O deputado Dinis Pinheiro, que solicitou a homenagem, relembrou momentos importantes da vida e da atuação eclesiástica de Dom Paulo Evaristo Arns
Nelson Arns (centro) recebeu a homenagem em nome do tio

Dom Paulo Evaristo Arns é cidadão honorário de Minas Gerais

Recluso num convento, cardeal envia seu sobrinho, Nelson Arns, para receber homenagem na ALMG.

03/06/2014 - 22:23 - Atualizado em 04/06/2014 - 12:58

O arcebispo emérito de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns, foi homenageado com o título de cidadão honorário de Minas Gerais na noite desta terça-feira (3/6/14), em Reunião Especial de Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Como ele vive recluso em um convento em Taboão da Serra (SP), quem recebeu a homenagem foi seu sobrinho, Nelson Arns.

Para o presidente da ALMG, deputado Dinis Pinheiro (PP), que propôs a realização da homenagem, é preciso relembrar a importância das pessoas que resistiram ao regime militar no ano em que o golpe de 1964 completa 50 anos. “É importante reverenciar os que souberam resistir e contrapor-se ao obscurantismo”, disse.

Durante seu discurso, o deputado Dinis Pinheiro relembrou momentos importantes da vida e da atuação eclesiástica de Dom Paulo Evaristo Arns. Um deles foi a organização, em 1975, de uma celebração ecumênica em homenagem ao jornalista Wladimir Herzog, morto dias antes nas dependências do Doi/Codi paulista.

Apesar da pressão sofrida para não realizar a cerimônia e das barreiras policiais espalhadas pelo centro de São Paulo para dificultar que as pessoas chegassem à Catedral da Sé, a celebração foi considerada a maior concentração de massa acontecida durante o regime militar depois do Ato Institucional nº 5 (AI-5). Estima-se que cerca de 8 mil pessoas tenham participado da cerimônia.

O parlamentar comparou Dom Evaristo ao Papa Francisco ao dizer que ele, também franciscano, foi um dos homens da Igreja que mudaram os rumos da história. Ele lembrou, ainda, que a homenagem corrige uma “injustiça histórica”, já que o mesmo título foi proposto em 1979 e rejeitado pelo Plenário da ALMG.

Biografia - Dom Paulo Evaristo Arns nasceu em Forquilhinha (SC) em 1921. Construiu carreira religiosa e no magistério cristão e dedicou a vida a causas humanitárias. Em 1970, tornou-se arcebispo metropolitano de São Paulo, nomeado pelo Papa Paulo VI, e em 1973 tornou-se cardeal. Permaneceu na função até 1998, quando renunciou por limite de idade, como preveem as normas da Igreja Católica.

Lembrar sempre, para que não se repita

Ao receber a homenagem em nome do tio, Nelson Arns relembrou histórias que ratificam a imagem pública do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns. “Uma vez perguntei a ele por que escrever o relatório 'Tortura Nunca Mais'. Ele me disse que ele já tinha visto desaparecimentos e torturas antes, durante o regime de Getúlio Vargas, e me perguntou se eu sabia disso. Eu não sabia. E ele falou, então, que era por isso que estava escrevendo o relatório, para que as pessoas não se esquecessem”, contou.

Ele disse ainda que o relatório era baseado em depoimentos dados na Justiça e que Dom Evaristo precisava se mudar constantemente para que membros do regime não encontrassem as toneladas de papéis enviadas a ele por advogados de todo o País.

Esses advogados foram também elogiados no discurso de Nelson Arns. Ele lembrou que muitas pessoas ajudaram Dom Evaristo em sua luta, fazendo chegar até ele informações e fotos sobre torturas e assassinatos - algumas dessas pessoas eram militares do Exército que não concordavam com o que estava acontecendo.

Nelson Arns também falou da sutileza que Dom Evaristo tinha que ter para driblar a ditadura. Para exemplificar, lembrou um momento em que, durante a celebração de lava-pés em uma quinta-feira santa, ele escolheu lavar e beijar os pés dos garis de São Paulo. Os garis estavam em greve, o que era proibido pelo regime militar, e beijando seus pés Dom Evaristo teria, silenciosamente, expressado seu apoio a eles.

Para o sobrinho do cardeal, o mais importante da homenagem prestada pela ALMG é que a iniciativa ajude a fazer aquilo que sempre foi essencial para Dom Evaristo: manter viva a memória das torturas, desaparecimentos e assassinatos, para que esses eventos não voltem a se repetir no País.