Falta de recursos para tratar dependentes químicos é foco em
reunião
A relação entre drogas e criminalidade e a falta de
investimento público no tratamento dos dependentes químicos deram a
tônica das discussões na audiência pública da Comissão de Segurança
Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, nesta terça-feira
(1º/6/10). A reunião foi solicitada pelos deputados João Leite
(PSDB), Rômulo Veneroso (PV), Tenente Lúcio (PDT) e pela deputada
Maria Tereza Lara (PT) para debater questões relativas à segurança
pública na 1ª Região Integrada de Segurança Pública (Risp), com sede
em Belo Horizonte. A reunião foi a 17ª realizada pela comissão com o
objetivo de traçar um diagnóstico da área, nas diversas regiões do
Estado.
O comandante da 1ª Região de Polícia Militar do
Estado, coronel Cícero Nunes Moreira, propôs algumas reflexões sobre
o tema, lembrando que houve uma mudança na abordagem da segurança
pública no Brasil nos últimos dez anos, envolvendo a comunidade e o
segmento acadêmico. No entanto, segundo ele, esse modelo de
discussão já é adotado na Europa desde o século XIX. "É fundamental
envolver os atores nessa discussão e refletir sobre o papel de cada
um", defendeu.
De acordo com o comandante da PM, em Minas, desde
2003, os gráficos vêm apontando para uma tendência de redução dos
índices de criminalidade. Ele acredita que isso seja resultado de um
trabalho intenso, reforçado pela integração das polícias, dos
sistemas de informação e pela coordenação das ações. Para ele, mais
importante que cuidar do crime, que é o fato concreto, é preciso
investir na prevenção da criminalidade, que é a repetição do crime.
"Identificar o criminoso e prendê-lo também é um ato de prevenção",
avalia. O comandante argumentou, no entanto, que esse trabalho não
depende só das polícias. "É preciso boa iluminação, boas trancas e
bons vizinhos", brincou.
Coronel Nunes defendeu que a saúde pública passe a
integrar a rede de prevenção da segurança pública, afirmando que há
um padrão associado entre drogas e homicídios. "É preciso haver
orçamento para tratamento do dependente químico. É fácil recolher
essas pessoas, mas para onde levá-las?", questionou. O comandante da
PM disse que a polícia está trabalhando na prisão do traficante, mas
falta cuidar do outro lado.
Drogas lícitas também são responsáveis por
violência
O presidente do Conselho Municipal Antidrogas de
Belo Horizonte, Anthero Drumnond Júnior, lembrou o problema das
drogas lícitas. "O maior gatilho da violência ainda é o álcool. Isso
sem falar nos acidentes que ele provoca", afirmou. Ele concorda que
o Estado é devedor nas políticas de tratamento aos dependentes de
álcool e drogas. Segundo ele, em Minas há 19 Centros de Atenção
Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD), enquanto seriam necessários
91.Em BH são dois. "Vamos trabalhar apenas com esse modelo de
tratamento proposto pelo Ministério da Saúde?", questionou. Ele não
acredita que um só modelo de recuperação seja suficiente para dar
conta de todos os casos, mas ressaltou que as comunidades
terapêuticas deveriam ser acompanhadas de perto pelo Estado. Anthero
Júnior acrescentou que o crack é um problema social, pela facilidade
de acesso, o baixo custo e a rapidez com que gera dependência,
vitimando sobretudo os jovens. "É preciso mudar esse quadro",
afirmou.
Para Ana Regina Machado, referência técnica em
atenção ao usuário de álcool e outras drogas da Secretaria de Estado
da Saúde (SES), desde 2003, com a criação das CAPS AD houve um
avanço pequeno, mas real, segundo ela. Até essa data, havia apenas
um centro público de tratamento em Minas Gerais. Ana Regina disse
que o CAPS é especializado e que há ainda a previsão de que
hospitais gerais atendam os casos agudos de intoxicação e de
síndrome de abstinência alcóolica. No entanto ela ponderou que a
internação não é a saída para todos. "Há diferenças entre usuários e
dependentes e cada um precisa de pontos de atendimento diferenciados
para cada situação clínica", disse. A representante da SES disse
ainda que a resposta aos tratamentos é variada, havendo estudos que
apontam índices de recuperação de apenas 30% .
Representante da SES diz que não há saída simples
para o problema das drogas
Ana Regina Machado propôs uma reflexão sobre os
fatores sociais, culturais, ambientais e históricos que têm levado
as pessoas ao encontro das drogas. "Não dá para acreditar em saídas
simples para um problema tão complexo", concluiu. No entanto, ela
defendeu que a rede de atenção precisa ser criada e deve buscar a
eficácia do tratamento.
Na mesma linha de argumentação, o superintendente
de Integração de Políticas de Direitos Humanos da Secretaria de
Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), Wagner Ricardo dos
Santos, sugeriu a comparação dos mapas de incidência da
criminalidade com o da desigualdade social. Para ele, não é questão
de pobreza extrema ou de falta de acesso à educação, mas da
qualidade dessa inclusão. "Qual o nível de desigualdade podemos
tolerar?, questionou. Ele ainda comentou o fato de que na faixa
etária dos 15 aos 24 anos, onde está a maior concentração de
usuários de drogas e praticantes de delitos, está também o maior
índice de desempregados.
