Comissão de Assuntos Municipais debateu o impasse nas negociações salariais, a precarização do trabalho e o sucateamento da Urbel
Giovanni (centro) afirmou que os funcionários também querem aperfeiçoar a política de habitação
Para Eliete Soares, o sucateamento é da política municipal de habitação como um todo, e não da Urbel

Problemas na Urbel refletem falhas na política habitacional

Conclusão é de servidores, que sofrem com perdas salariais e apontaram, na ALMG, incertezas no setor em BH.

11/08/2016 - 15:59

O sucateamento da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) vai além da defasagem salarial dos seus trabalhadores, e aponta também para as incertezas quanto ao futuro da política municipal de habitação de Belo Horizonte. Esse é o cenário traçado por trabalhadores do órgão e representantes sindicais durante audiência pública promovida nesta quinta-feira (11/8/16), pela Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

O diretor de Formação Política do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Assessoramento, Pesquisa, Perícias e Informações e Congêneres de Minas Gerais (Sinttappi-MG), Giovanni Braz Henriques, externou sua preocupação com o sucateamento progressivo da Urbel, sua perda de autonomia e de prestígio e com o desgaste do órgão com a comunidade, em virtude das remoções que são feitas sem planejamento. A Urbel é o órgão ligado à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) responsável pelas ações de urbanização nas vilas, favelas e conjuntos habitacionais populares.

“Não é meramente a luta por reajuste salarial, mas pela manutenção do órgão com o aperfeiçoamento da política municipal de habitação. A política municipal de habitação de BH é reconhecida como referência de política social”, disse o diretor, que também fez uma retrospectiva da batalha que os trabalhadores do órgão vêm travando pela melhoria salarial, que resultou na greve da categoria iniciada no último dia 2 de agosto.

Segundo Giovanni Henriques, antes disso, os trabalhadores da Urbel cruzaram os braços em outubro do ano passado e, mesmo a Urbel tendo sido sentenciada a reajustar o salário dos trabalhadores, a PBH recorreu da decisão e está protelando o pagamento. Em 2016, apesar da expectativa da categoria de retomar as negociações, obtendo pelo menos a recomposição da inflação, a categoria acabou aderindo a uma nova paralisação.

Mudança - O sindicalista também se mostrou assustado com o fato de a PBH e a Urbel planejarem mudar o órgão de sua sede própria, na Avenida do Contorno, para um prédio a ser alugado na Avenida Afonso Pena, onde a Urbel seria instalada junto com a Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura. Na sua avaliação, essa mudança pressupõe que haverá uma reforma administrativa para reduzir custeio e, consequentemente, direitos dos trabalhadores.

“O mais drástico é que, ao fazer isso, a Urbel deixará de ter autonomia para atuar na politica de urbanização em vilas e favelas, por meio da produção de moradias, da organização desses locais e da regularização fundiária. O que sabemos é que a política municipal de habitação que conhecemos não vai existir mais”, lamentou Giovanni Henriques.

Futuro da política de habitação da Capital é incerto

O analista técnico e social da Urbel, Luis Torres Barros, relatou que a preocupação dos funcionários do órgão não é apenas com os direitos trabalhistas, mas também com os direitos sociais das camadas mais empobrecidas da população de BH, em especial com relação ao direito à moradia. “Nós, funcionários, queremos um trabalho que nos remunere bem e que esteja cheio de sentido, pela certeza que ele traga impacto positivo para a população”, afirmou.

Nessa linha, Luís Barros elencou uma série de supostos problemas na política municipal de habitação da Capital que, para ele, têm se agravado nos últimos anos. Um deles é a explícita restrição de direitos ao se aumentar, para fins de acesso ao atendimento habitacional, o tempo requerido de moradia de uma família em BH.

Ele explicou que, desde 1993, para que uma família fosse beneficiada com uma unidade habitacional, teria que morar em BH há no mínimo dois anos, exigência que é hoje de cinco anos.

Outro ponto abordado pelo analista foi quanto à população em situação de rua. Luís Barros informou que a Resolução 2, de 1994, do Conselho Municipal de Habitação, que institui a Política Municipal de Habitação de BH, prevê a população de rua como um dos públicos-alvo da politica de habitação, embora hoje essas pessoas sejam atendidas somente pelo Bolsa Moradia.

Luís Barros acrescentou que os conjuntos habitacionais produzidos pela politica municipal de habitação devem ter não mais que 300 unidades e estar bem inseridos na malha urbana, o que estaria sendo desrespeitado.

Retrocessos - O funcionário da Urbel ainda denunciou retrocessos no programa que atende famílias que habitam em áreas de risco, como o corte no direito a reassentamento dos removidos. Ele também lembrou que, numa intervenção em vilas e favelas, seja para urbanização ou para a intervenção de risco geológico, as áreas remanescentes deveriam receber um tratamento adequado, podendo até ser usadas para a construção de equipamentos públicos, para uso das próprias famílias moradoras de vilas e favelas. 

Trabalhador da Urbel e delegado sindical do Sintappi, Lucas Roany também reforçou a ideia de que a desvalorização do servidor e a questão da política salarial estão ligadas à precarização na própria política municipal de habitação. Esses dois pontos, na sua opinião, têm como fator comum a intransigência e a dificuldade de diálogo da prefeitura com servidores e com os movimentos sociais.

Deputados reforçam importância da instituição

A conselheira do Conselho Municipal de Habitação, Eliete de Oliveira Soares, lembrou outra ameaça à Urbel: a unificação com a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap). Eliete acredita que o processo está sendo tratado pela PBH de forma atropelada. Com isso, avalia que o município pode reviver o que já ocorreu em 2011, quando a Secretaria Municipal de Habitação foi extinta e a prefeitura teria se eximido de suas responsabilidades com a política de habitação. Para ela, o que ocorre agora é a mesma “manobra política”.

Eliete Soares confirmou ainda que o sucateamento denunciado na audiência é da política municipal de habitação como um todo, e não apenas da Urbel. A conselheira também abordou a questão da precarização do trabalho dos funcionários da companhia, que estariam sendo substituídos por assessores, na avaliação dela, “sem compromisso com a política de habitação”.

Um dos autores do requerimento, o deputado Paulo Lamac (Rede) pontuou que a Urbel é uma empresa pública de grande importância para Belo Horizonte, atuando nas chamadas áreas não formalizadas da Capital, em comunidades historicamente excluídas. Segundo ele, a instituição, que faz uma política de ponta que beneficia um número significativo de moradores vivencia, nesse momento, a segunda greve na sua história, o que é grave.

Negação - Já o deputado Rogério Correia (PT), que também assina o requerimento para a audiência, se disse abismado em ver o retrocesso e a precarização da política municipal de habitação. Segundo ele, a retirada das pessoas das ocupações é feita sem planejamento e sem ordem judicial. Segundo ele, a determinação é simplesmente retirar as pessoas e isso é uma forma de fingir que o problema não existe.

Ainda na avaliação do parlamentar, há um despreparo da prefeitura para tratar dessas questões, para planejar para onde as famílias irão. Ele também pontuou que a situação vivenciada pelos servidores da Urbel ,que alegam estarem há 27 meses sem reajuste, é um quadro que se desponta para todo o Brasil, caso não haja uma reação da sociedade.

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