Divergências ideológicas provocaram conflitos, interrupções de pronunciamentos e bate-bocas entre os participantes do fórum no Plenário
O deputado Paulo Lamac procurou acalmar os ânimos dos participantes
Foi aprovada proposta de aumento dos recursos investidos no setor pelo Estado de 25% para 30%

Políticas para minorias são destaque no fórum da educação

Propostas para plano estadual foram entregues ao presidente da Comissão de Educação e serão analisadas no substitutivo.

17/06/2016 - 18:59 - Atualizado em 20/06/2016 - 13:18

A votação de diretrizes educacionais que beneficiem minorias, em especial homossexuais, bissexuais, transgêneros e profissionais do sexo, foi a grande polêmica da votação na plenária final do Fórum Técnico Plano Estadual da Educação, promovido pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta sexta-feira (17/6/16). As discussões começaram pela manhã, no Plenário, e se encerraram por volta das 23 horas.

O documento com as propostas aprovadas foi entregue ao presidente da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da ALMG, deputado Paulo Lamac (Rede), que a repassará ao presidente da Casa, Adalclever Lopes (PMDB).

Ele afirmou que o sentido das sugestões será acolhido no substitutivo que será apresentado ao Projeto de Lei (PL) 2.882/15, do governador Fernando Pimentel, que contém a proposta oficial do Plano Estadual de Educação e traz diretrizes, objetivos, metas e estratégias para essa área pelos próximos 10 anos.

Entre as 21 metas em que foi organizado o texto, o debate mais acirrado foi na meta Educação de jovens e adultos, concentrando-se nas diretrizes que mencionavam as minorias, em especial aquelas relacionadas à orientação sexual.

Diversos participantes, muitos deles com camisas do movimento Patriotas, procuraram retirar do texto a menção às minorias, argumentando que as citações ofereciam benefícios injustificados a segmentos da população, em prejuízo da maioria. Condenaram especialmente a menção a homossexuais e profissionais do sexo, por considerarem que isso estimularia a erotização precoce das crianças.

Os argumentos levaram alguns professores a se manifestarem contrariamente, argumentando que o trabalho discente, seja qual for a orientação do profissional, não é erotizar ninguém, mas trabalhar com o conhecimento.

Após diversos pronunciamentos que condenaram a chamada “ideologia de gênero”, uma participante, que se identificou apenas como Libernina, solicitou a palavra: “Gênero não é ideologia, é identidade. A gente não ensina transexualidade a ninguém. É algo que já existe. Não é uma doença”, afirmou.

Em alguns momentos, divergências ideológicas provocaram conflitos, interrupções de pronunciamentos, bate-bocas e mesmo a queixa de uma participante de que teria sido ofendida e chamada de “coxinha”, e de outro que disse ter sido chamado de fascista. Por diversas vezes, o deputado Paulo Lamac, que também presidiu a plenária, interveio e procurou serenar os ânimos.

Os pedidos de supressão da menção às minorias acabaram rejeitados pela plenária. Uma das diretrizes que gerou polêmica foi a que propõe garantir a oferta de educação de jovens e adultos “às populações em situação de vulnerabilidade social, pessoas LGBT – em especial travestis e transexuais – mulheres, negros, população do campo, indígenas, quilombolas, povos tradicionais, população em situação de rua e população em situação de privação de liberdade, que não tiveram acesso ou não concluíram o ensino fundamental ou o ensino médio”. A proposta acabou aprovada com uma única alteração: que se garanta o direito de travestis e transexuais usarem o nome social (e não o de batismo) nesses processos educacionais.

Diversas outras diretrizes relacionadas provocaram disputas acirradas. Uma delas é a que propõe “desenvolver e implementar políticas e mecanismos de acesso e permanência na escola para jovens, adultos e idosos, visando, especialmente, contemplar trabalhadores que cumprem jornada de trabalho em tempo integral, em especial profissionais do sexo, transexuais, população de rua e pessoas privadas de liberdade”.

Plano prevê consulta pública sobre creches no campo

Em metas que não faziam menção a minorias ou orientação sexual, a votação foi menos tumultuada. Na meta da Educação Infantil, uma única diretriz foi aprovada: “garantir que a Secretaria de Estado de Educação realize, em colaboração com os municípios, no primeiro ano de vigência do plano, consulta pública para identificar as demandas das famílias por creches e pré-escolas no campo”.

Já durante a votação das estratégias relacionadas ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, houve uma preocupação em excluir a iniciativa privada de parcerias firmadas para implantação de políticas públicas.

Com relação à meta da Educação Especial, foram aprovadas, com facilidade, estratégias que propõem assegurar o transporte gratuito para o aluno com deficiência e também proporcionar o atendimento adequado aos alunos superdotados.

