Especialistas falam da importância do combate aos pequenos atos de violência no cotidiano escolar

ALMG abre etapa final do Fórum Segurança nas Escolas

Especialistas e educadores vão elaborar documento que servirá de base para a criação de políticas públicas para o setor.

04/10/2011 - 13:49

A etapa final do Fórum Técnico Segurança nas Escolas – por uma cultura de paz começou na manhã desta terça-feira (4/10/11), no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Especialistas convidados traçaram um panorama da violência no ambiente escolar no Brasil. O evento acontece até a próxima quinta-feira (6) e vai reunir em um documento as sugestões apresentadas nas seis etapas regionais. Esse relatório vai subsidiar a elaboração de políticas públicas estaduais para combater a violência nas escolas.

Autora de livros e artigos sobre o tema da violência no ambiente escolar, a socióloga e coordenadora da Área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) no Rio de Janeiro, Míriam Abramovay, fez a palestra de abertura. Segundo ela, a democratização das escolas nos últimos 40 anos, que passou a receber estudantes de camadas sociais mais pobres, aliada à falta de mudança na formação dos professores, contribuiu para o crescimento de casos de violências cotidianas dentro do espaço escolar.

A socióloga explicou que a violência não se resume àquela ligada à criminalidade, prevista no Código Penal. Ela listou situações frequentes de violência no ambiente escolar, além da agressão física: ameaças, tráfico de drogas, homofobia, racismo, discriminação social e preconceito religioso, entre outras.

Míriam afirmou que existe, tanto na sociedade brasileira quanto na latino-americana em geral, a “cultura da violência”, alimentada pelo individualismo, pelo consumismo e pela competição exacerbada. Essa cultura, disse ela, pressupõe que somente a força resolve os conflitos do cotidiano e que, por isso, é um fenômeno inevitável e faz parte da vida. Ela citou uma pesquisa realizada entre professores de Brasília, segundo a qual 12,6% deles disseram que já tiveram seus veículos danificados no estacionamento da escola ou nos arredores.

Pedagogo lembra assassinato de professor em Belo Horizonte

O pedagogo e mestre em Psicologia Social pela UFMG, Luiz Carlos Castello Branco Rena, iniciou seu pronunciamento lembrando o professor de educação física Cássio Castro Gomes, da Faculdade Izabela Hendrix , assassinado brutalmente por um aluno no final do ano passado dentro da escola.
Ao destacar que a violência não é um fato novo, nem por parte dos alunos, nem por parte dos professores, Rena lembrou que, muitas vezes, atos violentos praticados por crianças e adolescentes são uma resposta à agressão praticada pelo professor. Para ele, a escola se consolida cada vez mais como um palco da violência porque a sociedade a banalizou. “A gente se acostumou com a violência assim como se acostumou com o trânsito”, disse ele, que incluiu o que chamou de “política de pauperização das escolas” como um fator gerador da violência.

Rena apresentou uma série de sugestões para o problema. Em primeiro lugar, falou da necessidade da mudança de cultura, ressaltando que essa não é tarefa para apenas uma geração. “Precisamos nos convencer sobre o cuidado com o outro, que cuidar do outro faz bem”, afirmou. Segundo ele, a sociedade também deve apostar na possibilidade de que os conflitos podem ser mediados.

Para o professor, mecanismos de punição e exclusão são insuficientes para resolver o problema da violência. “O dia que professor precisar chamar polícia para resolver conflitos que aparecem na escola, está assinando seu atestado de incompetência”, ressaltou. Ele também sugeriu que as escolas façam acompanhamento individualizado de alunos que sinalizam que estão partindo para um caminho da violência, “antes que seja tarde demais”. Qualificar o professor para lidar com situações de violência, revisão do processo pedagógico e a realização do mesmo Fórum Técnico, porém somente com os jovens, ouvindo suas sugestões para combater a violência nas escolas, foram outras sugestões apresentadas pelo professor Luiz Carlos Rena.

Presidente e outros deputados aplaudem o debate

Na abertura do Fórum Técnico, o presidente da Assembleia, deputado Dinis Pinheiro (PSDB), que é filho de professora, afirmou sua satisfação pelo fato de a Casa estar recebendo esses “verdadeiros obreiros do bem, que têm a missão de instruir a nossa juventude”.

