Divinópolis reivindica recursos para atendimento às mulheres
Em audiência da Comissão Especial, autoridades cobram ampliação de delegacia e instalação de casa de passagem.
18/06/2012 - 18:36A falta de estrutura para o atendimento às mulheres foi a principal queixa apresentada pelos participantes da audiência realizada em Divinópolis (Centro-Oeste), nesta segunda-feira (18/6/12), pela Comissão Especial da Violência contra a Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Na cidade não há Juizado Especial para cuidar dos casos; não existem abrigos ou casa de passagem para as mulheres que buscam ajuda; faltam delegados, escrivães e investigadores, e a delegacia é considerada precária pelas autoridades que lidam com a violência doméstica.
A delegada Especializada de Orientação e Proteção à Família de Divinópolis, Maria Gorete Rios, que atende os casos de violência contra mulheres, responde também pela Delegacia do Idoso, atende o Juizado Especial da Criança e do Adolescente, cuida dos casos com menores infratores e até daqueles que envolvem precatórios. “Divinópolis é uma cidade que cresce a cada dia e a delegacia é acanhada para essa conjuntura”, lamenta, alegando, ainda, a falta de recursos humanos. Para ela, a audiência da comissão especial, mais do que conscientizar pessoas, deve conscientizar o Estado de que é preciso investir nessa área.
A delegacia tem um setor psicossocial que atende vítimas e agressores, incluindo as mulheres que não querem fazer uma representação. Mas lá também há falta de pessoal e o atendimento é garantido por voluntários, estagiários e uma psicóloga cedida pelo município. O juiz da 3ª Vara Criminal de Divinópolis, Dalton Soares Negrão, citou a Lei Maria da Penha e a exigência não cumprida de criação de juizados especiais para as mulheres. “A deficiência orçamentária da Secretaria de Defesa Social e do Tribunal de Justiça inviabiliza a plena efetividade da lei. Temos grande demanda e não há como atender”, aponta.
A criação do juizado especial e também o fortalecimento do setor psicossocial da delegacia de Divinópolis foram defendidos pelo promotor de Justiça Fábio Barbieri Caetano. Segundo ele, o atendimento às mulheres na cidade depende do “trabalho heróico” de delegados e outros profissionais. “Temos, hoje, o aumento do número de agressões cometidas pelos filhos, em decorrência do uso de drogas. Precisamos de um trabalho conjunto, em rede”, propôs.
Violência psicológica não é apurada
A coordenadora local da Defensoria Pública, Rita Fernandes da Silva, cobrou um espaço para proteção da mulher que denuncia um agressor. “Quando a mulher consegue dar o primeiro passo para buscar ajuda, ela precisa encontrar”, pregou, defendendo a instalação de uma casa de passagem ou abrigo. Rita enfatizou ainda a violência emocional, de apuração mais difícil, mas que merece atenção do poder público. A Defensoria, segundo ela, já tem instalações novas e adequadas, mas falta pessoal para o atendimento.
Já a coordenadora do Centro de Referência Especializado de Assistência Social de Divinópolis, Lucinda Basílo Vieira, relatou os serviços prestados no município e o atendimento de mais de 600 mulheres vítimas de violência nos últimos três anos. Para ela, é necessária uma articulação entre os serviços de atendimento, para evitar que a mulher tenha que relatar a violência sofrida várias vezes, na delegacia, diante do juiz, na Polícia Militar etc. “O serviço de saúde também tem que se preparar melhor para esse atendimento”, argumenta.
Ações – A coordenadora Especial de Políticas Públicas para Mulheres, Eliana Piola, admitiu que os desafios para o Estado são muitos, em função da realidade dos 853 municípios. “Não teremos 853 casas de passagem ou 853 delegacias especializadas. Mas o Estado não está de braços cruzados”, afirmou, lembrando que cada ampliação de estrutura implica aumento de custeio. Diagnóstico realizado em Minas apontou a necessidade de priorizar a capacitação para o atendimento às mulheres. “Temos feito, mas não na escala que gostaríamos”, afirmou Eliana.
Ela citou avanços na Polícia Militar, tradicionalmente machista, que já tem um serviço específico para as questões de gênero, com capacitação facultativa, apenas para policiais interessados. Por outro lado, a coordenadora lamentou a falta de dados confiáveis sobre a violência contra mulheres. Ainda segundo Eliana, a Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, da Presidência da República, vai criar uma matriz de formação a ser adotada no País. “Temos que otimizar os serviços. Esse é o desafio do gestor”, afirmou.
Vítima de violência relata dificuldades no atendimento
Ao final da reunião, a servidora pública Katiúscia Freitas, 35 anos, que foi vítima de torturas durante três anos de relacionamento, cobrou a capacitação imediata dos profissionais que fazem o atendimento às mulheres. “Isso não depende de plano nacional. É uma ação que pode ser feita agora!”, afirmou. Segundo ela, a própria Polícia Militar, primeiro contato da mulher agredida, humilha essa mulher ao questionar a continuidade do relacionamento. Katiúscia diz que também já deixou de procurar o atendimento médico, embora estivesse com lesões graves, para não ser humilhada. “Eles não entendem a dependência financeira e psicológica”, aponta.
O deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), presidente da comissão, falou sobre o objetivo dos trabalhos, de colher um diagnóstico no Estado. “Já ouvimos muitas pessoas e instituições e estamos apreensivos. Só em 2011, quatro mil mulheres foram assassinadas no País”, salientou. O parlamentar lembrou a importância da escola e do professor, muitas vezes o primeiro a ouvir a queixa de agressão. Numa homenagem às mulheres presentes, ele passou a presidência da reunião para a deputada Luzia Ferreira (PPS), relatora da comissão e autora do requerimento para a audiência em Divinópolis.
Luzia reiterou que o olhar do interior é importante para que o relatório dos trabalho retrate todo o Estado. “Divinópolis pode ser uma referência para toda a região”, argumentou. Segundo ela, o movimento das mulheres vem vencendo o desafio de fazer com que as questões de gênero sejam encaradas como um problema de toda a sociedade. “Estamos tratando o desigual de forma desigual para criar igualdade”, resumiu. A deputada ressaltou, porém, que a violência persiste, apesar de a mulher ser mais escolarizada e já ocupar 48% dos postos de trabalho. A decisão do INSS de cobrar dos agressores as despesas com mulheres violentadas ou assassinadas também foi citada por Luzia Ferreira.
Já Maria Tereza Lara (PT) parabenizou a servidora Katiúscia pela coragem de relatar a violência sofrida e lembrou que a partilha desse sofrimento é um passo importante. A parlamentar acredita que somente a educação pode mudar a mentalidade machista. “As mulheres sem representação nos espaços de poder também é uma forma de violência”, salientou. O deputado Fabiano Tolentino (PSD) garantiu que a comissão vai levar adiante as ações, a partir da escuta dos problemas, para minimizar o sofrimento das mulheres que vivem sob ameaça ou são vítimas de violência.