Comissão de Saúde debateu os impactos do programa de prevenção ao câncer de mama realizado pela Secretaria de Saúde, e o Projeto de Lei 2.876/15
Clécio Lucena criticou políticas que focam exames diagnósticos da doença em mulheres a partir dos 50 anos
Márcia Dayrell (à esquerda) falou sobre plano que diagnosticou os serviços prestados pelo governo na oncologia

Detecção do câncer de mama evolui, mas tratamento é falho

Autoridades, gestores do SUS e pacientes analisam programas de prevenção desse mal e também do câncer infantojuvenil.

30/09/2015 - 22:29

Apesar de o Estado de Minas Gerais ter avançado muito com a criação do programa de prevenção ao câncer de mama, falta ainda evoluir nos procedimentos de rastreamento da doença e também de seu tratamento. Essa foi a principal mensagem da audiência pública que a Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou nesta quarta-feira (30/9/15).

Solicitada pelos deputados Arlen Santiago (PTB), presidente da comissão, e Felipe Atiê (PP), a reunião abordou os impactos do programa estadual feito em parceria com a Sociedade Brasileira de Mastologia e o Projeto de Lei (PL) 2.876/15, do deputado Felipe Attiê, que cria o Programa de Prevenção e Combate ao Câncer Infantojuvenil (Novembro Dourado).

O presidente regional da Sociedade Brasileira de Mastologia, Clécio Ênio Murta de Lucena, mostrou-se preocupado com as etapas que sucedem o diagnóstico do câncer de mama. “Não adianta diagnosticar precocemente se o tratamento não for adequado”, afirmou. Ele lembrou que em muitos diagnósticos, as situações clínicas são similares, mas a evolução da doença é totalmente diferente. “Temos casos de evolução catastrófica do câncer de mama”, afirmou.

Nesse sentido, ele defendeu a realização do Outubro Rosa, campanha mundial que alerta para a importância do diagnóstico precoce como meio de antecipar o tratamento e a cura do câncer de mama. “Só com o diagnóstico precoce vamos ter mutilação menor das mulheres e uma cura mais fácil e a um custo menor”, enfatizou.

Ampliação dos programas - Clécio Lucena também criticou as políticas governamentais que focam os exames diagnósticos da doença somente nas mulheres a partir dos 50 anos. “Um terço das pacientes vitimadas pelo câncer de mama morrem antes dos 50 anos. Outras 40% diagnosticadas com o mal estão com mais de 60 anos. E o tratamento desses públicos está sendo restringido”, disse. Por isso, ele defendeu a ampliação dos programas de rastreamento do câncer de mama para todas as faixas necessárias.

A coordenadora de Atenção à Saúde da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Ana Maria Cardoso, refletiu que um bom programa de rastreamento demanda uma série de exames complementares e biópsias, e que o governo evoluiu pouco na organização da rede, o que torna demorado o atendimento. “A rede não está pronta nem madura, apesar de estarmos melhores no rastreamento. Mas será que o diagnóstico e o tratamento são rápidos e adequados o suficiente?”, questionou.

Ana Maria Cardoso, por outro lado, avalia que a cobertura desses serviços melhorou, mas há ainda muito para se aperfeiçoar. “Temos muitos municípios pequenos, em que o acesso ao atendimento é muito difícil. Minas Gerais tem uma grande diversidade e temos que pensar na melhor forma de atender a população em cada realidade”, concluiu.

Secretaria de Saúde analisou atendimento oncológico

Falando em nome da SES, Márcia Dayrell, coordenadora da Rede de Atenção às Doenças Crônicas, destacou que foi elaborado no primeiro semestre de 2015 um plano que traçou um diagnóstico dos serviços prestados pelo governo na área oncológica. O foco foi nas unidades que prestam os serviços de atendimento oncológico: as Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacom) e os Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon). Segundo ela, um dos principais problemas detectados diz respeito ao fluxo desordenado dos serviços.

Um fator que dificulta o diagnóstico mais preciso, de acordo com Márcia Dayrell, é a ausência de dados seguros dos atendimentos de média complexidade. “Dos 66 consórcios de saúde existentes no Estado, apenas seis informaram o que realizam de consultas e exames. Esse ainda é um ponto obscuro”, reconheceu.

Apesar desse gargalo, a SES estabeleceu 21 territórios no Estado, com previsão de atingimento de metas exequíveis para cada um. Ainda de acordo com Márcia Dayrell, foram detectados problemas envolvendo o financiamento dos atendimentos. Agora, segundo a gestora, foram criadas duas comissões que estão trabalhando para definir quem precisa de recursos e de quanto precisa. Outra frente de trabalho, que tratou dos serviços de hematologia, verificou a grande concentração de atendimento nessa área na Capital.

Uma das conclusões desse trabalho é de que, nos tipos mais comuns de câncer, como os de mama e de próstata, os hospitais deverão ser responsáveis pelas cirurgias nas suas regiões de atuação. Já em se tratando dos tipos menos comuns da doença, como os de cabeça e pescoço e leucemia, haverá alguns hospitais de referência no Estado. “Vamos trabalhar com a perspectiva de ampliação da assistência oncológica de modo geral”, afirmou a representante da SES.

Contraponto – Wagner Antônio Paz, coordenador dos serviços em oncologia dos Hospitais Alberto Cavalcanti e Luxemburgo, na Capital, fez um contraponto às falas oficiais. Ele disse que, além da mamografia, que mostra apenas a imagem, é necessário o exame físico, feito por um médico. Essa segunda parte do atendimento, segundo ele, não vem sendo feita a contento. “Como os níveis de atendimento primário e secundário falham, o tratamento terciário é comprometido”, disse.

