Estudo aponta irregularidades em contrato com Minas Arena
Concessionária que administra o Mineirão estaria lesando o Estado e os clubes, segundo levantamento apresentado na ALMG.
09/06/2016 - 13:47O deputado Iran Barbosa (PMDB) apresentou, aos deputados das Comissões de Administração Pública e de Esporte, Lazer e Juventude da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), um estudo realizado por ele, durante cerca de um ano e meio, em que denuncia irregularidades no contrato feito por meio de Parceria Público-Privada (PPP) entre a empresa Minas Arena e o Estado para a administração do Mineirão.
As informações, que dão conta de fraudes fiscais e contábeis, foram prestadas em audiência pública realizada nesta quinta-feira (9/6/16), a pedido dos deputados Rogério Correia (PT), Anselmo José Domingos (PTC), Geraldo Pimenta (PCdoB), além do próprio Iran Barbosa.
De acordo com Iran Barbosa, o Estado tem sido vítima da Minas Arena, que tem supostamente cometido fraudes em relatórios, balanços contábeis e documentos. Em seu estudo, ele aponta que, somente em 2015, a concessionária declarou um custo de serviço de mais de R$ 33 milhões em 36 eventos realizados, o que representaria quase R$ 1 milhão por jogo ou show. Além disso, somou outros R$ 13 milhões para despesa com pessoal e quase R$ 15 milhões anuais com manutenção.
“Mesmo assim, tiveram lucro líquido de R$ 41 milhões ano passado. Seriam mais de R$ 100 milhões subvencionados nos últimos três anos, e o governo ainda paga 17,5% dos impostos da empresa”, disse o parlamentar, em alusão aos termos do contrato que cobririam os custos da operação.
O deputado garantiu que a Minas Arena lesa todos os seus parceiros sempre que pode, em especial os clubes, o que seria demonstrado em dados contábeis conflitantes. “A final da Libertadores de 2013 teria gerado receita bruta com comercialização de cadeiras de mais de R$ 3 milhões, mas o balanço do mês em que o jogo aconteceu, apresentado pelo governo, fala de cerca de R$ 1,5 milhão”, argumentou.
Iran Barbosa explica que já informou ao Ministério Público (MP) sobre as irregularidades e que o Estado já repassou mais de R$ 530 milhões à empresa desde o início da gestão. “Nenhum balanço dos jogos de Atlético e Cruzeiro batem com os relatórios do Estado. Os erros contábeis são grosseiros e não teriam sido percebidos pelas auditorias? Trata-se de peculato (desvio de dinheiro público), estelionato, formação de quadrilha, entre outros crimes”, acusou.
Ausência - O deputado Rogério Correia lembrou que o tema já foi tratado diversas vezes na Assembleia e lamentou a ausência da Minas Arena nos debates, cuja direção alegou não saber a pauta da reunião.
Diante disso, solicitou a necessidade de convocação da empresa, que, conforme disse, “trata o povo mineiro com ironia”. O parlamentar destacou que houve uma tentativa de instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na ALMG sobre o contrato do Estado com a Minas Arena, mas que isso acabou não acontecendo.
“Fez-se uma opção por PPP com modelo equivocado, que o ex-presidente do Atlético, Alexandre Kalil, sempre combateu. Agora, ficou claro e o Cruzeiro tem sido prejudicado. A empresa tem contrato de garantia de lucro, sem precisar fazer qualquer esforço para promover o estádio”, denunciou. Rogério Correia questionou a quem serve o atual contrato e defendeu seu rompimento ou revisão imediata.
Convocação – O deputado Alencar Silveira Jr. (PDT) também questionou a ausência da Minas Arena, que, segundo ele, sempre se omite e ignora o Parlamento. Reforçou a importância da convocação da concessionária para um próximo debate ou, ainda, de fazer uma visita à empresa.
“Por ter contrato com o Estado, tem a obrigação de estar presente. O Estado é quem banca a Minas Arena, por isso eles não fazem nada para aumentar a comercialização e a lucratividade do empreendimento”, ressaltou. O parlamentar relatou, também, que quando América e Atlético tentaram marcar um jogo para o Mineirão, durante o Campeonato Mineiro, a empresa disse que não tinha como receber a partida, em razão de show no dia anterior. “Somente neste caso, de acordo com o contrato, caberia uma multa de R$ 16 milhões e isso não foi feito”, cobrou.