Durante a plenária final, também foi aprovada uma meta suplementar, às 20 que já constavam no texto. Trata-se da criação e implementação de um “programa educacional de combate às discriminações motivadas por preconceito de orientação sexual, identidade de gênero, machismo, LGTBfobia, de crença ou de qualquer outra natureza”. Durante a votação, um dos participantes foi aplaudido de pé pela maioria dos presentes, ao afirmar, com voz embargada, que a aprovação da proposta é um pedido de desculpas a todos os homossexuais já assassinados ou que sofreram preconceito.

Também foram aprovadas propostas sobre qualidade da educação básica, educação profissional, superior, formação e valorização dos profissionais, gestão democrática e articulação entre os sistemas de educação e financiamento. Entre elas, foi aprovada a implantação nos currículos escolares de disciplinas de artes visuais, dança, música e teatro nos ensinos infantil, fundamental e médio.

Dentre as propostas de destaque, os participantes aprovaram o aumento dos recursos investidos em educação pelo Estado dos atuais 25% para 30% a partir do sexto ano de implantação do PEE. Também foram favoráveis a destinar 100% dos recursos transferidos ao Estado, resultantes do Fundo Social do Pré-Sal, royalties e participações especiais referentes ao petróleo, à produção mineral e ao gás natural.

Para o nível técnico, os participantes propõem instituir concurso público para garantir 30% de professores efetivos. No quesito formação, uma das sugestões é garantir formação específica para gestores e profissionais da educação que atenda as necessidades de escolas do campo, quilombolas, indígenas, do sistema prisional, do sistema socieducativo e de educação de jovens e adultos.

Outra proposta aprovada foi estabelecer carga horária reduzida em 50%, em sala de aula, sem perda de remuneração, quando a professora atingir 20 anos de serviço e ou 50 anos de idade, e o professor atingir 25 anos de serviço ou 55 de idade.

Em relação à carreira dos professores, uma das propostas é restabelecer o direito a biênios, quinquênios, com percentuais de 5% e 10%, respectivamente, e demais vantagens para os trabalhadores ativos e revisar os direitos retirados dos aposentados, a partir de 2011, com a implantação do subsídio.

Polêmica e emoção - O final das votações do grupo mais polêmico do fórum - que tratou das questões de identidade de gênero e orientação sexual - foi marcado por manifestações polêmicas e emocionantes. Na discussão da última proposta, um dos participantes do grupo que se intitula Rede Estadual de Proteção à Família, Irinaldo Silva Galdino Júnior, fez uma homenagem ao estudante universitário Gabriel Lopo, defensor dos LGBTs. "Gostaria de te dar um abraço, mas não sei se seria bem recebido", disse ele. O estudante então se levantou e os dois se abraçaram, sob aplausos dos participantes. Emocionado, Irinaldo não finalizou a intervenção sobre a proposta.

Pouco antes, uma acusação contra o Sind-Ute provocou risos e reação no Plenário. Uma das participantes do grupo Patriotas, Luciana Massote, afirmou que o sindicato dos professores havia trazido "representantes do Hamas" (partido fundamentalista islâmico) para o fórum. A presidente da entidade, Beatriz Cerqueira, solicitou que a Polícia Legislativa chamasse a acusadora e pedisse que ela indicasse o nome da pessoa. "Esse é um fórum muito sério e não podemos permitir que seja usado para semear mentiras e deturpações sem que sejam contestadas".

O mal-estar foi gerado durante a discussão da estratégia suplementar que garante aos profissionais da educação que possam discutir identidade de gênero e orientação sexual em salas de aula e demais espaços de aprendizagem. Alguns do movimento "Patriotas" tentaram colocar limitações à proposta como assegurar que a discussão fosse somente com estudantes acima de 18 anos ou com a expressa autorização dos pais. Todas foram rejeitadas. 

Disputas ideológicas marcam encerramento do fórum

Ao final da votação de todas as propostas, os participantes aprovaram moções apresentadas por entidades ou pessoas: apoiando o projeto do plano, a criação de uma CPI da Universidade Estadual de Minas Gerais e contra manifestações dos grupos Patriotas e Escola sem Partido. Esta última gerou polêmica e confronto na plenária. A moção acusava os dois grupos de manifestações "sexistas, homofóbicas, racistas e de incitação ao ódio", que foram repelidas pelos representantes. Aos gritos de "Fascistas, racistas não passarão" e "Quem luta, educa", a moção foi aprovada pela maioria.

Beatriz Cerqueira criticou as várias tentativas de se inserir no texto final a sugestão de garantir uma escola sem partido. Segundo ela, essa seria uma bandeira do PSDB, com o objetivo de passar "a falsa ideia" de que política é igual partido. "Queremos uma escola democrática, inclusiva, que pense e, não que amordace", disse ela, que foi ovacionada.

Após a entrega do documento ao deputado Paulo Lamac (Rede), a maioria também se manifestou contra o governo interino de Michel Temer.