Violência policial preocupa participantes de debate sobre anistia

O painel "A questão dos mortos e desaparecidos ontem e hoje - A permanência da tortura como instituição" marcou a abe...

28/08/2009 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Violência policial preocupa participantes de debate sobre anistia

O painel "A questão dos mortos e desaparecidos ontem e hoje - A permanência da tortura como instituição" marcou a abertura do segundo dia do Ciclo de Debates 30 anos da Luta pela Anistia Política no Brasil. Representantes de familiares dos mortos e desaparecidos e de pessoas em privação de liberdade falaram sobre a tortura no Brasil, no evento realizado no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais na manhã desta sexta-feira (28/8/09).

A representante da Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e do Observatório das Violências Policiais de São Paulo, Ângela Mendes de Almeida, disse que, apesar de ser um momento de comemoração, é preciso lembrar que a anistia política no Brasil é incompleta. Para ela, a Justiça é ineficiente e o Exército ainda intervém nas decisões do Governo Federal. "Não vivemos um Estado Democrático de Direito, e sim um governo autoritário e violador dos direitos humanos", salientou. A violência policial, principalmente contra a população de baixa renda, segundo ela, é uma das grandes mazelas da sociedade. A representante dos familiares de desaparecidos destacou também que a impunidade dos tempos da ditadura alimenta a impunidade verificada hoje. "A violência policial é considerada uma questão cultural. A tortura foi banalizada, por isso, a maioria dos casos nem sequer chega aos órgãos de direitos humanos", reforçou.

Ainda em sua fala, Ângela Mendes de Almeida apresentou números da violência no Estado de São Paulo que, de acordo com ela, retratam a realidade brasileira. Dados da Secretaria de Segurança Pública paulista mostram que, em 2008, foram contabilizadas 438 mortes violentas no Estado; e, no primeiro semestre deste ano, já foram registrados 272 óbitos de vítimas de violência. Em paralelo aos os números do Estado, ela apresentou dados do Observatório das Violências Policiais, que apontam um total de 381 mortes em 2008, sendo 276 provocadas por agentes policiais e 105 por pessoas encapuzadas. No primeiro semestre de 2009, teriam sido 154 mortes, sendo 123 cometidas por policiais e 31 por encapuzados. Para ela, os números da secretaria levam ao entendimento de que a população das favelas e bairros da periferia de São Paulo são violentos, e que os assassinatos são cometidos dentro da própria comunidade. "Quando o agente mata é considerado resistência seguida de morte, mas, na contabilização dos números, esse dado não é especificado", alerta.

Ao final, a expositora fez uma crítica ao que ela chama de opinião pública progressista, formada por partidos de esquerda, intelectuais e ex-presos políticos. De acordo com ela, esse grupo de pessoas, de quem se esperava uma visão mais crítica da realidade, tem repetido os clichês da opinião pública chamada tradicional, de que a polícia mata por necessidade. "As pessoas não enxergam a realidade da tortura policial contra comunidades pobres no Brasil", finalizou.

Denúncias - Um dos coordenadores do ciclo de debates, deputado Durval Ângelo (PT), lembrou que os casos de tortura policial representam o maior número de denúncias recebidas pela Comissão de Direitos Humanos da ALMG. Para ele, a tortura é um "instrumento violento, cruel e de negação da natureza humana".

A representante do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania, Heloísa Greco, que também coordenou os trabalhos, afirmou que a jornada em comemoração pelos 30 anos de promulgação da Lei de Anistia teve o objetivo de chamar a atenção da sociedade para o fato de que a tortura é uma das instituições mais sólidas do Brasil. "Vivemos no País campeão de desigualdade social, uma vez que dois terços da população vive abaixo da linha da pobreza. Muito ainda deve ser feito, por isso nossa luta tem que continuar", disse.

O representante da Associação de Amigos e Famílias de Pessoas em Privação de Liberdade, Virgílio de Mattos, acrescentou que não bastam leis nem mesmo sua aplicação para se evitar a tortura. "É preciso desconstruir a ideia de que ela (a tortura) se justifica para evitar um mal maior". Ele disse que ainda assiste ao "aumento impiedoso da tortura" no Brasil, e não à redução da criminalidade, como tenta mostrar a mídia. "A tortura é prática sistemática não só das polícias, como também dos grupos de segurança privados", afirmou.

Ao dizer que desconhece qualquer punição a torturadores, o representante recebeu do deputado Durval Ângelo informações sobre policiais e agentes penitenciários que estão presos em função da prática de tortura, inclusive sete policiais detidos na última quinta-feira (20) em Medina (Vale do Jequitinhonha), o que colocou o juiz da comarca sob ameaças. "Mas são poucos exemplos em relação às denúncias que chegam à Comissão de Direitos Humanos", lamentou.

Para a representante da Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos, Suzana Keniger Lisboa, o governo Lula teve a grande chance para passar a limpo a história de tortura e assassinatos cometidos pelo Estado contra presos políticos no Brasil. Mas, segundo ela, essa oportunidade está sendo desperdiçada, pois o próprio presidente, o ministro do Exército e outras autoridades parecem não estar dispostas a abrir os arquivos da ditadura.

Suzana lamentou ainda a presença de muitos torturadores na vida pública brasileira. Citou nominalmente o senador Romeu Tuma que, segundo ela, comprovadamente participou da ocultação de corpos de presos políticos. Disse ainda que no Exército há militares que praticaram tortura e que hoje dão aulas aos novos oficiais da corporação.

Ela se questiona o motivo para os familiares estarem tão sozinhos nessa luta. "Há 30 anos queremos saber onde estão os corpos dos desaparecidos políticos, quais as circunstâncias das mortes, pedimos a busca e reconhecimento dos corpos e a punição dos responsáveis. Até hoje nenhuma das nossas reivindicações foi atendida", afirmou.

A TV Assembleia vai reprisar o Ciclo de Debates nos dias 5/9 (apresentações do dia 27), 6/9 (intervenções da manhã do dia 28) e 7/9/09 (falas da tarde do dia 28), sempre às 9 horas. A transcrição completa do evento será publicada no Minas Gerais do dia 12 de setembro.

Debates - Após as apresentações, o debate foi aberto ao público, que quis saber sobre o problemas dos arquivos secretos das Forças Armadas. Houve participações específicas como a de Douglas Krenak, representante dos povos indígenas. Segundo seu relato, os krenaks de Carmésia (Vale do Rio Doce) também sofreram violências da ditadura, com a presença do Exército em suas terras, onde, segundo ele, havia um campo de treinamento militar. Heloisa Greco, do Instituto Helena Greco, disse que este é um assunto que merece uma reunião específica, "para se recuperar a história verdadeira do que aconteceu ali".

 

 

Responsável pela informação: Assessoria de Comunicação - www.almg.gov.br

Rua Rodrigues Caldas,30 :: Bairro Santo Agostinho :: CEP 30190 921 :: Belo Horizonte :: MG :: Brasil :: Telefone (31) 2108 7715