Ele afirmou que o drama da violência no ambiente escolar incomoda a todos. Trata-se de um problema, segundo ele, que “só pode ser enfrentado com a inteligência, o suor e o saber de cada um, seja o Poder Executivo, o Parlamento, o professor, o cantineiro ou os pais, que têm um papel fundamental, ao transmitir uma boa formação aos seus filhos. Não podemos de forma nenhuma fechar os olhos para essa realidade. É uma responsabilidade instransferível de cada mineiro”, destacou o presidente.

O deputado João Leite (PSDB), presidente da Comissão de Segurança Pública da ALMG, informou que, nas seis etapas regionais realizadas no interior, houve a participação de mais de 2.200 pessoas. Ele lembrou que as propostas recebidas no interior servirão de subsídios para discussões nos grupos de trabalho.

Para o deputado Carlin Moura (PCdoB), a violência é um problema que não nasce dentro da escola, mas a afeta diretamente. Segundo ele, a participação da sociedade é decisiva na busca da paz dentro do ambiente escolar. Mas a formação dessa sociedade, afirmou, passa pela educação e pela valorização do professor. Lembrando o ex-reitor da PUC e da UNA, padre Geraldo Magela, Carlin Moura pediu um minuto de silêncio em homenagem a todos os que já foram vítimas de violência no ambiente escolar.

O deputado Bosco (PTdoB) avaliou que a intolerância, a ausência de valores humanos e a falta de fé têm contribuído sobremaneira no aumento da criminalidade dentro e fora da escola. Já a deputada Maria Tereza Lara (PT) pediu que as sugestões do professor Luiz Carlos Rena sejam incluídas nas propostas para debate nos grupos de trabalho, que se reúnem nesta quarta-feira (5).

Autoridades e representantes de classe comentam sobre a violência

A secretária adjunta de Estado de Educação, Maria Ceres Spínola Castro, falou da importância de conscientizar os alunos sobre o compromisso com o outro e respeito às diferenças. O foco dos debates, segundo ela, não deve estar no combate à violência, e sim na construção da convivência. Ceres falou da necessidade de se transformar a escola em um lugar de convivência entre pessoas diferentes, com os mesmos direitos e deveres, independente de sexo, etnia ou condição econômica. “Assim será possível avançar na construção de uma sociedade mais justa e mais feliz”, afirmou.

Para o secretário adjunto de Estado de Defesa Social, Genilson Zeferino, a violência é um fenômeno que acompanha a humanidade. Em Minas Gerais, o fenômeno da violência na escola pode ser entendido sob três aspectos: a degradação do ambiente escolar, a violência que se origina fora do ambiente da escola; e ainda a violência interna na própria escola. Zeferino disse que é preciso aprofundar essas três questões para se ter a dimensão do desafio. Ele acrescentou que não se trata de um assunto de polícia, e que a responsabilidade de alunos, pais e educadores toma outro corpo.

A coordenadora do Sind-UTE, Beatriz Cerqueira, lembrou a última greve dos professores estaduais, que durou 112 dias. Referindo-se aos salários recebidos pelos docentes, ela afirmou que “uma cultura de paz começa pelo respeito a uma categoria responsável pela formação dos cidadãos”. Em relação ao Fórum Técnico, ela destacou que não se pode elaborar políticas públicas relacionadas à educação sem ouvir quem está no dia a dia da escola. Nesse sentido, ela o classificou como uma iniciativa louvável, pois constatou que todos os envolvidos estão sendo ouvidos.

O promotor Joaquim José Miranda Júnior, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais (CAO-Crim), lamentou que, apesar de todo o avanço científico, as relações humanas se degradam a cada dia. “Perdemos o respeito pelo próximo, e estamos chegando a um ponto em que não sabemos o que fazer. Ele mencionou que todos os dias muitos pais procuram a Promotoria de Justiça pedindo para entregar os próprios filhos ao Estado, para que eles não se envolvam mais com crimes e drogas.

A coordenadora regional Sudeste da Organização Brahma Kumaris - Brasil, Marli Medeiros, lembrou que a escola já foi vista como um ambiente de prazer, mas hoje é um lugar que chega a causar medo. Ela defendeu o resgate de valores na área da educação, como a auto-estima dos alunos e educadores e também a cultura da paz, da tolerância e do respeito. A promotora de Justiça Maria Elmira Evangelina do Amaral Dick destacou a necessidade da inclusão escolar para a criança com deficiência.

A mesa dos trabalhos na parte da manhã contou ainda com o vereador Heleno, de Belo Horizonte, a defensora pública Roberta de Mesquita Ribeiro, o promotor Joaquim José Miranda Júnior e a aluna da Escola Estadual Presidente Tancredo Neves Brenda Melissa dos Santos Vieira.