está o exemplo de um time amador de futebol que nem a lama foi capaz de separar.
Vivendo até hoje em condições improvisadas, os personagens dessa tragédia sofrem com preconceitos e inadaptação à nova situação de vida, enquanto aguardam a recriação da nova Bento Rodrigues, em terreno adquirido pela mineradora Samarco, ainda em fase de estudo topográfico. E sabem que, a exemplo da música de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, “nada será como antes, amanhã”.