A reunião debateu a situação da piscicultura no Estado, bem como os entraves ambientais e sanitários para sua regularização
Segundo José Eduardo Rasguido, os produtores locais de truta não recebem nenhum incentivo
Vanessa Gaudereto defendeu a elaboração de uma política estadual de pesca e aquicultura

Burocracia entrava empreendimentos de piscicultores

Produtores de peixes atribuem o baixo nível de legalização do setor ao excesso de exigências.

05/08/2015 - 21:00 - Atualizado em 06/08/2015 - 14:15

O excesso de exigências burocráticas, a incompatibilidade entre as legislações estadual e federal e a consequente falta de legalização das atividades e da regularização ambiental dos empreendimentos, que dificultam o acesso ao crédito, são alguns dos principais entraves enfrentados pelos produtores de peixes mineiros. Esses problemas foram discutidos na tarde desta quarta-feira (5/8/15) durante audiência pública da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), com a presença de diversos parlamentares e representantes do setor.

Convocada a requerimento dos deputados Fabiano Tolentino (PPS), Inácio Franco (PV), Nozinho (PDT), Emidinho Madeira (PTdoB) e Rogério Correia (PT), a reunião teve a finalidade de debater a situação da piscicultura no Estado, bem como os entraves ambientais e sanitários para sua regularização. A comissão aprovou diversos requerimentos propondo a realização de audiências públicas em municípios que têm a atividade pesqueira e de piscicultura como base de sua economia, além de outro propondo à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) a criação de uma força-tarefa que percorra os locais de produção para agilizar o processo de regularização ambiental.

Segundo o coordenador técnico regional de Sete Lagoas da Emater-MG, José Eduardo Aracena Rasguido, existem, hoje, no Estado, mais de 14 mil criadores de peixe. “Vemos a piscicultura crescer, apesar dos problemas”, disse, afirmando que o País tem potencial para exportar, mas o setor carece de apoio do governo. Ele lembrou que a Zona da Mata é a maior região produtora de peixe ornamental do Brasil, com potencial altamente competitivo, mas, devido à falta de incentivo, enfrenta a concorrência de países asiáticos como a Tailândia, que estão comercializando peixe ornamental no mercado internacional.

Para o técnico da Emater-MG, outro setor que merece atenção é o dos produtores de truta, peixe que tem no Sul de Minas o maior polo produtor do País. A despeito disso, os produtores locais não recebem nenhum incentivo, lamentou. Ele assegura que 99% dos produtores querem legalizar os seus empreendimentos, mas não conseguem. “Se os piscicultores estão acreditando, o governo tem que acreditar”, disse. Ele defendeu ainda a realização de concurso público na Emater-MG, de forma a assegurar mais técnicos para assistência aos produtores.

A superintendente federal da Pesca e Aquicultura em Minas Gerais, Vanessa de Oliveira Gaudereto, disse que o ministro da Pesca e Aquicultura, Helder Barbalho, visitou todos os governadores, inclusive o de Minas Gerais, Fernando Pimentel, com o objetivo de propor a unificação dos procedimentos de licenciamento no que diz respeito às legislações estaduais. Segundo ela, o fomento da atividade aquícola e pesqueira é prioridade, bem como a garantia do acesso ao Plano Safra, estando disponibilizada para produtores rurais e piscicultores a soma de R$ 4,2 bilhões em crédito.

Ela destacou também a realização de convênios do Ministério da Pesca com a Epamig, a Emater-MG, o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) e também com a Polícia Militar, já que pescadores e piscicultores reclamam de conflitos com a corporação. Outro importante convênio firmado, segundo ela, envolve a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na área de pesquisa.

Segundo Vanessa Gaudereto, o Brasil produz dois milhões de toneladas de pescado por ano, dos quais 40% oriundos da aquicultura, que gera 3,5 milhões de empregos diretos e indiretos. Em 2013, o País chegou à produção de 14,5 quilos de pescado por habitante/ano, superando mesmo o recomendado pelos organismos internacionais, que é de 12 quilos por habitante/ano.

Antes, o consumo de pescado no Brasil era de apenas 9 por habitante/ano. Já Minas Gerais conta, hoje, com mais de 40 mil pescadores e piscicultores, entre ativos e inativos. Ela admitiu que, apesar desses avanços, falhas na lei dificultam e às vezes impedem a manutenção de empreendimentos do setor.

Crise hídrica agrava a situação de pescadores e piscicultores

Ainda segundo a superintendente federal da Pesca e Aquicultura em Minas Gerais, a atual crise hídrica agrava a situação. Ela afirmou que o reservatório de Furnas tem operado com apenas 29% da sua capacidade e o de Três Marias, com 34%.

Vanessa Gaudereto defendeu a elaboração de uma política estadual de pesca e aquicultura. Para ela, os produtores precisam atuar em parceria com Governo do Estado. Na sua opinião, entre os projetos que poderão alavancar o setor, está a utilização dos reservatórios de pequenas centrais hidrelétricas para a criação de peixe.

