Comissão debateu assuntos relativos às normas gerais para instituição de loteamentos fechados e condomínios urbanísticos
Marta Larcher falou sobre os loteamentos estarem situados em distantes dos centros das cidades

Não há consenso sobre necessidade de lei para loteamentos

Polêmica é se o Estado teria competência para instituir norma com regras para os condomínios fechados.

18/08/2015 - 14:44

A possibilidade de uma lei estadual que defina normas gerais para a instituição de condomínios e loteamentos fechados gerou polêmica em audiência realizada nesta terça-feira (18/8/15) pela Comissão de Assuntos Municiais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Enquanto deputados, advogados e representantes de empreendimentos defenderam uma regulamentação que dê mais segurança jurídica a esses à instituição desses empreendimentos, a representante do Ministério Público argumentou que não há que se falar em “lacuna legal” sobre o assunto e que o Estado não tem competência para legislar sobre a questão.

A promotora Marta Alves Larcher, coordenadora das Promotorias de Habitação e Urbanismo do Ministério Público, explicou que primeiramente é importante diferenciar os loteamentos fechados dos condomínios urbanísticos. Segundo ela, os condomínios já são disciplinados pela Lei Federal 4.591, de 1964, que dispõe sobre condomínios em edificações e incorporações imobiliárias. “Condomínio horizontal é matéria de direito civil e não urbanístico e, portanto, é de competência privativa da União. O Estado não pode legislar sobre isso”, explicou.

No caso dos loteamentos, a questão é disciplinada pela Lei Federal 6.766, de 1979, que trata do parcelamento do solo urbano. Segundo a promotora, a matéria é de competência da União, Estados e municípios, mas como a União já disciplinou em lei o assunto e não tratou da modalidade específica de parcelamento do solo, conhecida como loteamento fechado, não caberia ao Estado ou aos municípios legislar sobre a questão.

Conforme esclareceu a promotora, o loteamento fechado é quando o perímetro do empreendimento é cercado e fracionado, e o que seria um bem de uso comum passa a ser de uso privativo, o que é questionado pelo Ministério Público. “O empreendedor aprova com base na Lei Federal 6.766 e depois promove o cercamento e a instalação de cancelas para limitar o acesso, criando bairros fechados, o que é ilegal”, concluiu.

Marta Larcher explicou que a ilegalidade desses empreendimentos se dá porque quando os loteamentos são fechados, há uma privatização dos espaços públicos, subtraindo muitas vezes do cidadão o uso de áreas urbanas qualificadas. Além disso, o morador dessas áreas muitas vezes é obrigado a pagar contribuições para a manutenção do espaço. Sobre isso, a promotora esclareceu que o Superior Tribunal de Justiça já entendeu que os moradores dos loteamentos fechados não são obrigados a contribuir para a manutenção da área.

Outro problema elencado pela promotora é o cerceamento da circulação das pessoas naquele espaço, por meio da solicitação de identificação daquele que quer adentar a área do loteamento, o que se caracterizaria como uma espécie de segurança privada. “É inconstitucional também o particular assumir uma atribuição do poder publico, que é a segurança pública”, disse.

Segundo ela, o que o Ministério Público pleiteia é o não fechamento desses loteamentos, bem como o questionamento das leis municipais que autorizam esse tipo de empreendimento. Segundo ela, o loteamento fechado significa que o município está concedendo o uso de bens públicos para o empreendedor privado e, para que isso seja feito legalmente, é preciso que se demonstre o interesse público dessa decisão.

Para promotora, consumidor é enganado no momento da compra

A promotora ainda enfatizou a necessidade de distinguir loteamento fechado de condomínio fechado, como uma maneira de esclarecer o consumidor. Segundo ela, o que se vê em geral são loteamentos fechados, vendidos sob a forma de “lotes em condomínios fechados”, o que estaria errado. “A maioria das pessoas que compra é enganada porque não existe a figura do condomínio como é vendida no mercado imobiliário. O que há é venda de lotes. E aí o comprador não quer que o cidadão comum sente no passeio ou estacione na rua dele, como se fosse privado. Aí a gente esclarece que aquilo é uma área pública, que qualquer cidadão tem o direito de ir e vir”, explicou.