Todas essas dificuldades seriam provocadas, na avaliação dele, pela desorganização do Sistema Único de Saúde (SUS). “Quando troca o governador, trocam os gestores. Não consigo construir nada porque está sempre mudando”, reclamou. Para Wagner Paz, o Estado deveria usar sua rede de hospitais dentro de uma política pública de saúde. Além disso, ele defendeu que os gestores, ao elaborarem os planos, deveriam ouvir os profissionais que atuam em cada área.

Já Carlos Eduardo Ferreira, assessor científico do Instituto Mário Penna, sugeriu a estadualização da gestão da oncologia. “Poderia ser criada uma autarquia responsável pela política da oncologia, em vez de políticos gerindo a área”, propôs. Ele citou um trabalho científico no qual são entrevistados os 15 maiores administradores do setor de saúde no mundo. Eles foram ouvidos para elencar três pontos que julgavam necessários para garantir a sustentabilidade do setor de saúde e elegeram: a parceria médico-hospital; o fim da remuneração por procedimento; e as alianças estratégicas.

Pacientes de câncer de mama dão seu depoimento

A diretora administrativa do Instituto Mário Penna, Maria Ângela Ferraz Mosqueira, defendeu que, além de dar um tratamento médico adequado aos pacientes com câncer, é necessária “a delicadeza no cuidar”. Ela convidou duas pacientes do Mário Penna para darem seus depoimentos.

Helenice Medeiros, paciente de câncer em tratamento, de 42 anos, está na oitava sessão de quimioterapia e vai iniciar a radioterapia em breve. Ela afirmou que, quando descobriu a doença, estava com a mamografia em dia. “Sou uma mulher que se ama e que vê sua beleza além da careca, que já assumi. O câncer tem tratamento e isso faz com que nós tenhamos a consciência e o dever de nos cuidarmos” disse.

Márcia Daniela Baracat, ex-paciente de câncer de mama do Hospital Luxemburgo, valorizou o movimento Outubro Rosa. “O maior objetivo dessa campanha é estimular que as mulheres façam o diagnóstico precoce, por meio da mamografia”, disse.

Deputados defendem diagnóstico precoce da doença

O deputado Arlen Santiago apresentou alguns números sobre a evolução do câncer. No mundo, segundo ele, foram detectados 14,1 milhões de casos, com 9 milhões de mortes. A perspectiva é de que em 2030, serão 21 milhões de pessoas com esse mal. No Brasil, em 2014, houve 580 mil casos de câncer, principalmente, de mama, que é o principal causador de mortes de mulheres no mundo (2 milhões de casos).

Ele defendeu que propostas para o controle do câncer de mama deverão priorizar três pontos: um programa de diagnóstico e controle da doença, com ampliação da faixa etária a quem ele se destina; a facilitação do acesso à mamografia; e a agilização do diagnóstico.

O parlamentar lembrou que a gestão anterior do Estado comprou em 2014 unidades móveis de saúde para realizar mamografias e diagnóstico precoce do câncer de mama. Com isso, 750 mil mulheres fizeram mamografia naquele ano. Um dos pontos que facilitou esse trabalho, segundo ele, foi a dispensa da consulta com um médico. “Qualquer mulher podia pedir a mamografia em uma unidade de saúde. Em locais onde isso não era possível, a unidade móvel ia até lá”, elogiou.

Dispensa de consulta - Cibele Leal de Carvalho, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM-MG), divergiu quanto a esse último ponto. “Acho complicado fazer uma mamografia solta, sem um profissional acompanhando. Será que estamos resolvendo o problema da paciente?”, questionou. Ela relatou que pacientes atendidos pela unidade móvel apresentaram exames sem qualidade de imagem.

O deputado Doutor Wilson Batista (PSD) avaliou que a principal ferramenta da medicina hoje no enfrentamento ao câncer é o diagnóstico inicial. “Mais de 80% dos tumores são curados, desde que sejam detectados no estágio inicial. Após a doença se instalar, o tratamento é muito mais doloroso e difícil”, constatou. Nesse aspecto, ele lembrou o Projeto de Lei (PL) 367/15, de sua autoria, que prevê que qualquer paciente com suspeita de câncer possa fazer os exames necessários em, no máximo, 30 dias. Mas ele reconheceu que ainda falta muito para que o paciente tenha um atendimento adequado no País. “A fila para uma série de exames é imensa”, refletiu.

Já o deputado Carlos Pimenta (PDT) lembrou a Lei 11.868, de 1995, oriunda de um projeto de sua autoria, que trata da prevenção e tratamento do câncer de mama. “Fico feliz de ter sido pioneiro, pois a partir daí, avançamos muito no combate ao câncer. A mulher hoje tem como prevenir melhor essa doença”, disse.

Novembro Dourado - O deputado Felipe Atiê abordou o PL 2.876/15, de sua autoria, que propõe que o Estado promova campanhas publicitárias para conscientizar a população sobre o câncer infantojuvenil. O projeto também prevê a realização de mutirões médicos periódicos, com realização de exames de sangue gratuitos para detecção de leucemia em crianças e jovens. De acordo com o parlamentar, a intenção é chamar atenção para a importância da prevenção.

O deputado ainda reivindicou a ampliação do Hospital do Câncer de Uberlândia (Triângulo Mineiro). Segundo ele, tem-se observado o crescimento dos casos de câncer juvenil, especialmente de leucemia. “Se for diagnosticado precocemente, chega-se a 80% de cura. Por isso, precisamos do diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil”, declarou. Ele defendeu ainda a utilização mais frequente da medicina preventiva.

Consulte o resultado da reunião.