Gestão compartilhada de resíduos é arma contra os lixões
Consórcios intermunicipais proporcionam compartilhamento de aterro sanitário e redução de custos para prefeituras.
Os municípios de Minas Gerais, como os de todo o País, correm para cumprir a legislação federal, mas desde já muitos admitem que não conseguirão cumprir o prazo para acabar com os locais inadequados de destinação final de lixo, os famosos lixões. “A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) acredita que esse prazo será prorrogado até o final do ano, tendo em vista que mais de 500 projetos de destinação de resíduos sólidos foram encaminhados pelas prefeituras ao Ministério do Meio Ambiente e apenas oito foram aprovados”, diz o presidente da CNM, Valtemir Goldmeier. Contudo, o Ministério do Meio Ambiente já avisou que não irá estender a data-limite.
Norma federal fixou 2 de agosto de 2014 como prazo para que os municípios erradiquem os lixões. |
O artigo 54 da Lei Federal 12.305, de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), fixou 2 de agosto de 2014 como prazo para a erradicação dos lixões, que causam grande impacto ambiental e trazem risco para a saúde pública. Já o aterro sanitário é o meio mais adequado, de acordo com os especialistas, para receber os resíduos, pois permite o confinamento seguro do lixo domiciliar, diminui a poluição ambiental e protege a saúde pública.
Devido ao alto custo de um aterro sanitário - da ordem de mais de R$ 1 milhão -, uma solução para resolver o problema dos resíduos sólidos domiciliares de maneira ecologicamente correta pode ser a adotação do modelo de consórcio intermunicipal, aquele que une municípios para viabilizar a sua instalação e com isso reduzir seus custos de operação e manutenção.
O presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), deputado Célio Moreira (PSDB), entende que o Governo Federal deu responsabilidades aos municípios, mas não foram disponibilizados recursos para cumpri-las. “O Plano Nacional de Resíduos Sólidos é uma ferramenta indispensável para a gestão ambiental municipal. O que falta é maior compromisso do Governo Federal no sentido de alocar os recursos necessários para que os prefeitos possam cumprir a lei, e com isso melhorar a qualidade ambiental de nossos municípios”, afirma o parlamentar.
A legislação atual prevê duras sanções aos gestores que descumprirem os prazos, entre elas até mesmo a prisão (um a cinco anos de reclusão), no caso de comprovação de que a omissão do prefeito é injustificada. Quanto às multas, elas variam de R$ 5 mil a R$ 50 milhões.
Ganho de escala é trunfo dos consórcios entre cidades
Os consórcios proporcionam o chamado “ganho de escala”, ou seja, o custo final de implantação e operação de um único aterro sanitário cai de forma acentuada quando diversas cidades se reúnem em torno dele, como afirma o diretor de Resíduos Sólidos da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), Renato Teixeira Brandão. De acordo com ele, essa alternativa permite outras economias, como o fato de dispor de apenas um engenheiro por consórcio. “A operação de destinação do resíduo é cara, não é só a construção que tem alto custo”, afirma.
O diretor da Feam explica que há três níveis de consórcios: aqueles em formação, que tem de passar pelas câmaras municipais; os já formados, mas não em operação; e os que já operam, como o de Itajubá (Sul de Minas).
Um problema que um consórcio intermunicipal público pode enfrentar é a falta de continuidade nos governos municipais, o que leva até à perda de licença concedida pela Feam. Atualmente, quatro prefeituras perderam as suas licenças por não cumprirem os prazos estabelecidos.
Na Feam, a diretriz seguida até 2010 era a de enfatizar apenas a eliminação dos lixões. A partir de 2010, isso mudou: é preciso investir também na coleta seletiva, entre outras ações.
Aterro de Itajubá é o primeiro consórcio de Minas com apoio do Governo do Estado
O Consórcio Intermunicipal dos Municípios da Microrregião do Alto Sapucaí (Cimasas) foi o primeiro consórcio público criado em Minas Gerais para acabar com os lixões com o apoio do Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional e Política Urbana (Sedru). O aterro sanitário do Cimasas foi implantado no bairro Rancho Grande, em Itajubá (Sul de Minas). É destaque em âmbito nacional – atraindo interesse dos governos de outros Estados.
Criado em 2007 para construir um aterro sanitário regionalizado que atendesse seis municípios da região (Itajubá, Delfim Moreira, Piranguçu, Piranguinho, São José do Alegre e Wenceslau Brás), o Cimasas é o responsável pela gestão e destinação final dos resíduos sólidos produzidos nessas cidades.
Cada município incluído em um consórcio dessa natureza significa menos um lixão no Estado. O preço da tonelada de resíduos sólidos no Cimasas é de R$ 57,35, contra preços praticados por serviços terceirizados de disposição final que chegam a R$ 220 em Vespasiano (Região Metropolitana de Belo Horizonte) e Frutal (Triângulo Mineiro), por exemplo, de acordo com dados de 2010 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis).
