Moradores de Buritis pedem socorro para o Rio Urucuia
Em audiência pública, foram denunciadas barragens ilegais que estariam comprometendo o afluente do Rio São Francisco.
12/11/2014 - 14:05 - Atualizado em 12/11/2014 - 16:49A construção ilegal de barragens para alimentar pivôs de irrigação em Buritis (Noroeste de Minas) está destruindo áreas de preservação permanentes (APAs), secando córregos e provocando o desaparecimento de espécies da fauna e da flora. A denúncia foi apresentada nesta quarta-feira (12/11/14) em audiência pública no município realizada pelo Comitê de Defesa da Bacia do Rio Urucuia (Comdru). A reunião foi acompanhada pelos deputados Almir Paraca e Rogério Correia, ambos do PT, que representaram a Comissão Extraordinária das Águas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
De acordo com a presidente do Comdru, Débora Firmino, as barragens ilegais estão comprometendo inclusive o abastecimento de água para consumo humano na região. Segundo ela, quatro córregos e três cachoeiras já estão praticamente secos em função da redução do volume de água do principal rio da cidade, o Urucuia. Além disso, já não são mais encontradas na região muitas espécies de animais, como tamanduá-bandeira, tatu, mutum, jacu, traíra, piau e mandi. “Até piabas e lambaris já desapareceram de nossos mananciais”, denunciou a ambientalista. O Rio Urucuia, que nasce em Formosa (GO) e passa por oito cidades mineiras, é um dos principais afluentes do São Francisco.
Débora Firmino afirmou que a água utilizada para a irrigação está consumindo um volume suficiente para abastecer “uma população equivalente a três Belo Horizontes”. Ela lamentou que a situação não seja consequência de falta de chuvas nem de mudanças climáticas. “É a ação do homem”, garantiu.
Soja – O representante do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Econômico (Ibradec), Rubens Martins, advertiu para o problema da produção de soja, principal produto agrícola de Buritis, que consome 1,8 mil litros de água para cada quilo cultivado do grão. Segundo ele, toda a soja produzida é exportada para Europa e China, sem gerar riqueza para a região. “Cada navio de soja exportado corresponde a 1,8 mil navios de água limpa que vão embora”, comparou. Rubens Martins considera que não se gera riquezas com o desaparecimento de rios, represando nascentes ou matando pessoas e animais.
O procurador de Justiça Afonso Henrique de Miranda Teixeira estimulou os participantes da reunião a lutar pela reforma agrária, que, em sua opinião, é fundamental para conter esse tipo de destruição. “O Governo Federal tem que partir para o enfrentamento do latifúndio, considerando-o propriedade ilícita”, defendeu. Ele se disse envergonhado com a situação e culpou todas as esferas de poder pela omissão e as forças de direita como responsáveis.
Produtor rural defende construção de barragens
O representante do Sindicato dos Produtores Rurais de Buritis e região, Carlos Alberto de Oliveira, defendeu a construção das barragens e minimizou a responsabilidade dos produtores rurais. Segundo ele, as barragens são licenciadas e foram construídas segundo orientações técnicas e científicas. “A barragem é um procedimento rural importante, interessante e necessário para a reserva de águas”, defendeu.
Oliveira afirmou que a falta de chuvas é um fator crítico para a situação atual de Buritis e ressalvou que a política agrícola é comandada pelos Governos Federal e Estadual. “Se caminharmos acreditando que o único responsável por tudo isso é o produtor rural, estaremos cometendo um grande erro”, enfatizou.
Deputado denuncia infração da lei
O presidente da Comissão das Águas, deputado Almir Paraca, denunciou que grandes produtores rurais de Buritis estão burlando a legislação ambiental para construir as barragens que estão acabando com a água no município. Segundo ele, os empreendedores pedem o licenciamento e, ao mesmo tempo, entram com liminares na Justiça para assegurar a construção das barragens.
“Como o Estado está desaparelhado, não consegue acompanhar o processo e as barragens são construídas de qualquer jeito”, acusou o parlamentar. O deputado também atentou para o fato de o município possuir dois comitês de bacias: o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Urucuaia (CBH) e o Comdru. Ele estranhou a situação, mas constatou que isso prova que o primeiro não tem atendido às necessidades da região. “O CBH não está fazendo a defesa adequada do Rio Urucuia”, criticou. Ele lembrou que o comitê de bacia é o foro para discussões e decisões sobre os problemas do Rio Urucuia, e sugeriu que os participantes da audiência façam pressão para que o CBH assuma esse papel.
O deputado Almir Paraca também reclamou que as outorgas (autorizações para uso da água) estão sendo concedidas apenas para produtores com dinheiro e grandes extensões de terra, que têm condições econômicas de investir nesses processos. De acordo com ele, os pequenos produtores, os agricultores familiares e os assentados da reforma agrária não conseguem essas outorgas. “A continuar assim, quando eles tiverem condições, não haverá mais outorga para ser concedida”, advertiu.
O deputado Rogério Correia anunciou que o governador eleito Fernando Pimentel já se comprometeu a cuidar, pessoalmente, da questão das águas. Ele ressalvou que o novo governo está recebendo o Estado com uma dívida de R$ 102 bilhões e um déficit social de grande dimensão. “Não é possível chegar a uma degradação dessas sem que a Secretaria de Meio Ambiente fizesse nada”, criticou.
Ele ainda reclamou que nada foi feito pelo atual Governo do Estado para a recuperação do Rio São Francisco, o que pode comprometer o projeto de transposição de suas águas. “Vamos ter que trabalhar com essa herança maldita”, alertou.
A visita a Buritis foi requerida pelo deputado Almir Paraca. A audiência pública foi acompanhada por aproximadamente 500 pessoas, que lotaram o Plenário da Câmara Municipal.