Trabalhadores vítimas de inseticidas querem reparação
Deputados ouviram, de servidores da extinta Sucam, relatos de intoxicações por venenos usados no combate a endemias.
06/06/2012 - 13:07A necessidade de implantação de políticas públicas de proteção à saúde dos trabalhadores foi defendida por servidores, sindicalistas e deputados na audiência da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais que debateu as denúncias de intoxicação apresentadas pelos funcionários da extinta Superintendência de Combate à Malária (Sucam). A reunião, realizada nesta quarta-feira (6/6/12), recebeu, ainda, representantes da Funasa, onde, hoje, estes servidores estão lotados, e do Ministério da Saúde.
A diretora da Confederação Nacional dos Servidores Públicos Federais e do Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal do Estado, Jussara Griffo, disse que a legislação que protege os servidores existe, mas ainda não foi regulamentada. Segundo ela, o Ministério da Saúde não realiza sequer exames periódicos nos trabalhadores há mais de 15 anos, e que isso impede que os intoxicados sejam diagnosticados e devidamente tratados. “Queremos a regulamentação da aposentadoria especial e a indenização dos servidores e familiares vítimas do uso indiscriminado dos inseticidas, principalmente os de combate à Doença de Chagas e Malária”, cobrou.
O também diretor do Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal do Estado, Carlos Henrique de Melo, lembrou que os servidores fizeram e fazem uso de venenos como BHC, DDT e Malation, que, hoje, são encontrados no organismo de pessoas da quarta geração destes trabalhadores. Ele conta que os funcionários da Sucam eram obrigados a passar o produto na pele e até ingerir por via oral para provar aos cidadãos que não representavam risco à saúde. “Ainda tinham que dormir sobre os sacos de inseticidas e evitar o uso de máscaras e equipamentos de proteção adequados”, denunciou.
Ditadura – O guarda de endemias Vando Euripes da Silva lembrou que o contexto político e social das décadas de 60 e 70, quando os remédios passaram a ser utilizados, era de ditadura, portanto o trabalhador não tinha direitos. Ele afirma que as punições para quem se recusava a manipular os venenos era severa e perversa, portanto cobra reparos políticos e financeiros para as vítimas. “É preciso que a ciência investigue mais os riscos e o Ministério da Saúde melhore as condições de trabalho do agente de saúde, que são quase tão precárias quanto há 50 anos atrás”, salientou. Ao final da sua fala, ele apresentou um vídeo com depoimentos de trabalhadores intoxicados pelos remédios.
Falta de provas técnicas dificulta indenizações
O presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Gilson de Carvalho Queiroz, reconhece que o problema é grave, mas se diz impedido de dar sequência às indenizações por carência de provas de que os inseticidas tenham intoxicado os servidores da extinta Sucam. De acordo com ele, a perícia técnica feita nos 400 trabalhadores que ingressaram com uma ação civil pública não detectaram nexo causal entre as doenças e o uso dos venenos de combate a endemias. “Não consigo permissão administrativa sem decisão judicial favorável. Peço aos servidores que colham mais provas, para que as indenizações sejam concretizadas”, disse. Ainda em sua fala, o presidente da Funasa ponderou que o cenário político dos anos 60 e 70 era negativo para os trabalhadores em geral, e que não há qualquer resistência do órgão em reconhecer os danos trazidos pela manipulação dos inseticidas.
A agente administrativo do Ministério da Saúde em Minas Gerais, Vera Lúcia Campos Ferreira, afirmou estar perplexa com a realidade dos colegas, e disse que vai levar a demanda para o gestor da pasta no Estado, Alencar Tadeu Winter.
Dívida social – O deputado Carlin Moura (PcdoB) destacou que toda a sociedade tem uma dívida com os servidores da Sucam. Para ele, estes trabalhadores foram responsáveis por melhorar as condições sanitárias do País nas últimas décadas. “Eles combateram doenças e pagaram com a saúde e, às vezes, com a própria vida. A luta para que seja feita esta reparação é de todos”, reforçou.
O deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) disse que a ignorância, a ditadura e o autoritarismo deixaram a alma do trabalhador ferida. Ele alerta que, mais que os males trazidos pelo uso dos remédios, a metodologia de trabalho foi perversa e humilhante.
O deputado Doutor Viana (DEM) denunciou que interesses econômicos ainda permitem que estes inseticidas ainda sejam usados no Brasil. Segundo ele, estes medicamentos já foram retirados do mercado de países da Europa e Estados Unidos há mais de 50 anos. “A Anvisa precisa estar atenta e evitar que remédios tóxicos cheguem aos órgãos públicos”, cobrou.
Providências – Ao final da audiência, o deputado Paulo Guedes (PT), autor do requerimento que solicitou o debate, apresentou quatro requerimentos, também assinados pelos deputados Carlin Moura, Doutor Viana e Adelmo Carneiro Leão, com pedido de providências. O primeiro quer o envio de ofício ao Ministério da Saúde, solicitando o cadastramento do trabalhadores da Sucam expostos aos inseticidas para exames periódicos e tratamento; o segundo pede o envio das notas taquigráficas e o vídeo com o depoimento dos servidores intoxicados à Comissão da Verdade do Congresso e Senado Nacional; o terceiro solicita envio de ofício ao Congresso Nacional para que aprovação dos Projetos de Lei Federal 4.485/07 e 4.873/09, que tratam da aposentadoria especial e da indenização dos trabalhadores vítimas de contato com inseticidas, respectivamente, sejam agilizadas; e o quarto solicita envio das notas taquigráficas da reunião e de ofício à Presidência da República com o pedido da criação de políticas dirigidas à saúde dos trabalhadores da Sucam.