O deputado Sargento Rodrigues (PDT) também lamentou a ausência da Minas Arena e do MP no debate. Em sua fala, sugeriu a retomada da CPI, por entender que o erário e, consequentemente, o cidadão mineiro estariam sendo lesados. Neste sentido, fez denúncias de outros desvios de verba e recebimento de propina do governador do Estado no exercício do seu mandato.
O deputado Douglas Melo (PMDB) pediu ainda que se investigue e se descubra quem estaria ganhando com o contrato, conforme foi afirmado; e acusou a Minas Arena de superfaturar suas despesas. “O cidadão está sendo feito de palhaço, porque a corrupção não é devidamente combatida. O estádio foi reformado e o futebol virou um entretenimento para as classes mais altas”, salientou.
Estado defende investigação e explica moldes da PPP
O coordenador da unidade de PPP do Mineirão na Secretaria de Estado de Esportes, Diego Jardim, afirmou que as denúncias apresentadas pelo deputado Iran Barbosa serão apuradas pelo MP e pela Advocacia-Geral do Estado (AGE). Em resposta aos parlamentares, ele explicou que a escolha pela PPP foi em razão de uma recomendação feita pelo próprio MP, na época, de que não houvesse gestão dos clubes no Mineirão.
“O Estado precisa resguardar o interesse público em relação ao interesse privado. É preciso saber porque houve a proibição do envolvimento de Atlético, Cruzeiro e América na administração do estádio”, disse. Diego Jardim garante que o contrato tem sido auditado pela Controladoria-Geral do Estado e que a Assembleia poderá fazer uma visita à Minas Arena assim que julgar necessário.
O deputado Gustavo Valadares (PSDB) também ponderou que é preciso ter cautela e separar a reforma do estádio de seu modelo de gestão. Ele defendeu a PPP, por entender que quando o Estado recebeu a incumbência de receber jogos da Copa do Mundo de 2014 e, assim, assumiu uma obrigação de adequação milionária do Mineirão. “A parceria com iniciativa privada se fez necessária. Minas Gerais ganhou um dos melhores estádios do mundo, que custou R$ 700 milhões e será pago em 25 anos”, ponderou.
O parlamentar alegou, ainda, que a Minas Arena cumpriu compromissos de prazo e preço na construção, e que apenas a gestão tem sido criticada. “O trato da empresa com os clubes foi negativo, mas entendo que o tema não diz respeito à ALMG. A PPP, para o Estado, funciona bem, mas se as irregularidades denunciadas forem comprovadas, defenderei a revisão da parceria”, acrescentou Gustavo Valadares.
Especialistas pedem rompimento imediato do contrato
Advogados que vêm realizando investigações independentes sobre a PPP do Mineirão garantem que o Executivo estadual tem elementos suficientes para romper o contrato com a Minas Arena assim que julgar necessário. O professor de Direito da Faculdade Pitágoras, Jarbas de Lacerda, por exemplo, estuda o caso há mais de seis anos e afiança que a escolha pela modalidade de PPP foi maléfica e que é equivocado dizer que a empresa tem total autonomia sobre a gestão do Mineirão.
Segundo Lacerda, a concessionária tem a obrigação de prestar contas ao governo e a investigação deve ser ampliada à construção, que foi financiada com verbas do BNDES. “Até hoje, foram pagos mais R$ 531 milhões e ainda há mais 22 anos de contrato pela frente”, alertou. Diante disso, pediu o rompimento imediato do contrato e disse não entender o que chamou de leniência do Estado neste caso. “O contrato foi feito para beneficiar apenas alguns parceiros, e o Executivo tem todos os argumentos e provas para cancelar esta parceria. Não entendo porque isso ainda não foi feito”, reforçou.
Também advogado, Gustavo Soares Giordano lembrou que esse contrato vem sendo debatido desde 2013. Ele acusou a empresa de incompetência na administração do estádio e defendeu que, se tivesse sido instaurada uma CPI na época, conforme foi cogitado, o contrato já teria sido rompido.
“A única PPP da Copa que não exigiu uma empresa especializada em gestão de estádios foi a do Mineirão. E o pior: não há intenção da Minas Arena em fazer o estádio dar lucro porque o governo arca com todo o prejuízo. Por isso, não busca receita e privilegia despesas. Quem perde com isso é o torcedor e o contribuinte”, concluiu Giordano.