Marta Larcher ainda disse que há uma ideia de que se o loteamento é fechado, vai ser bem cuidado. Entretanto, segundo ela, com o passar dos anos, o município entende que não tem que dar manutenção, por ser uma área fechada, enquanto os moradores também não querem fazer frente esse tipo de despesa. Nesse sentido, a promotora defendeu que, no caso de uma eventual regulamentação sobre o assunto, é importante que se defina de quem vai ser a responsabilidade pela manutenção daquele espaço e que os moradores saibam disso no momento da compra.

O fato de os loteamentos estarem situados em áreas distantes dos centros das cidades também foi abordado pela promotora. Segundo ela, muitas vezes verifica-se a deficiência da infraestrutura urbana desses locais, onde se faz uso de água sem tratamento ou não há coleta e tratamento de esgoto. Além disso, por estarem distantes das cidades, esses empreendimentos significam um custo enorme para que as prefeituras garantam a prestação de serviços públicos, a exemplo da coleta de lixo.

No que se refere à questão de que os condomínios representariam mais segurança para o cidadão, ela defendeu que a segurança em uma cidade seja pensada para todos, e não apenas para alguns. “Loteamento fechado não é modernidade, mas sim um retorno à Idade Média”, concluiu.

Advogados acreditam que o Estado pode regulamentar questão

Na contramão do que foi defendido pela promotora, o conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Oscar Diniz Rezende, acredita que o Estado tem competência para dispor sobre o loteamento, em face do que prevê o Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257, de 2001). Ele defendeu uma legislação estadual que dê proteção aos municípios e empreendedores. “O Estado tem legitimidade para legislar sobre o parcelamento de solo”, defendeu. Ainda na avaliação de Rezende, se há um questionamento de que as leis municipais que tratam do assunto são inconstitucionais, a matéria deveria ser regulamentada pelo Estado.

O presidente da Comissão de Direito Urbanístico da OAB-MG, Paulo Viana Cunha, disse que são gigantescos os problemas urbanísticos, como os loteamentos clandestinos e irregulares. Ele acredita que há uma lacuna legislativa sobre o tema e que os condomínios e loteamentos atendem ao interesse da população que busca mais segurança nas cidades.

O advogado Marcelo Castro Moreira defendeu a necessidade de mais segurança jurídica tanto para o empreendedor quanto para o comprador. O engenheiro da prefeitura de Nova Lima (RMBH), André Ferreira Borges, também defendeu uma regulamentação que dê subsídio para o corpo técnico das prefeituras definir a questão. Segundo ele, no caso de Nova Lima, a maioria dos loteamentos são do tipo fechados e não estão regulamentados.

Nessa mesma linha, a responsável jurídica da Gran Viver Urbanismo, Rachel Barcelos Pereira, disse que a uniformização da questão em âmbito estadual vai trazer mais segurança para a implementação dos empreendimentos.

Um dos parlamentares que solicitou o debate, deputado Ivair Nogueira (PMDB), lembrou que o assunto vem sendo tratado na ALMG por meio de projetos de lei apresentados em legislaturas passadas. “Queremos uniformizar o sistema de fiscalização. A partir de uma legislação estadual, os municípios poderão legislar supletivamente na esfera de sua competência”, disse. Na atual legislatura é o PL 2.513/15, do deputado Sargento Rodrigues (PDT), que trata da questão.

Para o deputado Wander Borges (PSB), também autor do requerimento para a audiência, a situação dos loteamentos fechados é tratada de maneiras diferentes nos municípios devido à ausência de uma legislação federal ou estadual que traga segurança a esses empreendimentos. Ele lembrou que é autor do PL 1.880/07, primeiro projeto que tramitou na ALMG sobre o assunto.

Requerimento – Durante a reunião, foi aprovado um requerimento do deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) para que a comissão realize audiência para debater o Centro de Convenções de Poços de Caldas.

Consulte o resultado da reunião.