A ditadura militar iniciada há 52 anos e suas consequências foi o tema debatido em audiência da Comissão de Direitos Humanos
Segundo os deputados presentes, o discurso em 1964 era igual ao atual, de arrumar o processo político

Comissão se mobiliza contra impeachment de Dilma

Deputados e convidados de reunião comparam o pedido de impeachment contra a presidente com o golpe militar de 1964.

31/03/2016 - 19:49

Durante audiência pública convocada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quinta-feira (31/3/16), deputados e convidados compararam o pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, em tramitação no Congresso, com o golpe militar ocorrido em 1964. A ditadura militar iniciada há 52 anos e suas consequências foi o tema escolhido para a reunião, que contou com a participação de militantes de esquerda que foram torturados pela repressão.

Os deputados estaduais abriram a reunião criticando e classificando como um “golpe civil” o pedido de impeachment. “Em 1964, o discurso era o mesmo, de que não era um golpe, era apenas arrumar o processo político da época, de crises”, afirmou o deputado Rogério Correia (PT). O deputado Cristiano Silveira (PT), presidente da comissão, lembrou o caráter autoritário de muitos dos que defendem o impeachment. “Aqueles que criticam a presidente o fazem, muitas vezes, porque ela lutou contra a ditadura”, disse.

Já o deputado Professor Neivaldo (PT) lembrou que muitos dos agentes e das justificativas do golpe militar se repetem hoje. Ele listou a Rede Globo, outros grandes meios de comunicação, o poder econômico nacional e internacional e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) como aliados do golpe. “O discurso usado em 1964, contra a corrupção, também é usado hoje”, lembrou. A deputada Marília Campos (PT) também acompanhou a reunião.

Um dos depoimentos marcantes da reunião foi o do ex-militante Sálvio Humberto Penna, que foi torturado durante a ditadura, assim como sua esposa, que havia acabado de ter um filho. “Meu filho foi preso aos cinco dias de nascido. Isso tem que ser denunciado mil vezes, porque há jovens que ainda defendem a volta do regime militar”, afirmou Penna. O procurador de Justiça Afonso Henrique de Miranda Teixeira, que também participou da reunião, confirmou a atualidade da discussão. “Recentemente, houve crianças de famílias sem terra presas nesse País”, disse o representante do Ministério Público.

Uma das principais cobranças dos participantes da audiência pública foi pela chamada justiça de transição, que construa uma memória dos abusos cometidos no passado, promova a reparação dos danos e reforme as instituições que ainda hoje cometam violências contra o exercício da cidadania, principalmente as forças de segurança. Foi o que defendeu o professor de Ciência Política Juarez Guimarães, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que é ainda membro do Conselho Curador do Memorial Nacional da Anistia.

Comissão da Verdade cobra apoio

Coordenadora da Comissão da Verdade de Minas Gerais, criada para apurar os crimes cometidos pela ditadura no Estado, Maria Ceres Pimenta Spínola de Castro pediu o apoio financeiro do Governo do Estado e a ajuda da ALMG para que o trabalho possa ser concluído. Também disse ser indispensável um esforço para a conscientização popular. “Mais do que fazer discursos inflamados, temos que conversar com a população”, afirmou Ceres, também ela uma ex-prisioneira política.

As principais críticas ao papel do Judiciário e da OAB na atual disputa política vieram de dois advogados presentes na reunião. Presidente do Sindicato dos Advogados de Minas Gerais, Vinícius Nonato afirmou que o juiz Sérgio Moro, que conduz a operação Lava Jato, adota instrumentos autoritários típicos do regime militar, tais como a condução coercitiva e confissões obtidas com prisões sem justificativa. Ele condenou sobretudo a escuta telefônica de 25 advogados, autorizada pelo juiz, e cobrou a ação da OAB para proteger as prerrogativas da categoria e o direito de ampla defesa.

Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB mineira, Daniel Deslandes disse que o órgão é contrário ao posicionamento da OAB nacional, que entrou com um novo pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, com base em escutas telefônicas publicizadas pelo juiz Moro. “Como conversa de advogados com clientes pode fundamentar um processo de impeachment proposto pela OAB? Que mundo é esse?”, questionou Deslandes.

Além da conscientização da sociedade, também ações mais duras foram defendidas durante a reunião desta quinta, com o objetivo de condenar o autoritarismo. “Estou cansado de ver pessoas defendendo a volta da ditadura militar. Isso é crime”, afirmou Betinho Duarte, membro da Rede em Defesa da Humanidade – Capítulo Brasil. Ele incentivou que manifestações desse tipo sejam gravadas e denunciadas à Justiça.

A respeito da corrupção, Betinho afirmou que mais de 15 grandes casos de corrupção aconteceram durante a ditadura, envolvendo projetos como a construção da Ponte Rio-Niterói, da Transamazônica e da Usina Nuclear de Angra dos Reis (RJ).

Ele também apontou a atuação da Rede Globo como a grande catalisadora da crise política e econômica. “Você já acorda de manhã com a Rede Globo gritando: bom dia, crise!”, exclamou. Uma ação contra a Globo foi defendida pelo procurador Afonso Henrique Teixeira: “Não adianta gritar nas ruas se não enfrentarmos esse câncer brasileiro. A Constituição proíbe que o sistema de comunicação seja controlado por oligopólios”, afirmou o integrante do Ministério Público.

Consulte o resultado da reunião.