Após seis anos de funcionamento, a secretária executiva do Cimasas, Caroline Fernandes Nunes de Moura, avalia que os resultados alcançados até hoje são muito positivos. “Os municípios ganharam muito com a implantação do consórcio e a deposição ambientalmente correta dos resíduos sólidos. Os próximos passos são a inclusão de mais cinco municípios, para fortalecimento do consórcio e para a implantação de um centro de triagem para aumento da vida útil do aterro sanitário”, diz a gestora.
Atualmente, está em andamento o processo de ampliação do consórcio, com a inclusão dos municípios de Cachoeira de Minas, Brazópolis, Marmelópolis, Santa Rita do Sapucaí e Maria da Fé. Com a entrada desses cinco novos integrantes no consórcio, a previsão é de que o aterro sanitário em Itajubá atenda uma população de aproximadamente 208 mil habitantes, recebendo cerca de 3 mil toneladas de resíduos por mês. Com isso, a vida útil do aterro será de 40 anos.
Além da eliminação dos lixões na região, outra vantagem dessa ampliação é a diminuição de custos administrativos para cada prefeitura, como folha de pagamento dos funcionários do consórcio e gastos com a manutenção do aterro.
“Não haverá diminuição do custo de operação do aterro sanitário do Cimasas, pois, com a entrada dos novos municípios e consequente aumento de deposição de resíduos, serão necessários mais equipamentos e mão de obra para operar o aterro”, diz Caroline Fernandes.
No modelo de consórcio intermuncipal, a coleta de lixo continua sendo de responsabilidade de cada município. “O Cimasas se responsabiliza apenas pela destinação final dos resíduos, ou seja, pelo aterro sanitário”, explica a gestora.
Outras iniciativas - Segundo a Sedru, os dois primeiros consórcios públicos nessa área em Minas Gerais foram o de Conselheiro Lafaiete - Congonhas - Ouro Branco (Região Central do Estado) e o de João Monlevade - Nova Era - Bela Vista de Minas - Rio Piracicaba (Região Central do Estado). Foram criados em 2005 a partir da iniciativa dos prefeitos. Esse primeiro não está operando, uma vez que o aterro foi embargado. Já o Cimasas foi o primeiro em Minas que contou com apoio do Governo do Estado.
Em Minas, 278 municípios ainda convivem com lixões
O objetivo da Política Mineira de Resíduos Sólidos é ampliar o número de municípios servidos com sistemas adequados de disposição final de resíduos sólidos urbanos. A meta é acabar com os lixões do Estado até 2014, de acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em 2003, apenas 19% da população urbana no Estado era atendida por disposição adequada desses resíduos.
Em 2013, esse número subiu para 59,14%, de acordo com a gerente do projeto estratégico de saneamento de Minas Gerais, Edicleusa Veloso Moreira, que é mestre em engenharia sanitária e assessora especial da Sedru. Ela acrescenta que, nesse período de dez anos, houve a erradicação de 107 lixões, 65% dos que havia em Minas Gerais em 2003. “Hoje, 575 municípios mineiros não utilizam mais os lixões”, afirma. Restam, portanto, 278 municípios com lixões. “Até agosto deste ano é inviável chegar a 100% de municípios sem lixões”, admite.
De acordo com a assessora da Sedru, dentro dessa política, os recursos utilizados para implantação das obras têm como prioridade as que forem executadas por meio dos consórcios intermunicipais. Os recursos são utilizados para diversas ações, tais como planejamento, apoio à formatação de consórcio intermunicipal, captação de verbas para estudos e projetos, execução de obra, apoio no licenciamento ambiental e apoio no processo licitatório.
“Os consórcios intermunicipais são política prioritária do Governo do Estado, que incentiva a união de municípios para otimizar recursos para a solução de problemas comuns em escala regional, em especial a questão do lixo”, afirma Edicleusa Moreira.
Além do Cimasas, já estão em funcionamento mais oito consórcios. Entre 2007 e 2013, a Sedru iniciou a formação de 68 agrupamentos (ou seja, consórcios que ainda não têm CNPJ), atendendo 576 municípios. Atualmente, 26 consórcios já estão formatados com CNPJ e sede própria, mas ainda não estão funcionando.
Edicleusa Moreira destaca como vantagens dos consórcios públicos, os ganhos crescentes de escala, a maior facilidade na captação de recursos e a ampliação de receitas. Como incentivo, os municípios ganham aumento da cota do ICMS Ecológico, que é repassado pelo Estado.
“Podemos afirmar que o aterro sanitário é o único meio para receber adequadamente os resíduos sólidos urbanos. O grande problema é gerenciar, e sozinha a prefeitura não consegue gerir. Isso sem contar os gastos com pessoal (a mão de obra é escassa e específica) e equipamentos como retroescavadeira, por exemplo”, diz.
Nesse contexto, ela acrescenta, participar de um consórcio intermunicipal envolve uma mudança de cultura, pois nem as prefeituras nem a comunidade estão acostumadas com esse modelo. O custo é de R$ 58,56 por tonelada, em média. Além disso, o município que participa do consórcio ganha de 10% a 30% do ICMS Ecológico.
Esta matéria é a primeira de uma série especial sobre o problema dos resíduos sólidos e uma das soluções existentes atualmente para solucioná-lo, o modelo de consórcio intermunicipal. A próxima será publicada nesta quinta-feira (12/6/14).