Atuação estratégica - O
trabalho articulado que vem sendo realizado para contenção da
criminalidade foi apresentado pelo chefe do 1º Departamento de
Polícia Civil, Roberto Neves da Silva. Ele informou que, desde
novembro, o seu departamento vem atuando em um projeto estratégico
de controle de homicídios, onde são identificados os principais
problemas ligados à segurança pública em cada microárea das regiões
da cidade e reconhecidas aquelas com maior incidência de crimes.
Depois são estabelecidas metas a partir do diagnóstico elaborado.
O departamento faz o alinhamento estratégico para a
seleção de procedimentos policiais nas áreas envolvidas e a
atualização das informações de inteligência, como mandados de prisão
em aberto, por exemplo. Depois, segundo explicou Roberto Silva, é
feito o monitoramento dos alvos prioritários, utilizando os
procedimentos operacionais que possibilitem a prisão deles. Tem sido
feitas reuniões sistemáticas das Áreas Integradas de Segurança
Pública. Segundo o chefe do 1ª DPC, foram presos 18 criminosos nos
primeiros meses do projeto.
Investimentos - O resultado
dos investimentos do Estado nas políticas de segurança pública foram
apresentados na reunião pelo mediador da Superintendência de
Integração do Sistema de Defesa Social (Seds), Rodrigo Xavier da
Silva. Segundo ele, entre 2003 e 2009, o governo de Minas investiu
R$ 27,2 bilhões em segurança, sendo R$ 2 bilhões para o sistema
prisional. Esses investimentos, de acordo com o representante da
Seds, permitiram o aumento de quatro vezes no número de vagas
oferecidas pelas unidades prisionais. Ele também informou que a RMBH
recebeu cerca de R$ 324 milhões entre 2003 e 2008, enquanto Belo
Horizonte recebeu R$ 179 milhões para investimentos em
segurança.
Rodrigo Xavier da Silva avaliou que esse
investimento acarretou a redução geral dos índices de criminalidade
em 40%. A mesma redução foi apontada para os crimes violentos contra
a pessoa e o patrimônio. Nos casos de furtos a transeuntes e de
arrombamentos a estabelecimentos comerciais e veículos, a redução
teria sido de 50%. As prisões de autores de furtos e roubos
aumentaram no mesmo índice.
O representante da Seds também citou as medidas da
secretaria em prevenção da criminalidade que recebeu o Prêmio de
Boas Práticas em Segurança Pública e os investimentos feitos em
infraestrutura das Polícias Militar e Civil. O deputado Tenente
Lúcio (PDT) informou que participou da solenidade de entrega de 538
viaturas a 115 municípios de Minas, além de bicicletas e
equipamentos, como câmeras digitais, pistolas, coletes e rádios
transmissores. Ele parabenizou o governo pelas ações na área da
segurança pública.
Na fase de debates, o delegado Bruno Tasca Cabral,
da delegacia especializada em crimes cibernéticos, reclamou da falta
de estrutura de seu departamento. "Muito se pensa no mundo real, mas
se esquece do mundo virtual. A medida que o acesso à internet
aumenta, os crimes cometidos por meio dela também", afirmou, pedindo
apoio logístico, computadores e um serviço de internet de qualidade.
"Só assim poderemos combater de forma eficaz os crimes cometidos
pela internet", concluiu.
Sensibilizada com a situação detalhada pelo
delegado, a deputada Maria Tereza Lara (PT) disse que vai pedir que
a comissão realize uma audiência pública específica ao assunto dos
crimes cibernéticos, já que esse é um assunto que demanda uma
discussão mais aprofundada. A deputada enfatizou a necessidade da
segurança pública atuar na repressão qualificada e na prevenção dos
crimes. Maria Tereza Lara também disse que a situação das
comunidades terapêuticas deve ser debatida no fórum técnico da
Segurança Pública.
O deputado João Leite (PSDB) agradeceu o apoio das
instituições ligadas à segurança pública na preparação do fórum
técnico que será realizado entre os dias 11 e 13 de agosto, na ALMG
e anunciou a publicação de um livro com o relatório de todas as
visitas que estão sendo realizadas pela comissão para traçar o
diagnóstico da segurança do Estado.
Durante a reunião, foram aprovados vários
requerimentos sobre assuntos tratados em reuniões anteriores da
comissão. Um deles, dos deputados João Leite, Tenente Lúcio e da
deputada Maria Tereza Lara, solicita a realização de audiência
pública conjunta com a Comissão de Direitos Humanos para debater
temas relacionados à visita feita ao Presídio de São Sebastião do
Paraíso, e à possível tortura praticada em Monte Santo de Minas, que
envolve agentes e autoridades deste município.
Presenças - Deputados João
Leite (PSDB), presidente; deputada Maria Tereza Lara (PT), vice e
deputado Tenente Lúcio (PDT). Também participaram da audiência, o
coronel BM Alexandre Marcelo Costa de Oliveira, do 1º Comando
Regional de Bombeiro Militar; a defensora pública Luciana Moura
Fonseca e o superintendente do Centro de Referência em Álcool e
Drogas, Amaury Costa Inácio da Silva.
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