Comissão de Saúde debateu as políticas públicas que contemplem crianças com TDAH e o consumo de medicamentos para tratamento desse transtorno
Deputados falaram da importância de criar ações interdisciplinares entre a educação e a saúde no Estado

Pacientes com TDAH pedem políticas públicas específicas

Em debate sobre Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, entidades cobram equipes multidisciplinares no SUS.

14/10/2015 - 19:57

Representantes de entidades e pacientes criticaram, na tarde desta quarta-feira (14/10/15), a falta de políticas públicas direcionadas para pessoas com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). O tema foi abordado durante audiência pública da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

O TDAH é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece ainda na infância e acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade. De acordo com Odília Lima, que tem TDAH e é mãe de uma criança que também tem o transtorno, a falta de tratamento adequado acarreta em ansiedade, depressão, além de problemas educacionais, tendo em vista a falta de compreensão de limites por parte das crianças.

“O tratamento e diagnóstico é fundamental desde muito cedo para não precisarmos sofrer a vida toda. As pessoas não acreditam no transtorno, chamam de preguiça, de desatenção. Há muito preconceito. Esse mês já gastei R$ 800 de farmácia, dos R$ 1.500 que recebo, comigo e com meu filho. O apoio que recebemos é muito pouco”, lamenta Odília Lima.

Representando a Associação Mineira de Psiquiatria (AMP), o psiquiatra Antônio Marcos Alvim Soares ressaltou que quase cinco milhões de brasileiros sofrem com o transtorno, sendo que apenas 16% dos pacientes recebem o tratamento adequado, devido a diversos fatores, especialmente o diagnóstico incorreto. Segundo ele, o mesmo acontece em outros países. “Existe um preconceito enorme contra o transtorno mental. Os pacientes sofrem com uma doença grave e não permitimos que sejam atendidos adequadamente. Abandono escolar, acidentes, uso de drogas, depressão, suicídio, todos são consequências da falta de tratamento”, apontou.

Sofrimento - Autor do requerimento para a realização da reunião, o deputado Fred Costa (PEN) ponderou que o desconhecimento, e o não acesso ao tratamento, inviável a boa parte da população, faz com que muitos pacientes de TDAH sofram e, por consequência, suas famílias percam qualidade de vida. “A política de profilaxia, diagnóstico e tratamento contínuo do transtorno não fazem parte da política pública de Estado, o que é um absurdo”, criticou.

O deputado Ricardo Faria (PCdoB) sugeriu que o Estado inclua o tratamento e atendimento necessários a esses pacientes nos Centros Especializados em Reabilitação 4 (CER 4), para que fiquem acessíveis à população. “Construir protocolos assistenciais nesses locais é muito necessário. E proponho também ações interdisciplinares entre a educação e a saúde do Estado, tendo em vista que o transtorno precisa ser atendido, também de forma diferenciada, nas escolas. Um projeto político e pedagógico precisava ser construído em conjunto”, avaliou.

O deputado Geraldo Pimenta (PCdoB) ponderou que muitas das dificuldades desses pacientes estão relacionadas ao subfinanciamento do SUS. “O SUS é um jovem de 25 anos que está sendo construído, tem mostrado que funciona e tem que avançar”, ponderou.

A médica da Unidade Regional de Saúde Campos Sales, em Belo Horizonte, Andréia Lara, apoiou a ideia de usar o CER 4 para atendimento dos pacientes com o transtorno. Além disso, frisou a necessidade de equipes multidisciplinares para atender os pacientes. “O problema é crônico e perpassa a vida de quem tem TDAH e de suas famílias. Então não é um problema só da saúde e só de remédio”, disse.

Atendimento carece de capacitação para diagnóstico preciso

A neurologista do Hospital Psiquiátrico da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), Monalisa Trindade, ressaltou a dificuldade de se obter um diagnóstico preciso do TDAH e, por isso, ser necessária uma equipe de atendimento bem preparada e multidisciplinar. “Não é só Ritalina, mas terapia, reabilitação, ajuda para que essas pessoas recuperem o tempo perdido e aproveitem o seu potencial. E eu acredito que os pacientes de BH conseguem, de uma forma ou outra, acesso, enquanto que no interior do Estado eu não vejo isso acontecer”, lembrou.

O presidente da Comissão de Saúde, deputado Arlen Santiago (PTB), disse ser necessário construir um documento para ser entregue ao Estado com uma lista dos profissionais adequados e os remédios necessários de serem disponibilizados, com o objetivo de que um melhor atendimento possa ser disponibilizado aos pacientes com TDAH. “Sabemos que a Fhemig está numa situação muito ruim e por isso imagino que o Governo não faça nem ideia do que essas pessoas precisem”, afirmou.

Membro da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia (SBNP), Danielle de Souza Costa ressaltou a importância da capacitação dos profissionais e do diagnóstico precoce para se evitar o prejuízo provocado pela falta de tratamento. A presidente da Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil/Sede Minas Gerais, Ana Christina Mageste Pimentel, apoiou a fala da colega e frisou que, muitas vezes, a doença, em si, não é tratada, mas apenas as suas consequências.

Polêmica – O coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde da Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, Gilmar de Assis, disse acreditar que a política pública para atender aos pacientes exista, mas seja insuficiente ou precise ser aprimorada. “Dentro dos países da América, o Brasil é único que tem sistema de saúde universal, que reconhece o direito de todos de receberem assistência de saúde”, disse. Ele sugeriu também que os profissionais do Programa Saúde da Família sejam treinados a fazerem avaliações precoces de casos de TDAH.

No entanto, o procurador causou polêmica entre os presentes ao posicionar-se contrariamente ao “uso indiscriminado da Ritalina”, remédio imprescindível no tratamento dos pacientes e que tem sido usada por estudantes para obterem melhor rendimento escolar. O psiquiatra Antônio Soares falou que existe um posicionamento essencialmente ideológico contra o remédio, sem maiores estudos científicos sobre o assunto. “Eu daria Ritalina para a minha filha, mesmo com um diagnóstico impreciso, mas não tenho coragem de dar Tylenol. E Tylenol você consegue comprar livremente em qualquer farmácia”, comparou. Além disso, ele destacou o fato de que apenas 16% dos pacientes recebem o tratamento adequado. “Que uso indiscriminado é esse?”, questionou.

A coordenadora do Núcleo de Investigação dos Transtornos da Impulsividade e da Atenção (Nitida) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professora doutora Débora Marques de Miranda, frisou que, enquanto pessoas das camadas mais ricas da população usam o remédio sem prescrição médica, os pacientes mais pobres sofrem com a falta do diagnóstico correto e do acesso aos remédios. “Muitos médicos operam o apêndice sem nem ter certeza se o paciente está com apendicite. Como vamos deixar de oferecer um remédio porque existe a possibilidade de abuso dele? Não podemos deixar nossos pacientes desassistidos, temos é de trabalhar para que o abuso não aconteça”, defendeu.

Consulte o resultado da reunião.