Já Leonardo Romano, coordenador da Câmara Técnica Setorial da Aquacultura da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, explicou que a questão do licenciamento é vital para destravar o crescimento de todo o setor. Segundo ele, a legislação está totalmente desatualizada. “Algumas portarias datam de 2002, foram redigidas quando a atividade não tinha o peso nem a importância econômica que tem hoje”, disse. A situação se agrava porque, com base nessas portarias, o Ministério Público cobra qualquer desvio, prejudicando e inviabilizando em muitos casos os projetos do setor.

Segundo ele, alguns formulários destinados aos empreendimentos de pesca e piscicultura são os mesmos destinados à mineração. “Ora, a aquicultura é de baixíssimo impacto ambiental, além de promover a geração de emprego e renda e contribuir para fixar a população na sua região de origem”, argumentou. Por isso, ele defendeu a revisão das regras que regem a atividade, afirmando que já tramita na Semad resolução conjunta com o IEF, com pareceres técnicos favoráveis, visando a mudanças. “Mas tem que agilizar esses procedimentos. O Espírito Santo está à frente de Minas nesse processo”, disse.

Piscicultor ornamental da região de Patrocínio do Muriaé (Zona da Mata), o jovem Gabriel Miranda Batista reforçou o papel de Minas Gerais como o Estado reconhecido nacionalmente como principal produtor de peixe ornamental do Brasil. Ele acrescentou que 80% dos peixes de criatórios saem de Minas Gerais, especialmente de Muriaé. Contudo, disse, devido aos entraves a esses empreendimentos, muitos produtores estão desistindo e migrando para outros Estados, como o Rio de Janeiro, onde, segundo ele, as exigências são mais brandas. “Queremos ser reconhecidos e trabalhar de acordo com a lei”, disse.

O chefe da Unidade de Desenvolvimento Territorial da Codevasf, Alex Demier, apontou diagnóstico de 2014 que elenca uma série de dificuldades enfrentadas pelos piscicultores. Segundo ele, 39% dos produtores têm documento de isenção e 36% contam com protocolo de licenciamento ambiental, mas esbarram no excesso de exigências impostas pela Agência Nacional de Águas (ANA).

O baixo nível dos reservatórios gerado pela escassez de chuva e pela prioridade do Operador Nacional do Sistema (ONS) em atender a geração de energia elétrica é outro entrave, bem como o elevado custo de ração, a má conservação das estradas, a falta de energia elétrica e as dificuldades de capacitação de mão de obra.

Deputados apoiam luta dos piscicultores

Ao abrir a reunião, o presidente da comissão, deputado Fabiano Tolentino (PPS), observou que as audiências públicas têm sido um instrumento eficaz para o encaminhamento de soluções em vários setores sociais e da economia. Ele apontou, como exemplo, o recente parcelamento de dívidas de produtores rurais com o Banco do Brasil, em três vezes, durante três anos, com juros anteriormente contratados, graças à intervenção da comissão parlamentar. E se propôs a conduzir da mesma forma as demandas do setor de piscicultura.

Os deputados Emidinho Madeira (PTdoB) e Nozinho (PDT), que são também produtores rurais, se dispuseram igualmente a colaborar com a comissão, com o setor de piscicultura e com o governo na defesa do setor, buscando soluções capazes de desburocratizar os procedimentos para regularização da atividade no Estado. “Este é um ano difícil, de crise, mas apesar disso, o agronegócio garantiu superávit para o País”, disse o deputado Nozinho, defendendo, por isso, que o governo atenda às demandas dos produtores rurais, incluindo o pequeno produtor e os piscicultores.

A crise hídrica foi lembrada pelo deputado Inácio Franco (PV) como um dos fatores que têm gerado problemas para os pescadores e piscicultores. Ele observou que o volume da represa de Três Marias vem caindo significativamente, gerando dificuldades. Mas ressaltou que o setor também obteve alguns avanços com a legislação aprovada no ano passado, dispensando os tanques-rede de determinadas exigências legais. “O Legislativo não tem poder de decisão, mas pode ajudar, acompanhando e encaminhando as soluções”, destacou.

O deputado Rogério Correia (PT) elogiou a participação de técnicos e representantes do Governo do Estado na reunião e disse que é preciso escutar para governar.

O deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB) disse que o Brasil é um grande importador de peixe, quando poderia explorar seu próprio potencial. “Só com peixe, um alimento saudável, poderíamos alimentar o Brasil”, disse, defendendo um mutirão para regularização da piscicultura. “O poder público, que deveria ser o principal aliado, é o principal adversário”, lamentou.

O deputado Roberto Andrade (PTN) também fez críticas à burocracia e às exigências ambientais e defendeu a atividade dos piscicultores como fundamental. “Precisamos fomentar o consumo de peixe entre os brasileiros, mas criar condições para uma produção sustentável e lucrativa para o produtor”, disse.

Consulte o resultado da reunião.