Usuários, dirigentes, funcionários e familiares lotaram o Auditório para pedir a intervenção dos deputados para solucionar o problema
Relatos emocionados em defesa das comunidades terapêuticas se sucederam na reunião

Comunidades terapêuticas cobram recursos do governo

Entidades reclamam do atraso nos repasses de verbas estaduais para a sua manutenção.

17/03/2015 - 18:47

O atraso no repasse de verbas a comunidades terapêuticas foi debatido nesta terça-feira (17/3/15) em reunião da Comissão de Combate e Prevenção ao Uso do Crack e Outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Usuários, dirigentes, funcionários e familiares lotaram o Auditório da ALMG para pedir a intervenção dos deputados para solucionar o problema, já que o atraso nos pagamentos estaria inviabilizando o funcionamento dessas instituições.

As verbas são repassadas por meio de convênios celebrados na chamada rede complementar, com 28 entidades que recebem verbas federais e estaduais, e ainda por meio do cartão Aliança pela Vida, com 77 entidades que recebem repasses estaduais. Em cada entidade são cerca de 15 vagas nesses dois programas, envolvendo 12 mil famílias, com repasse aproximado de R$ 1 mil mensais por usuário.

Como algumas entidades não recebem desde dezembro e outras desde janeiro, não há uma estimativa do valor total de pagamentos atrasados, mas a cifra já é milionária. A informação é de que o atraso na aprovação do Orçamento do Estado teria dificultado os repasses, já que o Executivo é responsável por gerenciar todos os pagamentos.

O presidente da comissão, deputado Antônio Jorge (PPS), cobrou a retomada imediata dos repasses por parte do Executivo, lembrando as verbas do duodécimo orçamentário. "Falta de dinheiro não é justificativa para um descompromisso com as comunidades terapêuticas. Cabe ao Legislativo cobrar. Mas precisamos trabalhar para aproximar a realidade das comunidades terapêuticas da sociedade. Só assim vamos conseguir mais eficiência ao lidar com esse problema complexo que é o enfrentamento das drogas”, afirmou. Dentro desse esforço, segundo ele, a ALMG tem dado sua contribuição, seja pelo trabalho da comissão ou por iniciativas como as marchas contra o crack, que devem ser retomadas em breve.

O vice-presidente da comissão, Missionário Márcio Santiago (PTB), fez um apelo ao bom senso de todos. “Não estamos falando de dinheiro para obras, mas para salvar vidas. Questões políticas não podem atrapalhar esse trabalho”, criticou. Na mesma linha, o deputado Felipe Attiê (PP) cobrou uma votação rápida do Orçamento 2015, de modo a agilizar o pagamento dos repasses atrasados. “Toda uma família desaba quando tem um filho envolvido no mundo das drogas”, lembrou.

Convocação - O deputado Léo Portela (PR) convocou os colegas de comissão a aprovar, dentro das possibilidades do Regimento Interno, a convocação do secretário de Estado da Saúde para dar explicações na ALMG. “Em questões assim, não tenho compromisso com o governo. Meu compromisso é com as famílias e a luta pela vida”, destacou, lembrando que as entidades estão enfrentando dificuldades para arcar com impostos e folha de pagamento dos funcionários e podem ser duplamente penalizadas por isso.

Já o deputado Noraldino Júnior (PSC) lembrou que as comunidades terapêuticas fazem um trabalho que, na prática, seria atribuição do governo e por isso merecem todo apoio possível.

“Diante de tamanha demonstração de amor, não podemos nos calar. Temos que dar voz a quem precisa e mostrar a nossa indignação”, afirmou a deputada Ione Pinheiro (DEM). O deputado João Leite (PSDB) relatou o drama de um familiar que se recuperou em uma comunidade terapêutica, reforçando que, independentemente de partidos, a Assembleia vai apoiar a causa. Por fim, o deputado Duarte Bechir (PSD) também cobrou explicações da Secretaria de Estado de Saúde.

Atrasos são a regra, apesar da eficiência do trabalho

O presidente da Federação de Comunidades Terapêuticas Evangélicas do Brasil (Feteb), pastor Wellington Antônio Vieira, em tom de desabafo, revelou que as comunidades terapêuticas já estão acostumadas com os atrasos nos repasses financeiros, mas a situação atual já foge do controle, segundo ele.

Segundo Wellington Vieira, todas elas dependem dos recursos estaduais e federais, tendo em vista que a maioria das famílias dos pacientes atendidos não contribuem com as despesas. “As entidades já estão sofrendo com cortes na energia elétrica, multas, juros e até com ações de despejo. As entidades não podem pagar pela irresponsabilidade do governo”, denunciou.

Os relatos emocionados em defesa das comunidades terapêuticas se sucederam na reunião, sempre acompanhados de muitos aplausos. “Toda pessoa é sempre maior do que as maiores bobagens que já fez na vida, e por isso merecem uma chance”, apontou o psicólogo João Francisco de Souza. “Somos acusados de sermos manicômios, mas, se fôssemos, muitas pessoas em tratamento não estariam aqui exercendo a sua cidadania”, completou Ronaldo Guilherme Vitelli Viana, dirigente da entidade Terra da Sobriedade.

Dignidade - “Sou um ex-viciado. Estava doente e consegui me curar. Hoje sou casado e pai de três filhos. O trabalho das comunidades terapêuticas é um resgate de vidas”, afirmou Almir Alves dos Santos, coordenador da entidade Casa Azul. Em uma cadeira de rodas, Romney Elberth Vieira dos Santos diz que perdeu as pernas por causa dos vícios. “Mas primeiro perdi a dignidade por causa do crack. Não sei o que faria se não estivesse na Casa Azul. Nem minha família acreditava que pudesse me recuperar”, contou.

“Os depoimentos dados aqui indicam que o tratamento funciona, que a recuperação é possível. Mas os profissionais que trabalham nas entidades, apesar de todo o amor que dedicam, precisam ser pagos. O poder público traz o dependente e nós que encontremos um jeito de cuidar dele?”, indagou Élder Marcelo Pádula, do Centro de Recuperação Gileade.

Consulte o resultado da reunião.