Falta de projetos trava transporte público em Minas
No último painel do dia, Ciclo de Debates sobre mobilidade urbana também destaca planejamento integrado.
13/06/2013 - 19:14O maior problema de Minas e do Brasil quando se fala de transporte público hoje é a carência de ideias e projetos concretos. A avaliação é do diretor da Regional Minas Gerais da Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP), Ricardo Mendanha Ladeira, palestrante que abriu o painel “Cidades e Infraestrutura de Mobilidade Urbana: Desafios e Estratégias”, que fechou nesta quinta-feira (13/6/13) o primeiro dia do Ciclo de Debates Mobilidade Urbana – Construindo Cidades Inteligentes, que a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) promove no Plenário da ALMG.
“Em Minas Gerais não há praticamente nada organizado em termos de transporte público, com exceção de poucos projetos em andamento, ainda em fase de estudo, em Betim, Juiz de Fora e Belo Horizonte. Vamos demorar até 20 anos para ter algo que nos atenda na área de transporte público”, alertou Ladeira. O deputado Paulo Lamac (PT) coordenou os trabalhos. A programação do Ciclo de Debates continua nesta sexta-feira (14), no mesmo local.
Ladeira, que foi diretor-presidente da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) entre 2001 e 2009, comentou que, a partir da implantação da Lei Federal da Mobilidade Urbana (12.587, de 2012), os desafios são a disputa política na defesa do transporte público, a mobilização do setor e a sensibilização da sociedade para a questão. “Do ponto de vista estrutural, as políticas públicas têm privilegiado o transporte individual. Não temos conseguido convencer a sociedade de que o transporte público é a melhor forma. O interesse estritamente econômico da operação é barreira grave. A fragilidade da democracia e da cidadania são obstáculos”, disse.
Carros - O presidente da Câmara Automotiva Mineira da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Fábio Sacioto, discordou que a culpa para os problemas de mobilidade seja do automóvel. Para Sacioto, que também é diretor do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores, as montadores podem fazer carros mais compactos, mais seguros e recicláveis, e os combustíveis com menos poluentes. “O perfil de produção é favorável à mobilidade, com 52,7% concentrada em carros compactos. Dos carros vendidos no Brasil, 87% são flex. A indústria também tem investido mais em pesquisa e desenvolvimento”, frisou.
Ao mesmo tempo, observou Sacioto, o consumidor precisa sair do comodismo do carro para outra situação, e buscar a carona solidária, usar mais o transporte público para o dia a dia, tentar morar mais próximo da escola e do trabalho e procurar andar a pé em pequenos deslocamentos.
Sacioto defendeu ainda que o poder público invista em inspeção veicular, pois metade da frota é ultrapassada.
Cidades inteligentes devem ir além do mero cumprimento da lei
“O que está em jogo é o interesse coletivo”, ressaltou o consultor sênior da Federação e do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Minas Gerais (Setcemg), Luciano Medrado. “Nesse contexto, a lei precisa ser cumprida, mas cumpri-la simplesmente não nos leva a uma melhoria. Temos que construir cidades inteligentes a partir do estímulo da lei”, completou Medrado, que também é diretor de Desenvolvimento da MinasInvest – Aliança de Desenvolvimento, uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip)
Em sua avaliação, alguns pontos importantes foram ignorados por outros palestrantes. Por exemplo, o fato de que a legislação defina mobilidade como a movimentação de pessoas e cargas. “Porém, ninguém tocou na questão de carga. Essa é uma visão míope da mobilidade urbana", apontou.
O consultor do Stecemg enumerou algumas perguntas que precisam ser respondidas: Estamos preparados e dispostos a superar os desafios? Quais as ações imediatas para garantir a efetivação da lei? Como capacitar todos os envolvidos? E a respeito das experiências de sucesso já existentes, como incorporá-las ao processo?
“As razões de deslocamento das pessoas se resumem a seis atividades: ir ou voltar para casa, serviço de saúde, consumo, escola, lazer e trabalho. E não vamos a lugar nenhum se não houver abastecimento. Como a cidade vai ser abastecida? Não podemos adotar políticas que restrinjam a circulação de caminhão, pois ele é que leva o abastecimento”, defendeu Medrado.
Modelos mentais - Para o gestor ambiental e especialista em Consumo Sustentável e Mobilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, João Paulo Amaral, foram criados ao longo do tempo alguns modelos mentais que ainda estão em vigor. Esses modelos colocam a bicicleta e o pedestre como marginais sem espaço na cidade. “Mobilidade urbana não é só transporte, estamos falando de ordenamento e uso do espaço público, do direito e acesso à cidade”, afirmou Amaral. Com bom humor, ele apresentou um “Guia de como não seguir o exemplo de São Paulo, capítulo mobilidade urbana".
No caso do pedestre, Amaral, que é um dos idealizadores do Movimento Bike Anjo, deu alguns exemplos para ilustrar essa marginalidade que exclui o pedestre: calçadas ocupadas por guaritas, carros ou mesas de bares, estas em função da proibição de fumar em espaços fechados; recapeamento das pistas, mas não da faixa de pedestre.
“O pior modelo mental de todos é a impunidade”, disse. “É poder fazer o que quiser e saber que não será punido por isso. São carros que ocupam espaço da bicicleta, ou que sobem na calçada para desviar do trânsito”, enumera. Para buscar soluções, Amaral sugere duas lições: planejamento territorial, ou seja, estudar a ocupação e o ordenamento territorial das pessoas na cidade – para onde as pessoas estão indo e por que estão indo pra lá; e planejamento de mobilidade integrado. "60% do espaço urbano de São Paulo, onde moro, é para os carros, faltam soluções integradas”, avalia. Ele não defende apenas o uso de bicicletas, mas a possibilidade de viver em uma cidade melhor.