Classificar o rompimento como acidente de trabalho significa que o processo também deveria tramitar na Justiça do Trabalho, conforme explicou parlamentar na reunião
Na reunião, foi entregue relatório do Ministério do Trabalho sobre a tragédia

Rompimento de barragem pode gerar demanda trabalhista

Reunião da ALMG homenageou vítimas do desastre em Mariana, que eram, em sua maioria, trabalhadores.

28/04/2016 - 18:11 - Atualizado em 02/05/2016 - 19:10

O rompimento da barragem de Fundão, na cidade de Mariana (Região Central do Estado), ocorrido em novembro do ano passado, foi uma tragédia de origem ocupacional. Portanto, deve ser tratado também como acidente de trabalho. Essa foi a conclusão à qual chegaram parlamentares, sindicalistas e membros da sociedade civil presentes na audiência da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta quinta-feira (28/4/16), no Centro de Convenções do município.

A escolha da data da reunião se deu pelo fato de que 28 de abril é Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho. Durante a audiência, foram realizados diversos atos para lembrar os 14 trabalhadores mortos por causa do rompimento da barragem, com a menção de cada um dos nomes, as respectivas idades, tempo de empresa e funções, pela presidente da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT-MG), Beatriz da Silva Cerqueira. Ela explicou que o ato foi para humanizar a tragédia, já que “números não são pessoas e cada um deles era importante”. Em memória das vítimas da tragédia, os trabalhadores presentes à reunião acenderam 20 velas, número total dos vitimados.

O presidente da comissão e autor do requerimento para o debate, deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB), explicou que classificar o rompimento como acidente de trabalho não significa dizer que foi fatalidade, mas sim que o processo também deveria tramitar na Justiça do Trabalho. “Mais de um milhão de pessoas foram atingidas, mas as vítimas diretas foram os que morreram e seus familiares. Na década de 1970, a tragédia da Gameleira, o maior acidente da construção civil brasileira, tramitou pela Justiça Comum, e todas as vítimas eram trabalhadores. Até hoje não tivemos ninguém penalizado nem nenhuma vítima indenizada”, afirmou o deputado. Ele pediu, ainda, que a Comissão Extraordinária das Barragens amplie a discussão a partir do ângulo das questões trabalhistas.

O presidente da União Geral dos Trabalhadores de Minas Gerais (UGT-MG), Paulo Roberto Silva, culpabilizou o Estado pelo ocorrido. "Se tivesse uma fiscalização coerente e adequada, talvez não teria acontecido o que aconteceu. O Estado brasileiro está ausente de tudo", disse, acrescentando que a repercussão do acidente de Mariana se deve menos pelas mortes dos trabalhadores e mais pela tragédia ambiental, que também considerou grave. Segundo ele, entre 2012 e 2014, foram registradas 8.392 mortes por acidente de trabalho, uma média de 350 mortes por mês, sem que houvesse tanta repercussão. Concluindo, disse que "pior do que o acidente é a empresa (Samarco) fechar as portas" e disse que "é primordial que essa empresa volte a funcionar para que o município volte a crescer".

O superintendente regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais, Ubirajara Alves de Freitas, entregou relatório do Ministério do Trabalho com as conclusões dos auditores fiscais sobre o rompimento da barragem e pediu que a legislação trabalhista brasileira preveja punições mais severas, pois, em sua opinião, as atuais são desrespeitadas por não serem temidas pelas empresas. “Desde 2011, a Samarco recebeu 105 infrações. A multa mais alta que já aplicamos foi de R$ 7 mil. O que é isso para uma mineradora? Nada!”, criticou o superintendente.

O gerente geral de Infraestrutura da Samarco Mineração, Carlos Antônio de Amorim Neto, mostrou interesse em conhecer o teor do relatório e disse que a empresa está colocando todos os seus esforços e recursos na reparação dos estragos e indenização das famílias. “Não temos como recuperar as vidas, mas aprendemos a lição e estamos nos esforçando para que uma tragédia como essa nunca mais se repita”, disse.

Titular da Procuradoria Regional do Trabalho em Minas Gerais, o procurador Geraldo Emediato de Souza declarou que o Brasil é um dos poucos países que possui Ministério do Trabalho e uma excelente legislação de prevenção, mas ressalvou que falta fiscalização eficiente do Estado. Já o vice-presidente da Força Sindical, Miguel Eduardo Torres, denunciou o desmantelamento do Ministério, que já ocorre, segundo ele, há mais de 20 anos. “Não se renova a contratação de fiscais nem existe infraestrutura de trabalho”, relatou. O deputado Geraldo Pimenta (PCdoB) disse acreditar no fortalecimento das centrais sindicais como uma saída para se construir relações de trabalho mais saudáveis.

Impeachment – Representantes de entidades falaram também sobre o processo de impeachment em curso contra a presidente Dilma Rousseff e destacaram denúncias da imprensa de que o vice-presidente Michel Temer e a Câmara dos Deputados priorizariam medidas de flexibilização das leis trabalhistas em caso de afastamento da presidente.

O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Ronald Ferreira dos Santos, falou das ameaças a conquistas históricas nas áreas da saúde e educação e pediu que os trabalhadores se mobilizem contra essas medidas. O superintendente Ubirajara frisou que, atualmente, mais de 50 projetos que alteram a legislação trabalhista tramitam no Congresso, muitos focados na terceirização. “O que vai ser dos trabalhadores nessas condições? Dos 14 mortos, 13 eram terceirizados pela Samarco. A Justiça vai ser ainda mais acionada do que é hoje”, declarou o superintendente.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Pesada de Minas Gerais (Siticop), José Antônio da Cruz, conclamou a população a “agir contra esse pacto de impunidade”. E a presidente da CUT, Beatriz Cerqueira, pediu união contra a nova administração. “Apesar dos pontos de divergência, precisamos nos mobilizar. Podemos achar que isso não tem nada a ver com a gente, mas impactará a todos nós. Precisamos resistir ao golpe em curso no nosso País”, convocou.

Consulte o resultado da reunião.